DESIGUALDADES SOCIAIS

Economista vencedora do Nobel estima em 20 bilhões de dólares divida moral do mundo a países pobres

Esther Duflo apresenta proposta de imposto focada no clima em entrevista ao jornal britânico Financial Times

Créditos: Flickr PopTech 2009 Conference - Esther Duflo
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A professora franco-estadunidense Esther Duflo é considerada uma das economistas mais importantes da atualidade — especialmente depois de ter ganho o Prêmio Nobel de Economia em 2019, ao lado de seu parceiro de pesquisa e marido Abhijit Banerjee e seu colaborador Michael Kremer.

Na edição desta terça-feira (23) do jornal britânico Financial Times, Duflo concedeu uma entrevista na qual detalha a proposta dela de usar impostos direcionados sobre empresas e os ultra-ricos para financiar assistência relacionada ao clima para nações e indivíduos de baixa renda.

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A pesquisa de Duflo está voltada, em especial, para a redução da pobreza, principalmente por meio de seu trabalho como cofundadora do Laboratório de Ação contra a Pobreza Abdul Latif Jameel no Instituto de Tecnologia de Massachusetts.

Essa tarefa a levou a lidar com as implicações econômicas das mudanças climáticas, que estão tendo efeitos cada vez mais graves sobre muitos dos pobres do mundo.

A economista esteve na capital dos EUA, Washington D.C., na semana passada para participar de reuniões promovidas pelo Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional (FMI). Na ocasião, ela revelou uma nova proposta de usar impostos direcionados sobre empresas e os ultra-ricos para financiar assistência relacionada ao clima para nações e indivíduos de baixa renda.

Dívida moral e financiamento climático

Esther Duflo propõe uma abordagem para calcular a "dívida moral" das nações ricas em relação aos países pobres devido às emissões de carbono. Ela argumenta que as pessoas pobres, especialmente em países quentes, enfrentam um risco desproporcional de morte devido às mudanças climáticas.

Duflo sugere que o custo dessas vidas perdidas deve ser considerado e compensado pelos países ricos. Ela propõe a criação de novas fontes de financiamento, como impostos sobre corporações e os super-ricos, para fornecer assistência climática aos países de baixa renda.

"O ponto que estou fazendo é muito simples. Estou tentando colocar um número para a dívida moral que as pessoas ricas do mundo — particularmente as pessoas dos países ricos — têm para com as pessoas pobres do mundo relacionadas às nossas escolhas de consumo e, portanto, nossas emissões de carbono."

Impostos para o bem público

Duflo explicou que a sua proposta atual está alinhada com esforços anteriores para angariar US$ 500 bilhões e destacou que não sobrecarregaria a classe média dos países ricos. Ela enfatizou a importância da tributação como meio tradicional de contribuição para o bem público.

A economista destacou sua confiança em dados empíricos, especialmente estimativas de mortalidade do Global Impact Lab, e defendeu a tributação com base em evidências de que não desestimula a atividade econômica.

Ela também ressaltou a necessidade de colaboração internacional para garantir uma tributação uniforme e discutiu como o dinheiro poderia ser efetivamente usado, sugerindo transferências diretas de dinheiro acionadas por eventos climáticos.

"Se houver colaboração internacional, se conseguirmos ter uma tributação uniforme de empresas e indivíduos, isso não terá um grande custo de eficiência no funcionamento da economia", ponderou.

Uso eficiente de dinheiro

Duflo ressaltou que há vasta evidência do uso eficiente desse dinheiro pelas pessoas. Com a tecnologia atual, a conexão de todos a uma conta bancária para receber transferências automáticas acionadas por eventos climáticos já é uma realidade em países como Togo, podendo ser replicada em outros lugares.

Outra sugestão feita por Duflo é aprimorar o sistema de seguro em nações de baixa renda, onde a indústria seguradora ainda não está bem estabelecida. A disparidade de gastos durante a pandemia de Covid-19 entre países ricos e pobres destaca a importância de implementar pagamentos automáticos aos governos para enfrentar desastres.

"Durante a pandemia de Covid-19, vimos que os países ricos puderam gastar muito mais em medidas de estímulo fiscal do que os países mais pobres. Portanto, defendo pagamentos automáticos aos governos para lidar com desastres", disse.

Além disso, a expansão de medidas de adaptação é crucial para enfrentar os desafios das mudanças climáticas, incluindo a criação de espaços urbanos mais frescos e o desenvolvimento de variedades de culturas agrícolas mais resistentes à seca.

Taxas de tributação

Duflo levantou ainda questões sobre as taxas de tributação, especialmente para os grandes ganhadores e empresas. Se ela estivesse encarregada do sistema tributário global ou até mesmo nos EUA ou na França, sua abordagem seria bastante significativa.

Ela aponta que os EUA enfrentam um déficit fiscal estrutural, tributando apenas 25% do PIB, em comparação com os países nórdicos, que chegam a 45%.

Ela também destaca a injustiça de não tributar os super-ricos sobre a renda gerada por sua riqueza, enquanto outros contribuintes pagam impostos sobre sua renda.

Sua proposta de um imposto de 2% sobre a riqueza busca corrigir essa disparidade, considerando-o como um imposto sobre a renda da riqueza. Ela argumenta que essa mudança precisa ser global para evitar que os super-ricos movam suas fortunas para evitar tributação.

"No entanto, essa mudança precisa ser global, pois os super-ricos têm recursos para mover sua fortuna para evitar a tributação em um único país. Portanto, a coordenação internacional é fundamental", comentou.

Viabilidade política

A economista expressou otimismo sobre a viabilidade política de sua proposta de tributação mínima para os super-ricos. Ela observou um claro momento político nessa direção, embora reconheça que a implementação pode levar algum tempo.

Duflo destacou que, ao apresentar sua proposta nos últimos tempos, notou uma mudança nas respostas recebidas, com as pessoas agora fazendo perguntas mais concretas sobre sua viabilidade e governança. Isso a faz acreditar que o momento pode ser propício para avançar com essa medida, que ela considera necessária, razoável e factível.

"Quero acreditar que acontecerá. É realmente necessário. E é razoável. Não é tão difícil", finalizou.