BRASIL

Silvio Almeida condena "punição coletiva" de Israel em Gaza no Conselho de Direitos Humanos da ONU

Falando em nome do governo brasileiro, Almeida reiterou as críticas de Lula ao massacre promovido pelas forças israelenses, que já mataram quase 30 mil palestinos.

Silvio Almeida em discurso no Conselho de Direitos Humanos da ONU.Créditos: MDHC
Escrito en GLOBAL el

Em discurso nesta segunda-feira (26) na 55ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, na Suíça, o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, condenou a "punição coletiva" imposta pelo governo sionista de Israel aos palestinos que vivem na Faixa de Gaza.

Falando em nome do governo brasileiro, Almeida reiterou as críticas de Lula ao massacre promovido pelas forças israelenses, que já mataram quase 30 mil palestinos.

"Diante desta tribuna, não posso deixar de registrar nossa profunda indignação com o que acontece, neste momento, em Gaza. Já, em mais de uma oportunidade, condenamos os ataques perpetrados pelo Hamas contra cidadãos israelenses e demandamos a libertação imediata e incondicional de todos os reféns. Mas também reitero nosso repúdio à flagrante desproporcionalidade do uso da força por parte do governo de Israel, uma espécie de “punição coletiva”, que já ceifou a vida de quase 30 mil palestinos – a maioria deles, mulheres e crianças –, forçadamente deslocou mais de 80% da população de Gaza, e deixou milhares de civis sem acesso a energia elétrica, água potável, alimentos e assistência humanitária básica", afirmou Almeida em seu discurso, em inglês.

O representante brasileiro também voltou a falar do apoio à ação movida pela África do Sul no Tribunal Penal Internacional, em Haia, acusando Israel de promover um genocídio nos territórios palestinos.

"Ao celebrarmos a iniciativa da África do Sul de acionar a Corte Internacional de Justiça para proteger a população palestina, ao amparo da Convenção para a Repressão e Punição do Crime de Genocídio, instamos o Estado de Israel a cumprir integralmente as medidas emergenciais determinadas pelo tribunal no sentido de que cessem as graves violações ao direitos humanitário e impedir o cometimento das condutas tipificadas no Artigo 2º da Convenção, que incluem “matar ou submeter intencionalmente um grupo a condição de existência capazes de ocasionar-lhe a destruição física total ou parcial”, ou seja, genocídio. O Brasil, conforme nossa manifestação oficial em relação à opinião consultiva solicitada pela Assembleia Geral à Corte, espera, ainda, que o tribunal reafirme que a ocupação israelense dos territórios palestinos é ilegal e viola normas internacionais", disse Almeida.

O ministro ainda falou da responsabilidade em representar o Brasil no Conselho de Direitos Humanos da ONU.

"Ao ocuparmos novamente uma cadeira neste Conselho, renovamos nosso compromisso pela construção de um mundo em que todas as pessoas tenham a oportunidade de conhecer e aprender com o passado e a possibilidade de projetar para si e para sua comunidade um futuro mais justo e solidário. Que direitos humanos seja sinônimo de palavras como futuro, transformação e esperança", concluiu.

Leia a íntegra

Segmento de Alto Nível da 55ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos
Genebra, 26 de fevereiro de 2024

Senhor Omar Zniber, Presidente do Conselho de Direitos Humanos,

Senhor Volker Türk, Alto Comissário das Nações Unidas para Direitos Humanos,

Representante Permanente do Brasil junto às Nações Unidas em Genebra, Embaixador Tovar Nunes, 

Representantes governamentais e não governamentais,

Amigos e amigas,


É com grande honra e sentido de responsabilidade que volto a esta tribuna com a missão de inaugurar mais um mandato do Brasil junto ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. Agradeço, em nome do governo brasileiro e do Presidente Lula, cada um dos 144 votos recebidos pelo Brasil, sinal inequívoco da confiança depositada em meu país.

