Após a Justiça de São Paulo indeferir e o Ministério Público recorrer, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu na noite desta sexta-feira (5) que a Lei Maria da Penha, que versa sobre violência contra a mulher, também vale e deve ser aplicada para todas as mulheres transexuais do Brasil. O Judiciário paulista havia negado medidas protetivas solicitadas pelos advogados de uma mulher trans que era agredida frequentemente pelo próprio pai, que não aceitava seu entendimento de gênero, diferente do seu sexo biológico.
Como foi a primeira vez que um caso do tipo foi parar no STJ, um dos tribunais superiores do país, ao lado do Supremo Tribunal Federal (STF), a decisão deve a partir de agora valer para as instâncias inferiores do judiciário brasileiro.
Os seis magistrados da Sexta Turma, por unanimidade, entenderam que a aplicação da Lei Maria da Penha, que desde sua promulgação serve como instrumento dissuasório contra a violência imposta às mulheres, deveria ser aplicada a todas as cidadãs brasileiras e estrangeiras que vivem no Brasil, sem fazer distinção em relação a aspectos biológicos.
“Registro que no ano passado foram 140 assassinatos. O dado é preocupante porque reflete comportamento predominante que não aceita identidades outras que aquelas que a nossa cultura e formação nos levou a definir, até por questões religiosas, como identidades relacionadas tão somente ao sexo, característica biológica. O que se discute é que a possibilidade de uma lei que veio para proteger a mulher possa também abrigar assim quem se define, se identifica”, orientou em seu voto o relator do caso, ministro Rogério Schietti.
Outros quatro magistrados superiores que compõem a turma votaram da mesma maneira, com destaque para a decisão da ministra Laurita Vaz, que fez questão de mostrar que mulheres trans são vítimas do mesmo tipo de violência impingida às outras mulheres.
“A própria realidade brutal vivenciada pelas mulheres trans nos permite identificar traços comuns com a violência praticada contra as mulheres sui generis. Os atos possuem a mesma origem: discriminação de gêneros”, argumentou, para dizer na sequência que aquilo que motivou os legisladores a aprovar a Lei Maria da Penha no passado é exatamente o mesmo motivo que hoje serve como pretexto para a agressão a mulheres trans, algo incutido num contexto cultural machista.