As urnas estão longe de serem abertas nos estados alemães da Turíngia e da Saxônia, neste domingo, mas já se sabe quem tem o potencial de redesenhar a política do país: Sahra Wagenknecht.
Fundado no início do ano, o partido da deputada, a Aliança que leva o nome dela (sigla BSW em alemão), que tem como bordão "Razão e Justiça", estreou nas eleições para o Parlamento europeu com 6,2% dos votos, bem mais que partidos tradicionais como o esquerdista Die Linke (2,7%), de onde Sahra saiu para montar sua nova sigla.
Agora, o BSW aparece nas pesquisas dos dois estados em segundo lugar, atrás da Alternativa para a Alemanha (AfD), de extrema-direita, e pode definir quem serão os governantes, em coalizão com parceiros.
Adversários de Sahra acusam a deputada de comandar o partido de maneira autocrática.
Críticos zombam da plataforma do BSW como sendo "tutti fruti", ou seja, tudo para todos.
O fato é que Sahra terá papel crucial nas eleições federais do ano que vem, que podem afundar a coalizão que mantém no poder o primeiro ministro Olaf Scholz.
Tradicionalmente estável, a política alemã passa por uma rápida transformação, que ameaça demolir o predomínio de cristãos democratas e social democratas.
NEM DIREITA, NEM ESQUERDA
Sahra Wagenknecht, que já abraçou o marxismo leninismo, é uma excelente comunicadora que prega uma política econômica de esquerda mas critica o foco em causas identitárias ou a chamada "cultura woke".
Ela defende ao mesmo tempo limites à imigração e o fim do conflito na Ucrânia. Questiona algumas propostas ambientalistas dos Verdes, por considerar que prejudicam pequenos empresários do país.
Nascida na Turíngia quando o estado ainda era parte da Alemanha Oriental, ela é filha de um estudante iraniano que voltou para seu país de origem quando Sahra ainda era criança.
Embora pregue a permanência da Alemanha na OTAN, Sahra critica com ênfase a influência dos Estados Unidos em assuntos alemães e defende boas relações com a Rússia e a China.
ALEMANHA PROFUNDA
O sucesso do BSW até agora deriva de sua aparente identidade com a chamada "Alemanha profunda", a classe média das cidades do interior.
Sarah argumenta que boa parte da base industrial alemã é sediada em cidades menores, empresas familiares não listadas em bolsa de valores que produzem empregos e tecnologia de qualidade.
Estas empresas foram profundamente afetadas pela disparada nos preços da energia que resultaram do boicote ao gás russo imposto por Washington.
Em entrevista à New Left Review, ela disse:
Deixar que a classe média seja destruída seria um verdadeiro erro político, porque muitos aspectos da crise econômica tem as suas raízes em más decisões políticas – decisões como a guerra com a Rússia, como a forma como a transição verde está sendo conduzida, como a postura antagônica em relação à China, o que vai claramente contra os interesses econômicos da Alemanha.
Ela sustenta que, manietado por Washington, o governo Scholz contraria os interesses da Alemanha, por exemplo, ao comprar gás importado em navios dos Estados Unidos, muito mais caro.
Isso vale também para a postura mais agressiva em relação à China, outra exigência de Washington.
Sahra lembra que os chineses tem muitos investimentos de longo prazo na Alemanha e não estão preocupados com flutuações da Bolsa, por isso produzem empregos estáveis:
Se nos isolássemos do mercado chinês, além de nos isolarmos da energia barata [da Rússia], as luzes se apagariam na Alemanha. É por isso que existe uma certa pressão, mesmo entre as grandes empresas, para não adotar uma estratégia isolacionista. Como percentagem do PIB, exportamos muito mais para a China do que os EUA.