Idealizado por intelectuais como o filósofo Vladimir Safatle, ambientalistas e militantes contra o aquecimento global, sustenta que depois da emergência o governo poderia tomar medidas realmente duras, como a "equiparação de produção de queimada a crime hediondo e confisco de terras de fazendeiros envolvidos em queimadas".
Entrevistada pela revista Fórum, a bióloga e militante ecossocialista Ana Carolina Trindade admitiu que há motivos para preocupação adicionais desde o lançamento do manifesto.
Em setembro, as queimadas no Brasil cresceram significativamente em relação a agosto; enquanto isso, nos Estados Unidos, o candidato Donald Trump fala em "furar, baby, furar" o solo sem limites em busca de petróleo e gás, ao mesmo tempo em que critica os veículos elétricos, os cataventos da energia eólica e as gigantescas fazendas de captação de energia solar.
Energia limpa?
Ana Carolina Trindade, aliás, concorda com algumas das críticas às energias ditas "alternativas".
No Nordeste brasileiro, muitas famílias que moram no entorno dos cataventos reclamam do zunido produzido pelo giro das pás e relacionam isso à perda de sono e depressão.
Ambientalistas dizem que a implantação de fazendas de vento na costa pode impactar a vida marinha por causa do barulho gerado.
Porém, não há provas relacionando os cataventos à misteriosa mortandade de baleias nos EUA. Desde 2016, 208 baleias jubarte já encalharam nas areias da costa Leste.
Para a biológa, também é preciso considerar o impacto ambiental da construção de grandes empreendimentos hidrelétricos.
Ela rejeita receitas prontas e diz que cada país deve ter seu próprio modelo energético.
Caso Trump triunfe nos EUA, vai ficar mais fácil para a Petrobras argumentar que precisa de fato explorar petróleo na foz do rio Amazonas, outra preocupação de Ana Carolina Trindade.
Isso não está longe de acontecer. Nessas COP [Conferências do Clima] o Lula prometeu que teria metas de baixa emissão de gás de efeito estufa, mas como é que você pode dizer isso e ampliar a BR-319, que vai possibilitar maior desmate no Arco do Desmatamento da Amazônia?
Prioridade aos porcos da China
O manifesto também tem o intuito de debater o modelo de economia agroexportadora e de exploração mineral do Brasil.
Em um de seus trechos, diz:
Enquanto o agronegócio crescia, nos últimos 30 anos, acompanhamos a diminuição drástica da área de culturas agrícolas que são pilares da alimentação brasileira. Mandioca, menos 38%; feijão, menos 47% e arroz, menos 58%
A soja, por outro lado, é o principal produto do agronegócio, destinada especialmente a alimentar os porcos e outros animais de corte na China.
A leguminosa avançou no cerrado brasileiro, contribuindo para a estatística segundo a qual o brasileiro consome mais de 5 litros de agrotóxicos por ano, os venenos que poluem terras, águas e o ar.
O Instituto Nacional de Câncer estima em 2,1 milhão os novos casos de câncer no Brasil entre 2023 e 2025. Segundo recente estudo da Unifesp, o câncer já é a principal causa de morte em 13% dos municípios brasileiros.
Na entrevista à Fórum (cujos principais trechos aparecem no vídeo acima), Ana Carolina Trindade admitiu que enfrentar o modelo agroexportador "é uma luta gigantesca", dada a forte presença dos representantes do setor no Congresso.
Porém, acredita que é importante levar o debate à sociedade e às ruas, uma vez que as especificidades da economia brasileira sujeitam o país a profundos danos por conta das mudanças climáticas em andamento:
A nossa economia é meio que moldada dessa forma: explorar como se não houvesse amanhã.