Prestes a perder o mandato, Sergio Moro (União-BR) foi às redes sociais nesta sexta-feira (15) elogiar a "análise técnica" feita no X, antigo Twitter, por Janaína Paschoal (PRTB) do parecer do Ministério Público Eleitoral (MPE) do Paraná, que se mostrou favorável à cassação da chapa e a decretação de inelegibilidade do senador e de seu suplente, o advogado Luís Felipe Cunha.
"Agradeço a análise técnica Prof.a (SIC) @JanainaDoBrasil, pondero para sua reflexão apenas que carros e segurança não eram vaidade, mas necessidades reais e que não geram votos", comentou Moro na publicação da deputada.
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Em 2016, Janaína Paschoal recebeu R$ 45 mil do PSDB para elaborar um "parecer técnico" sobre as pedaladas fiscais como justificativa para o impeachment de Dilma Rousseff (PT). Sete anos após o golpe, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) rejeitou punição a ex-presidenta, confirmando que os crimes atribuídos a ela eram parte de uma farsa plantada para justificar a abertura de um processo de impeachment.
Em sua "análise técnica" do caso Moro, Janaína faz questão de ressaltar que "não houve corrupção eleitoral" para defender o ex-juiz da Lava Jato.
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"Muito embora eu entenda que Moro errou ao trocar de partido no último minuto do segundo tempo e que errou ao não assumir seu voto na sabatina ao Ministro Dino, não me parece acertado destituir um Senador por gastos partidários feitos, quando efetivamente se pretendia lançá-lo à Presidência", diz.
A crítica, rebatida por Moro no comentário, diz respeito apenas ao fato de que o ex-ministro, "pego pela vaidade", aceitou "salário, staff, carros, motoristas pagos com dinheiro público em período pré-eleitoral".
"Minha preocupação não diz com a pessoa, mas com as instituições. Aos poucos, todos os potenciais adversários em 26 estão sendo minados. Bolsonaro, Deltan, Moro... aqueles que assistem calados e tentam ficar bem com os poderosos de plantão podem ser os próximos", finaliza Janaína, dando o contexto político de sua "análise técnica".
Cassação e inelegibilidade
Em seu parecer, a Procuradoria Regional Eleitoral do Paraná afirma que a “responsabilidade pessoal dos Srs. Sergio Fernando Moro e Luís Felipe Cunha encontra-se solidamente comprovada através da participação direta de ambos nas viagens, eventos e demais atos de pré-campanha, frisando-se que, ainda que apenas o primeiro investigado tenha figurado em destaque e apresentando-se ao público como pré-candidato, o segundo investigado o acompanhou por toda trajetória política, inclusive na condição de advogado”.
A conclusão da procuradoria é a seguinte: “Diante de todo o expendido neste parecer, somente baseado no que consta dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral no Paraná manifesta-se pelo julgamento de procedência parcial dos pedidos formulados nas Ações de Investigação Judicial Eleitoral nº 0604176-51.2022.6.16.0000 e 0604298-64.2022.6.16.0000, a fim de que se reconheça a prática de abuso do poder econômico, com a consequente cassação da chapa eleita para o cargo majoritário de Senador da República e decretação da inelegibilidade dos Sergio Fernando Moro e Luís Felipe Cunha”.
O senador é acusado de abuso de poder econômico, caixa dois e outras irregularidades nas eleições de 2022, supostamente originadas da pré-campanha presidencial pelo Podemos. Após deixar o partido, Moro candidatou-se ao Senado pelo União Brasil e foi eleito.
Em depoimento no dia 7 de dezembro, Moro não respondeu às perguntas dos advogados do PL e do PT, limitando-se aos questionamentos do desembargador relator, Luciano Carrasco Falavinha. Moro negou qualquer irregularidade, alegando ser vítima de "perseguição política".
No entanto, Luiz Eduardo Peccinin, advogado representante do PT, presente no depoimento, avaliou negativamente o desempenho de Moro, afirmando que este "sem querer" confessou o uso de um contrato falso durante sua campanha ao Senado em 2022. O contrato, envolvendo seu suplente Luis Felipe Cunha, teria recebido R$ 1 milhão do União Brasil, destinado à Vosgerau & Cunha Advogados Associados, uma das empresas do advogado.
"O próprio Moro confessou, sem querer, que o contrato era falso, não correspondia ao que estava escrito, e que na verdade seu suplente não praticava nenhum ato de advocacia real para ele. Muitas vezes a pessoa acha que está se defendendo, mas acaba se condenando."
Cassação de Moro: entenda as acusações
No início de 2022, Sergio Moro estava filiado ao Podemos e iniciou uma pré-campanha à presidência. Contudo, o Podemos vetou sua candidatura, levando Moro a se desligar da sigla e filiar-se ao União Brasil, buscando concorrer ao Senado. Inicialmente visava São Paulo, mas a Justiça Eleitoral o proibiu devido à falta de residência e vínculo com o estado. Desta maneira, o ex-juiz se candidatou ao cargo pelo Paraná.
Apesar do tumulto partidário e da questão do domicílio eleitoral, Moro foi eleito senador com 1.953.159 votos. No entanto, durante a campanha, duas ações, unificadas pelo Partido Liberal e pela Federação Brasil da Esperança (PT, PCdoB e PV), foram protocoladas no TRE-PR contra o ex-juiz.