Há um ano, ainda no início de minha gestão como Ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, anunciei que o Brasil havia voltado, “de uma nova forma e para um novo tempo”. O ano que passou nos desafiou, diariamente, a reconstruir políticas públicas e a pensar novas abordagens para responder às necessidades de um Brasil que encontramos mais desigual e mais dividido. No plano internacional, sob a liderança do Presidente Lula, resgatamos nossa vocação universalista e reposicionamos o Brasil nas discussões multilaterais e nos contenciosos internacionais no campo dos direitos humanos.

Encontramos como desafio – que acredito que seja também de outros países –fazer a aproximação dos princípios e das normas de direitos humanos em algo que possa se materializar na vida das populações. Por isso, defendemos a necessária convergência entre o debate econômico e a agenda de direitos humanos. Sem transformações econômicas profundas que incluam a proteção do trabalhadores, a ampliação dos direitos sociais e a inclusão dos pobres no orçamento, os direitos humanos tornar-se-ão retórica vazia e o caminho para a ascensão do fascismo estará livre. 

Em 1º de dezembro de 2023, o Brasil assumiu a presidência de turno do G20. Sob o lema “construir um mundo justo e um planeta sustentável”, o Brasil elegeu como temas prioritários: 1) inclusão social e combate à pobreza e à fome; 2) transição energética e promoção do desenvolvimento sustentável em suas dimensões econômica, social e ambiental; e 3) reforma das instituições de governança global.

Sobre esse último ponto, conclamo a todos os presentes a, conjuntamente, refletirmos sobre o papel a ser desempenhado por este Conselho. Aqui, são colocados muitos dos desafios enfrentados pela humanidade. Há, ainda, quem resista a enxergar parte dessa humanidade como destinatária dos mesmos direitos de que desfrutam e, tragicamente, há quem não acredite que esses desafios que enfrentamos são, de fato, comuns a todos nós. Os direitos humanos não podem se submeter à lógica mercantil, em que só os que podem pagar são dignos de respeito.  

É preciso reinventar as possibilidades de cooperação deste que é o principal órgão de diretos humanos das Nações Unidas. A instrumentalização do Conselho como subterfúgio moral para que os países mais ricos possam impor seu poder bélico e econômico apenas aprofundará a crise do multilateralismo e, o que considero mais preocupante, resultará no descrédito das instituições internacionais aos olhos de nossas populações. 

Internamente, temos reforçado a importância da participação social na construção das políticas de direitos humanos, e cito alguns exemplos disso. Consciente que as pessoas com deficiência e suas famílias encontram inúmeras barreiras para usufruir de cidadania plena, lançamos o “Novo Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência – que denominamos de “Novo Viver Sem Limites”. 

No enfrentamento da miséria e a fome no Brasil, olhamos para os mais vulneráveis e lançamos o Plano Nacional “Ruas Visíveis - pelo direito ao futuro da população em situação de rua”. Estamos também trabalhando na construção de um novo Plano Nacional para Pessoas Idosas, que atenda esse grupo em toda sua diversidade, e apoiaremos a elaboração de uma convenção internacional sobre o tema. Uma nova Política Nacional de Direitos da Criança e Adolescente, que orientará as iniciativas governamentais para os próximos 10 anos também está em curso e, em abril, realizaremos a 12ª Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente.

No final do ano passado, entregamos à sociedade brasileira a “Estratégia Nacional de Enfrentamento à Violência contra Pessoas LGBTQIA+”, que constitui um pacote de ações voltadas à prevenção da violência e proteção dessa população. No plano internacional, passamos a integrar a “Equal Rights Coalition”, o que reforça nosso compromisso em construir um mundo livre de violência e discriminação com base em orientação sexual e identidade de gênero.

Estamos igualmente empenhados em aprimorar nossas políticas de proteção para defensores de direitos humanos, comunicadores e ambientalistas, objeto do recém-instituído Grupo de Trabalho Técnico Sales Pimenta, com ampla participação da sociedade civil. Ainda este ano, receberemos a visita da relatora especial sobre a situação dos defensores de direitos humanos e temos envidado esforços para a ratificação do Acordo de Escazú, que reforçará o regime de proteção dos ambientalistas.

