LITERATURA

3 livros da autora lésbica mais censurada pela ditadura militar brasileira

Figura central na resistência cultural, Cassandra Rios desafiou tabus sobre sexualidade e pagou um alto preço por sua ousadia

Odete Rios.Créditos: Vânia Toledo
Escrito en CULTURA el

Durante o regime militar, a escritora Cassandra Rios, pseudónimo de Odete Rios, se tornou uma figura incômoda para a ditadura por diversas razões, sendo a a principal delas, o teor erótico de suas obras, visto como uma afronta à moral da época. Nascida em 1932 em São Paulo, a escritora marca ainda hoje a rebeldia durante os anos de chumbo. 

Apesar da perseguição, tornou-se a primeira autora brasileira a vender mais de um milhão de exemplares, superando nomes como Jorge Amado, Clarice Lispector e Érico Veríssimo. Segundo o pesquisador Rodolfo Londero, em entrevista à BBC, a censura acabou impulsionando sua notoriedade. “A fama de ‘escritora maldita’ virou uma marca lucrativa para as editoras”.

A repressão, no entanto, teve consequências profundas. Em 1976, ano em que 14 de seus livros foram censurados em apenas seis meses, Cassandra decretou falência. Suas obras desapareceram das prateleiras, e até hoje boa parte de sua produção, com  cerca de 50 títulos, segue fora de circulação nas grandes editoras e livrarias. 

Foto: Luigi Mamprin / Revista Realidade, 1970

De acordo com relatos de Liz Rios, sobrinha da autora, Cassandra era interrogada com frequência no DOPS. Ela lembra que, ao publicar sob pseudônimo masculino, a tia conseguia escapar da censura. Ainda sim, diversos livros foram confiscados e queimados. Em entrevista à revista Realidade, em 1970, a escritora relatou o impacto do AI-5: “Sou uma criatura simples, triste. A vida de escritora tem sido dura para mim”. Cassandra Rios morreu em 2002, aos 69 anos, vítima de câncer.

Em celebração do Mês do Orgulho LGBT, Fórum relembra três títulos fundamentais da autora que sobrevive ainda quando esquecida. 

1. A Volúpia do Pecado

Publicado em 1948, quando Cassandra Rios ainda assinava como Odete aos 16 anos, A Volúpia do Pecado é reconhecido como o primeiro romance lésbico da literatura brasileira. Rejeitado por editoras paulistanas por seu conteúdo considerado escandaloso, o livro foi publicado de forma independente, com recursos emprestados por sua mãe. A obra narra a descoberta do desejo entre duas adolescentes, marcando o início da trajetória literária da autora ao abordar abertamente a sexualidade feminina.

2. Carne em Delírio (1948)

Em Carne em Delírio, Cassandra Rios acompanha a trajetória de Cristina, jovem da elite paulistana, que engravida após se entregar ao noivo Marcos, morto em um acidente. Rejeitada pelo pai, é acolhida pela governanta e levada à fazenda da família, onde conhece Alexandre, homem rude que a salva de um afogamento e com quem desenvolve uma relação intensa. Após um casamento frustrado na cidade, Cristina retorna à fazenda para viver um relacionamento marcado por desejo e dilemas morais. 

4. Veneno (1965)

Publicado durante o início da intensificação da censura no Brasil, Veneno apresenta Cássio, um escritor paulistano dividido entre sua vocação literária e relações afetivas que o desviam da escrita. Após um termino, envolve-se com várias mulheres em busca de sentido emocional, até desenvolver uma paixão obsessiva por Verônica. Paralelamente, estabelece uma amizade sincera com Sabina, uma artista lésbica que lhe oferece acolhimento e diálogo. Interpretado como uma metáfora da própria trajetória de Cassandra Rios, o romance reflete as frustrações de uma autora marginalizada e crítica do mercado editorial brasileiro, que rejeitava sua literatura enquanto exaltava obras estrangeiras com conteúdo semelhante. 

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