De BERLIM | Após o recente bombardeio deflagrado por Israel em Damasco, capital da Síria, no dia 30 de setembro, que resultou na morte três civis, além de ferir seis pessoas, um refugiado sírio que vive em Berlim, na Alemanha, expressa o temor por sua família e reflete sobre a complexa situação de seu país. Ele compartilhou suas impressões em entrevista à Fórum, preferindo não se identificar por medo de represálias.
O ataque israelense, supostamente direcionado contra alvos ligados ao grupo Hezbollah, reacendeu discussões sobre a crescente influência de potências estrangeiras nos conflitos do Oriente Médio. O episódio remete ao massacre promovido por Israel contra palestinos na Faixa de Gaza, com o apoio dos EUA, e agora também no Líbano. Embora Israel tenha justificado a ação militar como uma resposta às atividades do Hezbollah, o impacto sobre civis e a soberania síria permanece um ponto de tensão na região.
O jovem de 25 anos, que conta ter sido criado como muçulmano mas que, atualmente, não pratica a religião, vive em Berlim há cerca de um ano após fugir da guerra civil. Ele descreveu a situação em seu país como insustentável.
"Na Síria, todos estão se matando. Não apenas o governo, mas também as milícias. Eu tentei vir para cá [Berlim] legalmente antes, mas fui recusado porque não falava alemão o suficiente. Depois, a situação ficou muito perigosa", disse.
A guerra civil na Síria, que já dura mais de uma década, transformou o cotidiano de milhares de pessoas como esse jovem refugiado. Ele conta que tanto a casa de sua família quanto a de seu tio foram bombardeadas e que a violência, que começou com protestos pacíficos contra o regime sírio, rapidamente escalou para um conflito multifacetado. "As pessoas queriam mudar o governo, mas o governo respondeu com violência. Depois, surgiram milícias apoiadas por organizações que alegavam ser islâmicas, mas eram extremistas, como o Estado Islâmico", explicou.
O último ataque israelense em Damasco [veja vídeo abaixo] trouxe novas preocupações para o jovem, especialmente por sua família ainda estar na Síria. "Estou aterrorizado, mas não há nada que eu possa fazer. Liguei para meu pai logo depois do ataque. Ele está em Damasco e, felizmente, a explosão não foi perto dele", relatou.
Ele mencionou que as pessoas na Síria estão tão acostumadas com a guerra que, apesar do medo constante, aprenderam a conviver com essa realidade.
“Podemos dizer que chegamos a um ponto em que as pessoas se acostumam com essa situação. Da mesma forma que você pode se acostumar com a paz, também pode se acostumar com a guerra. Isso não significa que você não tenha medo. Significa que você tem medo, mas já está habituado, e sabe que essa situação vai continuar acontecendo”, lamentou.
“Israel está sempre atacando a Síria, não só agora. Não é a primeira vez. O governo sírio não faz nada porque não tem como lutar contra eles”, prosseguiu.
A situação geopolítica no Oriente Médio, que envolve múltiplos atores, incluindo Israel, o Hezbollah e várias outras facções, é complexa. O jovem vê o apoio do governo sírio ao Hezbollah como um dos motivos pelos quais Israel tem intensificado seus ataques no país. "Talvez Israel esteja atacando agora porque o governo sírio apoia o Hezbollah, mas quem sofre são as pessoas, não o governo", afirmou.
O refugiado também reflete sobre a questão palestina, uma causa amplamente apoiada na Síria e em outros países árabes. "Sim, as pessoas na Síria apoiam a Palestina. Muitos povos árabes apoiam", disse ele. No entanto, deixou claro que seu apoio é pela paz, e não pela violência. "Eu apoio para que eles possam ter seus direitos, e isso significa a solução de dois estados, israelense e palestino", prosseguiu.
“Se eles ficarem em seus próprios países e cuidarem dos seus próprios assuntos, haverá paz. Qualquer coisa diferente disso será guerra. Um lado não vai aceitar que o outro está tomando suas terras", pontuou.
Sobre a possibilidade de uma solução para os conflitos que assolam o Oriente Médio, o jovem se mostra pessimista. "Passei mais de oito anos com esperança de mudança. Agora estou sem esperança. Não acho que nada vá mudar", disse, resignado com a perspectiva de continuar sua vida longe de sua terra natal.
“Acredito que uma solução política pode ser alcançada, porque a guerra não seria uma decisão sábia para nenhum desses países. No fim, as mortes afetam o povo antes de atingirem os governos”, refletiu.
Para ele, buscar refúgio em Berlim é a chance de uma vida nova, mas a sensação de perda ainda o acompanha.
“É um renascimento”, finalizou.