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Donald Trump é racista, mentiroso, trapaceiro... Quem diz isso é o advogado e ex-faz tudo do presidente, Michael Cohen. E diz para a eternidade porque imortalizou as acusações e denúncias em um livro que chega às livrarias dos Estados Unidos na terça-feira (8). “Desloyal: a memoir” (em tradução livre poderia ser “Desleal: memórias”) é uma coletânea de denúncias feitas em primeira pessoa que narram conversas, projetos e manobras secretas das quais Cohen participou com afinco e foi parar na cadeia por conta de uma delas. Ele está cumprindo o restante da pena de três anos em casa, por causa da pandemia.
Um grupo de democratas chamado American Bridge (Ponte Americana) produziu e lançou uma propaganda eleitoral com Michael Cohen. De olho na câmera ele diz: “Não se pode confiar em Trump nem acreditar em uma palavra do que ele diz. Você não precisa gostar de mim mas por favor me ouça”. Essa é a parte difícil da história toda. Cohen foi condenado por mentir para o Congresso quando foi depor a respeito dos projetos imobiliários de Trump na Rússia, mas acabou admitindo toda a história da atriz pornô Stormy Daniels. Ela contou ter tido um caso extra conjugal com Donald Trump quando ele já estava casado com a primeira-dama.
Para evitar que o escândalo viesse à tona nas vésperas da eleição de 2016, Trump aprovou um pagamento de US$ 130 mil para calar a boca da atriz. E teria topado a compra do silêncio argumentando que se o segredo fosse revelado, ele teria que pagar muito mais à esposa. Michael Cohen cuidou do depósito e recebeu o dinheiro de volta em prestações, como se fossem honorários pelo trabalho de advogado. Agora, conta toda essa manobra, e muitas outras, no livro que é o assunto do momento na mídia americana. Se livro virasse resultado de eleição Trump estaria perdido. Mas nesta manhã de domingo, enquanto o assunto é destaque em quase todas as mídias liberais, não encontrei nem menção às memórias de Cohen na Fox News, a líder de audiência dos Estados Unidos, canal preferido dos conservadores.
Assim que Trump anunciou a decisão de concorrer a presidente, os três filhos mais velhos do clã teriam corrido ao escritório de Cohen para pedir que ele afastasse a ideia da cabeça do pai. Trump se lançou com um discurso racista, acusando imigrantes mexicanos de serem todos criminosos e estupradores. Por isso prometia construir um muro na fronteira com o México, para proteger o país. Os filhos temiam o estrago que as declarações do pai imporiam aos negócios da família. “Você precisa fazer meu pai suspender a campanha. Está matando a empresa”, teria dito Ivanka, a filha mais velha que hoje, junto com o marido Jarred Kushner, é conselheira do pai para todos os assuntos.
As 432 páginas de acusações e denúncias de Cohen dificilmente vão influenciar o resultado das urnas, mas darão muito assunto à oposição. Neste ano de protestos gigantescos contra o racismo estrutural da sociedade americana, que se expressa com força no comportamento da polícia, o livro garante que Trump é racista convicto. E tem um profundo desprezo pelo ex-presidente Barack Obama. “Ele só entrou na Universidade de Columbia e na Faculdade de Direito de Harvard por causa da porra da ação afirmativa”, teria dito Trump.
Segundo Cohen, o desprezo não é só por Obama mas pelos negros em geral. Em um trecho do livro, ele transcreve o que Trump teria dito: “me diga um país administrado por uma pessoa negra que não seja um buraco de merda. Mandela fudeu o país todo. Agora ele é um buraco de merda. Foda-se o Mandela. Ele não era um líder”. Cohen divulgou um vídeo pra o qual Trump contratou um ator negro para fazer o papel de Obama só para poder humilhar o personagem e demiti-lo na cena. E pelo que conta Cohen, o presidente não está nem um pouco preocupado com o eleitorado negro do país. Nem com os votos latinos. “Eles não são a minha gente. Nunca vou conquistar o voto latino. Assim como os negros, eles são muito burros para votar em Trump”.
O tratamento que o presidente costuma dar às mulheres já é conhecido do público. Em uma gravação divulgada antes da eleição de 2016 o mundo inteiro ouviu ele dizer que botava a mão nas partes íntimas de qualquer mulher quando bem entendesse. Na intimidade, não era diferente. Fazia comentários sobre o corpo da própria filha e não teria se furtado a falar sobre a filha de Cohen, na época com quinze anos: “olha só esse rabo! Adoraria ter um pouco dele”.
Trump foi alçado à presidência com o apoio decisivo dos evangélicos. É claro que o livro não poderia deixar de fora alguma cena que provocasse a ira desse grupo. Pois Cohen descreve uma reunião no Trump Tower, o prédio de luxo do presidente, na ilha de Manhattan, em Nova York. Líderes evangélicos rezaram com as mãos sobre a cabeça do então candidato. Depois que eles foram embora, Trump teria comentado com Cohen: “Você pode acreditar nessa besteirada? Você pode acreditar que as pessoas acreditam nessa baboseira”?
O livro não esconde a que veio. Termina dizendo: “você agora tem toda a informação de que precisa para decidir, por sua própria conta, em novembro”. Resta saber quem vai acreditar em quem até lá.