DIA D

Julian Assange: o caso da Liberdade de Imprensa do século 21

Fundador do WikiLeaks enfrenta a possibilidade de ser condenado a uma sentença de 175 anos por publicar documentos do governo dos Estados Unidos que revelam evidências de crimes de guerra e violações dos direitos humanos

Créditos: Divulgação #FreeAssange
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O dia 19 de fevereiro de 2024 é a data que definirá o destino de Julian Assange, 52 anos, fundador do WikiLeaks, e até certa medida, o que é ou não liberdade de imprensa.

Assange tornou-se mundialmente famoso após a divulgação do vídeo "Collateral Murder", que expôs um ataque de helicóptero dos EUA a civis iraquianos.

Ele encorajou denunciantes a fornecer informações de maneira anônima. A parceria entre Assange e grandes jornais, como The Guardian, New York Times e Der Spiegel, resultou na publicação dos chamados "Afghan war logs", "Iraq war logs" e do "Cablegate".

Assange enfrenta a possibilidade de ser condenado a uma sentença de 175 anos por publicar documentos do governo dos Estados Unidos que revelam evidências de crimes de guerra e violações dos direitos humanos.

A decisão política de processar é sem precedentes e estabeleceria um precedente preocupante para todos os jornalistas e editores no mundo.

Decisão nas mãos da Justiça britânica

O jornalista, programador e ativista australiano ficou famoso por divulgar uma série de documentos confidenciais relacionados a atividades governamentais e militares, expondo segredos de Estado e práticas controversas.

Nesta terça-feira, no Royal Courts of Justice (os Tribunais Reais de Justiça) em Londres (Inglaterra), dois juízes da alta corte vão ouvir argumentos em um pedido de autorização para apelação de Assange.

France24 - Manifestantes pró-Assange em frente ao Royal Courts of Justice

O edifício de pedra cinza no estilo neogótico vitoriano foi construído na década de 1870 e inaugurado pela rainha Victoria, em 1882. Fica em Westminster e abriga o Supremo Tribunal e o Tribunal de Apelação da Inglaterra e do País de Gales.

No interior desse prédio, a defesa de Assange vai alegar que o cliente não deveria ser transferido da prisão de segurança máxima para homens de Belmarsh, localizada em Thamesmead, sudeste de Londres, para enfrentar um julgamento e uma possível sentença de 175 anos nos Estados Unidos, onde ele enfrenta 18 acusações criminais por seu suposto papel em obter e divulgar documentos classificados.

The Nation - Manifestantes pró-Assange em frente à prisão de Belmarsh

Mudança de posicionamento do governo australiano

Divulgação Andrew Wilkie - Anthony Albanese fala e defesa de Julian Assange no Parlamento da Austrália

O Parlamento da Austrália aprovou no dia 14 de fevereiro uma moção instando o Reino Unido e os EUA a não extraditarem Assange e devolvê-lo ao seu país natal, elevando o tom diplomático que vinda sendo adotado pelo país sobre o caso. 

O primeiro-ministro da Austrália, Anthony Albanese, declarou que espera um fim amigável. Ele afirmou que “não cabe ao país interferir nos processos legais de outras nações, mas é apropriado que seja colocada a opinião muito forte sobre a necessidade de o caso ser concluído” . 

14 anos de luta

Reprodução Pour Press

Os problemas legais de Assange começaram em 2010, quando promotores suecos ordenaram sua detenção sob suspeita de estupro e coerção sexual, acusações que ele sempre negou. Ele foi preso em abril de 2019 na Embaixada do Equador em Londres, onde havia buscado asilo político desde 2012.

O motivo da prisão do fundador do WikiLeaks em 2019 está relacionado a um pedido de extradição dos Estados Unidos. Ele é acusado de conspiração para cometer intrusão em computadores e violação da Lei de Espionagem dos EUA por sua participação na obtenção e divulgação de documentos secretos do governo estadunidense.

Verdades inconvenientes

Reprodução WikiLeaks

Um dos vazamentos mais significativos ocorreu em em 28 de novembro de 2010, quando foi publicada uma grande quantidade de documentos diplomáticos dos EUA, conhecidos como "Cablegate".

Esses documentos incluíam comunicações entre embaixadas estadunidenses e o Departamento de Estado dos EUA, revelando informações sensíveis e opiniões franqueadas sobre diversos líderes mundiais, inclusive do Brasil.

O olhar de Washington sobre o Brasil

AgBr (Fernando Frazão) - Encerramento das Olimpíadas do Rio 2016

O Brasil foi protagonista em vazamentos do Cablegate, com o WikiLeaks expondo um vídeo simulando um ataque dos EUA ao Rio de Janeiro, resultando em mortes de civis e jornalistas.

Além disso, outras revelações marcantes incluem críticas à organização das Olimpíadas no Rio pela Ministra Conselheira Lisa Kubiske e a percepção dos EUA sobre a busca "neurótica" do Brasil por igualdade.