As legendas alegam abuso de poder, caixa 2, uso indevido nos meios de comunicação e irregularidades nos contratos. A principal acusação é que Moro teria iniciado a pré-campanha à presidência antes de ser candidato ao Senado no Paraná. As ações argumentam que ele não incluiu na prestação de contas à Justiça Eleitoral os valores gastos na pré-campanha, ultrapassando o teto de R$4,4 milhões para a campanha de senador no Paraná.
"Em atitudes que se estendem desde a filiação de Moro ao Podemos até sua candidatura ao Senado pelo Paraná, pelo União Brasil, há indícios de que o investigado utilizou recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Campanha, além de outras movimentações financeiras suspeitas, para construção e projeção de sua imagem enquanto pré-candidato a um cargo eletivo no pleito de 2022, independentemente do cargo em disputa", destaca um trecho de uma das representações.
Quais as chances de Moro ser cassado? Especialistas explicam
Em entrevista à Fórum, a advogada Maitê Marrez, que é especialista em Direito Eleitoral e Processo Eleitoral e faz parte da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), avaliou que o caso de Moro é muito parecido com o da também ex-juíza e ex-senadora Selma Arruda, conhecida como “Moro de saias”, cassada em 2019 pelo Tribunal Regional Eleitoral do Mato Grosso (TRE-MT) e, depois, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que confirmou a decisão da Corte estadual, por abuso de poder econômico e arrecadação ilícita de recursos na eleição de 2018.
"E não é por acaso: ambos os casos tratam de irregularidades em despesas realizadas durante a pré-campanha. No caso de Selma Arruda, que se tornou paradigmático, o TSE reconheceu que quase metade do próprio limite de gastos para o cargo de Senador em 2018 foi despendido durante a pré-campanha, para custear serviços típicos de campanha. A Corte concluiu que houve clara antecipação de gastos, além da prática de caixa dois", elucida Maitê Marrez.
Segundo a advogada, há alegações semelhantes contra Moro, que teria gasto mais de 2 milhões apenas durante a pré-campanha, quase metade do limite de gastos para o cargo de Senador em 2022. Maitê explica que, se a tese acusatória for acatada, tais gastos serão entendidos como "típicos de campanha", como custos com eventos, passagens e hospedagens, contratação de pesquisa, media training, contratação de empresas para produção de vídeos, etc.
A especialista prossegue relembrando que existem decisões da Justiça Eleitoral que consideram o patamar de 10% do total de despesas da campanha ou do teto de gastos como limite para aferir a gravidade dos gastos na pré-campanha, ou que mencionam os gastos que poderiam ser arcados pelo 'candidato médio'.
"Se aplicado, tal entendimento resulta no reconhecimento do abuso na campanha de Moro, com sua consequente cassação - caso comprovadas as alegações", assevera.
Entre outras semelhanças nas acusações contra Moro com o caso que levou Selma Arruda à cassação, a advogada cita o abuso da exposição midiática, a triangulação de recursos e a utilização de recursos não contabilizados.
"Tais situações, se constatadas, também acarretariam a cassação do mandato, conforme entende a jurisprudência em situações semelhantes - não só no caso da ex-senadora", diz.
Além disso, de acordo com Maitê Marrez, no caso de Moro há ainda dois agravantes que não estavam presentes na ação que cassou o mandato de Selma Arruda.
"O primeiro deles é a alegação de desequilíbrio na disputa em relação à mudança de cargo almejado, o que teria dado vantagem indevida a Sergio Moro (uso da estrutura e exposição de uma pré-campanha presidencial para favorecimento da campanha eleitoral ao Senado). O segundo é a acusação de compra de apoio político ('venda' da candidatura presidencial), veementemente rechaçada pela jurisprudência eleitoral", pontua.
"O que se deve ter em mente é que a Justiça Eleitoral deve coibir atos abusivos que violem a higidez do pleito. Todos devem participar da disputa em igualdade de chances. Se uma ou mais condutas ilícitas contribuíram para violar tal igualdade, não resta outra alternativa a não ser a cassação do mandato conquistado de forma ilegítima", declara.
"Assim, se comprovadas as alegações contra Moro, é de se reconhecer o desequilíbrio no pleito de 2022. Na linha do que já vem sendo aplicado pela jurisprudência, a maior parte dos fundamentos, se acatados, tende à cassação do mandato. Mesmo em tal hipótese o senador permanece no cargo até decisão definitiva do Tribunal Superior Eleitoral", finaliza a advogada.
O advogado Renato Ribeiro de Almeida, professor de Direito Eleitoral e coordenador acadêmico da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), aponta para o mesmo sentido que Maitê Marrez, fazendo relação entre a ação contra Moro e àquela que fez Selma Arruda perder o mandato.
“Eu acredito que o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná vai ser condizente com a jurisprudência do próprio tribunal e a jurisprudência do TSE. Eu entendo que não se trata de perseguição ao ex-juiz ou nenhum tipo de narrativa a esse respeito, mas sim uma situação que é colocada, de gastos, um candidato eleito que se valeu de recursos financeiros muito além daquilo que era possível para a natureza da campanha que ele acabou concorrendo e vencendo as eleições”.