Literatura

4 livros para entender a construção da identidade nacional brasileira

Confira 4 livros nacionais para compreender mais a identidade nacional

Escrito em História el
Historiadora e professora, formada pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Escreve sobre história, história politica e cultura.
4 livros para entender a construção da identidade nacional brasileira
Retrato de José de Alencar. Domínio público

A sociedade brasileira é plural e diversa, resultado de um processo histórico complexo que envolve colonização violenta, escravidão, resistência indígena, chegadas de imigrantes de diversas partes do mundo e múltiplos encontros culturais. Ainda assim, muitas vezes a história do Brasil é colocada em segundo plano, ofuscada por uma visão eurocêntrica que considera a história europeia mais “interessante” ou “superior”.

Mas a história brasileira é tão rica quanto — ou até mais intensa — que qualquer narrativa europeia. E uma das formas mais poderosas de compreendê-la está na literatura. O Brasil tem uma tradição literária vibrante, que ajudou a construir a identidade nacional, refletindo os conflitos, as lutas, as belezas e contradições do povo brasileiro.

A seguir, confira quatro obras fundamentais que não apenas narram momentos importantes da história do Brasil, mas ajudam a formar o imaginário e o sentimento de pertencimento a uma nação. 

1. Iracema – José de Alencar (1865)

Retrato de José de Alencar
(foto: domínio público)

“Iracema” é um dos marcos do romantismo brasileiro e da chamada literatura indianista. Escrito por José de Alencar, o livro simboliza o mito de origem do povo brasileiro, retratando a relação entre uma indígena (Iracema) e um colonizador português (Martim). A história, poética e simbólica, representa a fusão das culturas indígena e europeia como base da identidade nacional — ainda que romantize uma relação marcada historicamente por violência e dominação.

Apesar de seu viés idealizador, “Iracema” se tornou uma metáfora poderosa sobre o nascimento do Brasil enquanto projeto de nação mestiça e singular.

2. O Tempo e o Vento – O Continente (vol. 1) – Érico Veríssimo (1949)

Érico Verissimo
(Foto: domínio público)

Nesta monumental obra, Érico Veríssimo narra, ao longo de gerações, a formação do estado do Rio Grande do Sul e, por extensão, do Brasil moderno. O primeiro volume da trilogia, “O Continente”, retrata desde os tempos das missões jesuíticas até as lutas entre impérios e repúblicas.

Por meio das famílias Terra Cambará e Amaral, Verissimo constrói uma epopeia nacional, entrelaçando história, política, cultura e conflitos regionais. A saga mostra como a identidade brasileira foi sendo forjada na mistura de culturas, na luta pelo poder e no cotidiano das pessoas comuns.

3. Vidas Secas – Graciliano Ramos (1938)

Capa do livro Vidas Secas
(Foto: domínio público)

Em “Vidas Secas”, Graciliano Ramos pinta um retrato profundo e doloroso do sertão nordestino e da vida de uma família de retirantes, marcada pela miséria, seca e opressão social. A linguagem seca, direta e econômica do autor reflete o ambiente árido e o sofrimento dos personagens, revelando um Brasil silencioso, marginalizado e invisível.

Mais do que um drama regional, “Vidas Secas” é uma crítica poderosa às desigualdades sociais e à exclusão estrutural, trazendo à tona o impacto da pobreza extrema e da ausência do Estado. A figura do pai Fabiano, da mãe Sinhá Vitória e do filho sem nome representam milhões de brasileiros condenados à luta pela sobrevivência — e à falta de voz.

4. Quarto de Despejo – Carolina Maria de Jesus (1960)

Carolina Maria de Jesus assinando seu livro Quarto de Despejo
(Foto: domínio público)

Publicado a partir dos diários da escritora Carolina Maria de Jesus, uma mulher negra, favelada, catadora de papel e mãe solo, “Quarto de Despejo” é uma denúncia crua e poderosa da pobreza urbana e do racismo estrutural no Brasil. Carolina registrou, com lucidez e força poética, a dura realidade das periferias de São Paulo nos anos 1950, revelando um Brasil negligenciado e invisível.

O livro chocou o país ao mostrar que, em meio ao crescimento econômico, milhões viviam na miséria. Hoje, é reconhecido como uma das vozes mais importantes da literatura brasileira — especialmente por trazer a perspectiva de quem, por muito tempo, foi silenciado.

Literatura como construção da nação

Essas quatro obras, tão distintas em estilo e contexto, têm em comum o fato de que não apenas contam a história do Brasil — elas ajudam a construí-la. São retratos vivos de épocas, territórios, lutas e esperanças. Ao mergulhar nessas narrativas, entendemos melhor quem somos enquanto povo e enquanto Estado.

A literatura brasileira é mais do que entretenimento ou arte: é memória viva, resistência cultural e identidade coletiva.

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