Já se perguntou por que o dólar é a moeda mais usada no comércio internacional? E por que os Estados Unidos podem impor sanções econômicas a outros países usando o seu poder sobre o sistema financeiro global? Essas são algumas das questões que estão motivando uma ‘campanha’ contra a hegemonia do dólar, que vem ganhando força em todo o mundo.
Embora em ritmo lento, especialistas avaliam que esteja ocorrendo um movimento chamado de “desdolarização”, que é quando a moeda americana sofre uma influência de desvalorização em decorrência do uso de outras moedas no mercado. E seu uso no comércio internacional vem sendo questionado por alguns países, que preferem negociar com suas próprias moedas.
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É o caso do Brasil e da China, que assinaram acordos para facilitar o intercâmbio comercial em reais e yuans, reduzindo os custos das transações.
Outros países, como a Índia e a Malásia, também estão buscando ampliar o uso de suas moedas em negócios transfronteiriços, assinando recentemente um acordo em abril. Até mesmo a França, tradicional aliada dos EUA, pretende realizar operações em yuans.
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Muitos especialistas em câmbio evitam fazer previsões sobre o futuro do dólar, pois já se equivocaram algumas vezes no último século. No entanto, eles reconhecem que há um movimento crescente de negócios que buscam alternativas ao uso do dólar. Eles consideram isso um sinal importante, ainda que pequeno e gradual, de uma mudança que não era tão comum no passado.
Muitos governantes do mundo têm uma justificativa parecida para adotar essas medidas. Eles afirmam que o dólar está sendo usado como uma arma pelos Estados Unidos, que impõem suas prioridades de política externa – e castigam quem não concorda com elas.
A Rússia enfrenta uma pressão econômica sem precedentes dos EUA e seus aliados ocidentais por causa de sua intervenção na Ucrânia.
O governo Biden impôs sanções severas, que bloqueou grande parte das reservas estrangeiras da Rússia e isolou o país do sistema financeiro global. As medidas mostraram ao mundo a força do dólar e a vulnerabilidade da Rússia, que dependia muito das exportações de energia.
Uma questão que as autoridades de Washington precisam enfrentar é: ao usar o dólar como arma geopolítica, eles não só colocam em risco a posição dominante do dólar no comércio mundial, mas também podem enfraquecer seu poder de influenciar o cenário global.
Segundo Daniel McDowell, autor de Bucking the Buck: US Financial Sanctions and the International Backlash Against the Dollar, a melhor forma de garantir a eficácia das sanções a longo prazo é deixá-las como uma possibilidade e não aplicá-las de fato.
Uma das razões para a diminuição da influência do dólar é a estratégia da China. O líder chinês Xi Jinping quer fortalecer o yuan no cenário financeiro mundial, e seu governo tem incentivado o uso da moeda em transações internacionais. Porém, grande parte do esforço está ocorrendo sem o envolvimento de Pequim.
A Índia e a Malásia, que não são aliadas estratégicas da China, criaram em abril um novo mecanismo para fazer o comércio bilateral em rúpias. Esse mecanismo faz parte de um esforço maior do governo de Narendra Modi, que não aderiu às sanções impostas pelos Estados Unidos contra a Rússia, para usar menos o dólar em algumas transações internacionais.
Em maio, a Associação das Nações do Sudeste Asiático decidiu aumentar o uso das moedas locais para o comércio e o investimento na região. E há poucas semanas, a Coreia do Sul e a Indonésia fecharam um acordo para facilitar as trocas diretas de won e rúpias.
O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, questionou o papel do dólar no comércio internacional durante uma visita a Xangai em abril. Ele estava em um palco com as bandeiras dos BRICS, grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
O presidente defendeu que as maiores economias emergentes do mundo buscassem uma alternativa para substituir o dólar nas transações comerciais, indagando “quem determinou que o dólar era a moeda (de troca) depois do fim da paridade do ouro?”.
Ele relembra o início da década de 1970, quando o sistema monetário internacional criado após a Segunda Guerra Mundial – chamado de Acordo de Bretton Woods – que colocou o dólar como a moeda-chave das finanças globais, estava entrando em crise.
O fim do sistema não diminuiu a importância do dólar. Até hoje, ele é a principal moeda de reserva do mundo, o que aumenta a procura por títulos americanos e permite que o país tenha grandes déficits comerciais e fiscais.
“O domínio do dólar americano gerou insatisfação nos países por décadas”, afirmou Jonathan Wood, diretor de questões globais da consultoria Control Risks. “As sanções dos EUA se tornaram mais abrangentes e severas nos últimos anos, aumentando esse descontentamento – e coincidindo com as reivindicações dos principais mercados emergentes por uma nova ordem mundial.”
“As sanções dos EUA se tornaram mais abrangentes e severas nos últimos anos, aumentando esse descontentamento – e coincidindo com as reivindicações dos principais mercados emergentes por uma nova ordem mundial.”