PROTEÇÃO AOS ATIVISTAS CLIMÁTICOS É URGENTE

Brasil foi o segundo país mais letal para ambientalistas em 2022

Estudo mostra que dos mais de 100 assassinatos de defensores do meio ambiente no mundo, 34 foram só em território brasileiro

Bruno Pereira e Dom Phillips foram assassinados em junho de 2022.Créditos: Reprodução / Arte de Cris Vector
Escrito en MEIO AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE el

"Devemos proteger as pessoas que protegem o meio ambiente. Elas não estão defendendo suas casas, suas vidas, seu próprio território, apenas. Estão defendendo o ambiente que é importante para a sobrevivência de todo o planeta", disse a consultora sénior da ONG Global Witness. Gabriella Bianchini

Ela lembra que o último governo foi responsável para que assassinatos de ambientalistas aumentassem. "Nos últimos quatro anos, vivemos um governo federal que desmontou as agências de proteção ambiental e dos povos indígenas. Várias frases do ex-presidente Jair Bolsonaro incentivavam invasão e garimpo ilegal nas Terras Indígenas”, afirma.

Em 2022, o mundo testemunhou a trágica perda de pelo menos 177 ativistas ambientais, uma média assustadora de um assassinato a cada dois dias. Esses indivíduos, dedicados à proteção do meio ambiente e à utilização coletiva dos recursos naturais, pagaram o preço mais alto por seu ativismo.

Esses dados alarmantes foram levantados pela Global Witness, uma ONG com sede no Reino Unido que tem monitorado o cenário do ativismo ambiental desde o ano de 2012. De acordo com seu relatório mais recente, publicado nesta terça-feira (12), ao todo 1.910 crimes desse tipo em todo o mundo aconteceram na última década.

Com um total de 60 assassinatos, a Colômbia lidera o ranking como o país mais perigoso para ativistas ambientais. Este número é o dobro do registrado no ano anterior. A maioria das vítimas era composta por indígenas, membros de comunidades afrodescendentes e pequenos agricultores, conforme apontado pelo relatório.

Nesta lista sombria, o Brasil ocupou a segunda posição, com 34 ataques letais registrados, representando um aumento em relação a 2021, quando foram registrados 26 assassinatos de defensores ambientais. Uma das principais fontes de dados é a Comissão Pastoral da Terra (CPT), vinculada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que publica anualmente um relatório acerca de conflitos no campo.

Em terceiro lugar, aparece o México, que já ocupou a primeira colocação do ranking em 2021. O total de mortes caiu de 54 para 31. No entanto, como destaca a entidade, isso não significa que a violência tenha dado trégua naquele país.

É possível observar que a América Latina ficou em destaque: a região foi palco de 88% do total de assassinatos registrados, isto é, em comparação aos 18 países que aparecem no relatório com casos documentados, 11 são latino-americanos.

Bianchini vê a situação como muito preocupante. "O Brasil é um dos países que mais mata essas pessoas, defensores da floresta e do meio ambiente. É um país com números absurdos de mortes".

Mortes permanecem sem solução

"A impunidade é um enorme problema e está impedindo de forma muito grave que os ataques aos defensores parem. Muitas vezes, com sorte, tudo o que conseguimos saber é o nome da pessoa que disparou a arma de fogo. Os mandantes intelectuais raramente são conhecidos, assim como suas motivações", ressalta uma das autoras do levantamento, Laura Furones.

Assim como em outras partes do mundo, muitos dos assassinatos registrados no Brasil permanecem sem solução. Um exemplo trágico é o caso de uma família inteira em São Félix do Xingu, Pará. A ambientalista Marcia Nunes Lisboa, seu marido, o trabalhador rural José Gomes, e sua filha, Joene Nunes Lisboa, de 18 anos, foram brutalmente assassinados em janeiro de 2022. Até o momento, as investigações sobre este crime hediondo ainda não chegaram a uma conclusão.

O assassinato de Ana Yanomami Xexana, em Roraima, também continua sem solução. A indígena foi atingida na cabeça por dois homens que passaram pelo local de bicicleta, enquanto estava em um acampamento provisório na cidade.

Maria Leusa Munduruku, uma defensora incansável dos direitos indígenas e do meio ambiente, tem enfrentado ameaças constantes devido à sua denúncia da extração ilegal de ouro na Terra Indígena Munduruku, no Pará. Devido a essas ameaças, houve momentos em que ela teve que deixar seu território às pressas para garantir sua segurança.

Interesses econômicos

Oito dos casos monitorados pela Global Witness teve a mineração como fator associado. Outros setores que também foram associados às mortes são a indústria madeireira (4 casos), a construção de estradas e infraestrutura (2 casos), hidrelétricas (2 casos) e a caça (2 casos).

Entre as vítimas assassinadas, mais de um terço eram indígenas, representando 36% do total. Pequenos agricultores (22%) e afrodescendentes (7%) também foram vítimas significativas dessa violência. Ano passado, autoridades estaduais, manifestantes, guardas florestais, advogados e jornalistas - como Dom Phillips, que foi morto ao lado do indigenista Bruno Pereira no Vale do Javari - também foram alvos de ataques letais. 

Pela primeira vez, o relatório destacou as mortes ocorridas na região da Floresta Amazônica. Em 2022, o bioma foi palco de 1 em cada 5 assassinatos registrados, evidenciando a crescente violência enfrentada pelos defensores do meio ambiente nesta região crucial

A consultora sénior da ONG Global Witness lembra que o assassinato não é a única forma de violência nesses casos. "O assassinato é a ofensa mais grave. Mas há diversos outros atentados não letais, como tentativa de silenciamento, de criminalização, ameaças e outros tipos de violência física, sexual, assédio. Tudo isso envolto pelo conflito de terra", comenta. 

"O Brasil vai sediar a Conferência do Clima em Belém em 2025. Sabemos de todos os problemas do estado do Pará e da região amazônica no Brasil. Há necessidade de pressionar o novo governo", reitera Bianchini, destacando a importância de um posicionamento efetivo do país no combate a esse tipo de violência.

Com informações de DW