"Dezenas de milhares de anos atrás, em algumas das cavernas mais escuras e profundas da Europa, as crianças deixaram suas marcas", diz um estudo publicado no dia 4 de março no periódico Arts.
"Suas pegadas foram impressas no chão, e as digitais de suas mãos e dedos coloriram e esculpiram as paredes."
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A pesquisa, liderada por Ella Assaf, pesquisadora do Departamento de Arqueologia da Universidade de Tel Aviv, em Israel, oferece um pequeno vislumbre do papel das crianças pré-históricas em sítios de arte rupestre da Europa durante o Paleolítico Superior [50 mil anos a 12 mil anos a.C.].
Estima-se que pelo menos 40% das populações do Paleolítico Superior eram compostas por crianças e jovens adultos, mas há "poucas informações sobre suas atividades em cavernas profundas [de arte rupestre]", com exceção de evidências menores, como vestígios de pegadas e pequenas impressões de suas mãos e dedos nas paredes rochosas.
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56 das cavernas de arte rupestre que remontam ao Paleolítico europeu exibem sinais de mãos humanas, contam os pesquisadores, com um total de 769 amostras de mãos já identificadas nos sítios arqueológicos do continente. Algumas delas, infantis.
Outros registros mais raros dos desenhos rupestres se constituem de "imagens antropomórficas", como animais, plantas, sinais geométricos abstratos e representações de fenômenos naturais.
Mas o que chama atenção é que alguns desses registros de arte rupestres são feitos "tão fundo quanto é possível ir numa caverna", o que indica a necessidade de se esgueirar, engatinhar e escalar para passar por espaços muito apertados.
Dentre as 400 cavernas indicadas como sítios de arte rupestre descobertas na Europa Ocidental (sobretudo na França e na Espanha), a datar entre 40.000 a.C. e 14.000 a.C., muitas trazem ilustrações cuja autoria foi retraçada por estudos a mãos infantis, de crianças entre 2 e 12 anos de idade, que exploravam as regiões profundas das cavernas com outros membros de seu grupo familiar.
"Em algumas das cavernas, até 9% dos visitantes eram identificados como crianças, e infantes mais velhos correspondiam a até 27%".
Os pesquisadores sugerem que a presença de crianças em cavernas e seus indícios de arte rupestre podem estar ligados a funções como o aprendizado cultural — numa espécie de "escola" para a passagem do conhecimento comunitário —, à ocorrência de cerimônias ritualísticas — em cavernas nas quais se acreditava haver um portal para a comunicação com o divino — e até a "uma atividade comunal entre família, em que indivíduos de todos os gêneros e idades prestavam suas contribuições visuais e expressavam suas práticas sociais" por meio de desenhos nas rochas.
A relação entre as comunidades do Paleolítico europeu e as representações feitas em cavernas é interpretada, de maneira geral, como uma forma de mediação entre o humano e o cosmos, "refletindo crenças ontológicas e cosmológicas dos primeiros humanos".
A escolha por espaços profundos e de difícil acesso era, provavelmente, consciente, e servia "para se conectar com a natureza", já que as cavernas eram consideradas por muitas sociedades do Paleolítico europeu como "áreas liminares" que agiam como portais para o submundo.
As crianças do Paleolítico Superior deviam participar ativamente desses rituais artísticos e espirituais, aprendendo a cultura de sua comunidade, estimam os pesquisadores.
As pegadas deixadas por crianças jovens nas profundezas de cavernas consideradas sítios artísticos são uma evidência que aponta para sua contribuição à produção de artes rupestres.