A época do Natal costuma ser muito festejada na cidade de Belém, na Cisjordânia ocupada, local de nascimento de Jesus Cristo. Mas este ano todas as festividades foram canceladas "em luto e honra" pelos 20 mil palestinos (70% mulheres e crianças, como o menino Jesus) assassinados por Israel na região.
O reverendo Isaac Munther, pastor palestino de uma importante igreja luterana em Belém, no inicio deste mês montou um presépio com a figura de Jesus Cristo num keffiyeh (o lenço quadrado usado por palestinos), rodeado por escombros [imagem]. Ele explicou por que não haverá a tradicional festa de Natal este ano.
O Natal é um raio de luz e esperança vindo do coração da dor e do sofrimento. O Natal é o brilho da vida vindo do coração da destruição e da morte. Em Gaza, Deus está sob os escombros. Ele está na sala de cirurgia. Se Cristo nascesse hoje, nasceria sob os escombros. Convido-vos a ver a imagem de Jesus em cada criança morta e retirada dos escombros, em cada criança que luta pela vida em hospitais destruídos, em cada criança em incubadoras. As celebrações do Natal estão canceladas este ano, mas o Natal em si não é e não será cancelado, pois a nossa esperança não pode ser cancelada.
Outro reverendo, Mitri Raheb, presidente da Universidade Dar al-Kalima, falou ao Democracy Now sobre o cancelamento das festividades e até o possível fim da presença cristã em Gaza. Trechos:
"É um Natal muito triste. Não creio que em toda a minha vida tenha sentido tanta tristeza, mas também tanta raiva pelo que está acontecendo em Gaza. As festividades foram canceladas em Belém, então você não tem luzes de Natal. Você não tem árvore de Natal em Belém. Não há turistas vindo, por causa da guerra. E o povo não está pronto para celebrações, porque o nosso povo em Gaza, mas não só o nosso povo em Gaza, também o nosso povo na Cisjordânia, nós aqui na Cisjordânia, estamos vivendo o apartheid, a colonização por colonos judeus. O número de mortos hoje chega a 20 mil em Gaza, mas também na Cisjordânia está na casa das centenas. E também os detidos, os detidos palestinos por Israel nestes 75 dias aqui na Cisjordânia são mais de três mil.
"E a história do Natal é na verdade uma história palestina, por excelência. Fala de uma família de Nazaré, no norte da Palestina, que é ordenada por um decreto imperial dos romanos a evacuar para Belém, para lá ir e registrar-se. E é exatamente isto que o nosso povo em Gaza tem vivido nestes 75 dias. O Natal fala de Maria, a mulher grávida em fuga, exatamente como 50 mil mulheres em Gaza que estão efetivamente deslocadas. Jesus nasceu na verdade como um refugiado. Não havia lugar na pousada para ele nascer, então ele foi colocado numa manjedoura. E é exatamente isto que também as crianças que hoje em dia estão nascendo em Gaza estão vivendo. A maioria dos hospitais está destruída, fora de serviço e, portanto, não há locais de parto para todas essas mulheres grávidas em Gaza. E então você tem o sanguinário Herodes que ordenou matar as crianças em Belém para permanecer no poder. E em Gaza, mais de oito mil crianças foram assassinadas para que Netanyahu permaneça no poder.
"Estes são os presentes de Natal de Israel para nossa comunidade cristã. E temo que este seja o fim da presença cristã em Gaza. Uma presença de dois mil anos. O cristianismo chegou a Gaza já no primeiro século. E ao longo dos últimos 20 séculos houve ali uma obra cristã viva, uma comunidade cristã próspera em Gaza. E penso que esta comunidade será extinta por causa da guerra de Israel em Gaza. Três por cento da comunidade cristã em Gaza foi assassinada nestes 75 dias. Três por cento".
Leia mais postagens e crônicas de Antonio Mello aqui na Fórum e no Blog do Mello.