Reitero o compromisso do Brasil com a questão do meio ambiente e da mudança do clima, bem como suas relações com a agenda de direitos humanos. Como sede da 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, em 2025, teremos a oportunidade de sublinhar a interrelação entre a promoção do desenvolvimento sustentável e a realização dos direitos humanos, presente na Agenda 2030, e recordar a centralidade da obrigação dos países desenvolvidos em cooperar com o Sul Global para a implementação de políticas sustentáveis, conforme previsto no ODS 17 e em outros instrumentos.

A discussão sobre o direito a um meio ambiente limpo e saudável também encontra relação com o tema empresas e direitos humanos. O Brasil favorece um avanço efetivo das negociações de um tratado juridicamente vinculante sobre o tema, que garanta o respeito aos direitos humanos em toda cadeia global de produção de bens e serviços. Por este motivo, nos candidatamos para sediar o próximo Fórum Regional de Direitos Humanos e Empresas, reunindo países da América Latina e do Caribe. Domesticamente, estamos elaborando uma Política Nacional de Direitos Humanos e Empresas, alinhada aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.  

No campo da memória, verdade e justiça, o ano de 2024 marcará os 60 anos do Golpe Militar que inaugurou 21 anos de um regime ditatorial repressivo, violento e antipopular no Brasil, cujas sombras ainda pairam sobre a nossa sociedade. Diversos eventos promovidos por entidades governamentais e não governamentais buscarão enfatizar a importância da defesa permanente da democracia. Nesse contexto, exortamos este Conselho a aprofundar seus trabalhos no campo do combate ao discurso de ódio e à desinformação, que, consistentemente, tem minado não apenas nossas democracias, mas a convivência pacífica no interior de nossas sociedades e entre nossos povos. Por isso, o Brasil entende ser seu dever, mas também deste Conselho, se opor firmemente a toda forma de racismo, sexismo, antissemitismo ou islamofobia. 

Senhoras e senhores,

Diante desta tribuna, não posso deixar de registrar nossa profunda indignação com o que acontece, neste momento, em Gaza. Já, em mais de uma oportunidade, condenamos os ataques perpetrados pelo Hamas contra cidadãos israelenses e demandamos a libertação imediata e incondicional de todos os reféns. Mas também reitero nosso repúdio à flagrante desproporcionalidade do uso da força por parte do governo de Israel, uma espécie de “punição coletiva”, que já ceifou a vida de quase 30 mil palestinos – a maioria deles, mulheres e crianças –, forçadamente deslocou mais de 80% da população de Gaza, e deixou milhares de civis sem acesso a energia elétrica, água potável, alimentos e assistência humanitária básica. 

A criação de um Estado Palestino livre e soberano, que conviva com o Estado de Israel, é condição imprescindível para a paz. Consideramos ser dever deste Conselho prestigiar a autodeterminação dos povos, a busca da solução pacífica dos conflitos e se opor de forma veemente a toda forma de neocolonialismo e de Apartheid. 

Ao celebrarmos a iniciativa da África do Sul de acionar a Corte Internacional de Justiça para proteger a população palestina, ao amparo da Convenção para a Repressão e Punição do Crime de Genocídio, instamos o Estado de Israel a cumprir integralmente as medidas emergenciais determinadas pelo tribunal no sentido de que cessem as graves violações ao direitos humanitário e impedir o cometimento das condutas tipificadas no Artigo 2º da Convenção, que incluem “matar ou submeter intencionalmente um grupo a condição de existência capazes de ocasionar-lhe a destruição física total ou parcial”, ou seja, genocídio. O Brasil, conforme nossa manifestação oficial em relação à opinião consultiva solicitada pela Assembleia Geral à Corte, espera, ainda, que o tribunal reafirme que a ocupação israelense dos territórios palestinos é ilegal e viola normas internacionais. 

Senhoras e senhores,

Ao ocuparmos novamente uma cadeira neste Conselho, renovamos nosso compromisso pela construção de um mundo em que todas as pessoas tenham a oportunidade de conhecer e aprender com o passado e a possibilidade de projetar para si e para sua comunidade um futuro mais justo e solidário. Que direitos humanos seja sinônimo de palavras como futuro, transformação e esperança. 

Muito obrigado.