CAPITALISMO DE COMPADRIO

Com discursos "bolsonaristas", Congresso dos EUA vota para banir Tik Tok

Se empresa chinesa não vender o controle em seis meses

Lobby.O Tik Tok fez intenso lobby contra o projeto, alegando que viola a Constituição dos EUA.Créditos: Reprodução
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Por 352 votos a 65, a Câmara dos Estados Unidos decidiu pelo banimento do Tik Tok em seis meses -- a não ser que a empresa chinesa ByteDance venda sua parte na plataforma.

O projeto segue para votação no Senado.

O presidente da Casa, republicano Mike Johnson, da Louisiana, disse: "A China comunista é o maior inimigo geopolítico da América e está usando tecnologia para minar ativamente a economia e a segurança da América".

Na verdade o Tik Tok é o maior sucesso de uma empresa global, que tem 150 mil funcionários em 120 países do mundo.

A plataforma tem 140 milhões de usuários registrados nos Estados Unidos e é utilizada como loja virtual por milhares de pequenos empresários do país.

O Tik Tok gerou U$ 15 bilhões em receitas em 2023 e até o final deste ano pretende atingir 1,8 bilhão de usuários em todo o planeta. Na China, tem o nome de Douyin.

As duas operações são distintas.

O Tik Tok acessado nos EUA -- e no Brasil -- tem como sede o refúgio fiscal das ilhas Caimã.

O sucesso da plataforma é atribuído à facilidade para editar vídeos curtos com efeitos e à monetização de lives que promoveram centenas de milhares de influenciadores digitais remunerados.

SUCESSO ENTRE JOVENS NOS EUA

Metade dos usuários do Tik Tok nos EUA tem entre 10 e 29 anos de idade e mais da metade do conteúdo é produzido por usuários entre 18 e 24 anos de idade.

Nos últimos meses, uma das características do Tik Tok foi o grande impulsionamento de conteúdos pró-Palestina, como não se vê no Facebook nem no X.

Uma pesquisa feita entre 23 e 30 de outubro do ano passado demonstrou que a hashtag #estoucomaPalestina foi compartilhada dez vezes mais que a #estoucomIsrael.

Por conta disso, lobistas de Israel criticaram a plataforma.

O Tik Tok negou que tenha modificado seu algoritmo, atribuindo o fenômeno à postura dos jovens estadunidenses de rejeitar o apartheid de Israel em Gaza.

A empresa também disse que opera de forma independente do Partido Comunista Chinês ou do governo da China.

O autor da lei, deputado Mike Gallagher, republicano do Wisconsin, diz que não pretende banir a plataforma, mas separar a empresa da ByteDance e, portanto, "do Partido Comunista Chinês".

Curiosamente, o democrata Jim Himes, do Comitê de Inteligência, votou contra:

A China fecha jornais, estações de rádio e TV e plataformas de mídia social. Nós, não.

O argumento central do autor da proposta é de que os chineses acessam dados pessoais dos usuários, podem coletar inteligência e eventualmente manipulá-los.

BOLSONARISMO EM WASHINGTON

Deputados que votaram a favor da proposta disseram que não se trata de um banimento, mas de proteger as crianças dos EUA.

Porém, o projeto é muito mais grave.

Fala em proteger estadunidenses de todos os aplicativos controlados por adversários estrangeiros, como China, Rússia, Coreia do Norte e Irã, e abre a possibilidade de banimento de outras plataformas.

A sessão do Congresso teve vários momentos de bolsonarismo puro.

A deputada Ashley Henson, republicana de Iowa, disse que o Partido Comunista Chinês instalou 140 milhões de balões de espionagem nos telefones de jovens estadunidenses. Perguntou:

E se o Tik Tok mandar um alerta no dia da eleição dizendo que elas foram canceladas?

Ela se refere ao fato de que um balão atmosférico chinês foi parar nos Estados Unidos. Houve suspeitas, mas o Pentágono concluiu que não era um balão de espionagem.

Nos últimos meses, ganhou tração nos Estados Unidos a ideia de que é preciso separar a economia local da China, o que é conhecido como "decoupling".

O fato de que a economia chinesa vai se tornar a maior do mundo trouxe de volta a ideia do "perigo amarelo", muito popular contra o Japão durante a Segunda Guerra Mundial.

Vários discursos de hoje no Congresso dos EUA lembraram os tempos do macartismo.

Joseph McCarty, um senador republicano de Wisconsin, um estado do interior, promoveu uma "caça às bruxas" durante a Guerra Fria, procurando comunistas sob a cama de cada estadunidense.

A deputada Kat Cammack, da Flórida, por exemplo, disse que votava pelo projeto para evitar o recrutamento pela China "de criadores de conteúdo como soldados do Partido Comunista". Ela estava vestido de vermelho berrante, a cor dos republicanos.

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Wang Wenbin, perguntado a respeito do projeto, disse:

Esta prática de recorrer a táticas de intimidação quando não se consegue vencer numa concorrência leal perturba as operações comerciais normais, prejudica a confiança dos investidores internacionais no ambiente de investimento e mina a ordem econômica e comercial internacional normal, prejudicando em última análise os próprios EUA.