Críticas ao Plano Nacional de Defesa, a "paranoia brasileira" na defesa da Amazônia e operações antiterroristas com apoio dos EUA também foram expostas.

As revelações proporcionam uma visão singular das relações entre os dois países, evidenciando áreas de cooperação, desconfiança e estratégias diplomáticas.

Derretendo reputação dos EUA

U.S. Department of Defense - Prisão de Gantánamo

Além de informações inconvenientes sobre o Brasil, o Cablegate abalou a legitimidade das operações da política externa dos Estados Unidos e seu papel de "polícia do mundo", sempre pronto para atuar em defesa da "democracia e dos direitos humanos".

No Iraque, o vazamento do vídeo "Assassinato Colateral" em 2010 evidenciou o indiscriminado ataque a civis em Bagdá, desafiando a narrativa oficial e constrangendo as forças estadunidenses.

Os Arquivos de Guantánamo, divulgados em 2011, revelaram violações sistemáticas dos direitos humanos, expondo torturas e detenções prolongadas de inocentes na prisão que abrigar indivíduos capturados durante a "Guerra ao Terror" declarada pelos Estados Unidos após os ataques de 11 de setembro de 2001.

A extensão da espionagem dos EUA, confirmada por vazamentos de telegramas diplomáticos (2010/2011) e documentos da NSA (2016), gerou crises diplomáticas ao revelar intervenções nos assuntos de outros países.

Wikimedia Commons - Hilary Clinton teve emails constrangedores vazados

Em 2016, o Wikileaks expôs e-mails de Hillary Clinton, lançando luz sobre práticas questionáveis em sua campanha e suscitando debates sobre a integridade democrática nos EUA.

Os vazamentos também proporcionaram revelações significativas sobre diversas nações. No caso da Líbia, os telegramas expuseram contradições na política externa dos EUA.

No Paquistão, confirmaram a presença militar não declarada dos EUA e apontaram o ISI como "organização terrorista". No Iêmen, detalhes sobre ataques de drones e acordos secretos foram revelados.

Nos eventos da Primavera Árabe, documentos destacaram a brutalidade do regime egípcio e influenciaram a Revolução do Jasmim na Tunísia.

No Iraque, um telegrama crucial impactou as negociações para o retorno das tropas dos EUA, revelando incidentes de violência indiscriminada. O legado duradouro do Cablegate ressoa nas relações internacionais e na compreensão global da política e dos direitos humanos.

Filhos e casamento

Getty Images
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Julian Assange e sua parceira, Stella Moris, casaram-se no dia 24 de março de 2022 na prisão de segurança máxima de Belmarsh, em Londres.

O fundador do WikiLeaks obteve permissão em 2021 para se casar enquanto enfrenta extradição para os EUA por acusações de espionagem. Moris usou um vestido lilás até o chão, projetado por Vivienne Westwood, e fez um discurso emocional após o casamento.

Stella era advogada de Assange quando se apaixonaram, em 2012. Ela escondeu por cinco anos seu relacionamento com o jornallistas. Nesse período, tiveram dois filhos, Gabriel, nascido em 2018, e Max, nascido em 2019.

Atualmente, Moris está na linha de frente na luta contra a extradição de Assange para os EUA. Ela destaca que o caso é político e poderia ameaçar a liberdade de imprensa.

O casal, que conseguiu manter seu relacionamento em segredo por seis anos, enfrenta uma batalha legal e política complexa, enquanto tenta preservar a integridade do WikiLeaks e a liberdade de informação.

Ithaka – A Luta de Assange

AgBr (Paulo Pinto) - Em campanha pela liberdade do filho, pai de Julian Assange veio ao Brasil divulgar o documentário Ithaka – A Luta de Assange, de Ben Lawrence

O documentário "Ithaka – A Luta de Assange", dirigido por Ben Lawrence, foi lançado no Brasil em agosto de 2023 por John Shipton, pai de Julian Assange.  O filme tem estreia prevista no dia 31 de março.

O longa destaca a batalha pela liberdade de Julian Assange e sua possível mudança para o Brasil após sua libertação e aborda a fundação do WikiLeaks por Assange.

Trata também dos vazamentos de documentos secretos em 2010 e os desdobramentos legais que o levaram à prisão na Inglaterra em 2019, enfrentando uma possível extradição para os EUA, onde pode receber uma pena de até 175 anos de prisão.

O enredo destaca a luta incansável dos pais de Assange em busca de aliados para sua libertação. Mostra a atuação do pai dele, Shipton, e da mulher, Stella Assange, por sua liberdade. Eles viajam o mundo atrás de aliados que possam ajudar na causa de um homem que fez apenas o seu trabalho, enquanto os culpados pelos crimes hediondos, dos quais denunciou, não são nem questionados.

Confira o trailer

WikiLeaks

O WikiLeaks, uma organização multinacional de mídia e biblioteca associada, foi fundado por Julian Assange em 2006. Especializado na análise e publicação de grandes conjuntos de dados censurados, revelou mais de 10 milhões de documentos relacionados a guerras, espionagem e corrupção.

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