Mais de 15 milhões de chilenas e chilenos estão aptos a votar no plebiscito que acontece neste domingo (4) e que definirá pela promulgação ou rejeição da Constituição do país aprovada pela Assembleia Constituinte. O presidente Gabriel Boric votou pela manhã e foi cauteloso quanto ao resultado da votação. Disse apenas que o país enfrenta um "momento histórico" do qual todos os cidadãos devem se sentir "orgulhosos", segundo a agência ARN. O presidente votou em Punta Arenas, no sul do país.
As pesquisas mais recentes sobre o plebiscito foram feitas há mais de uma semana, pois a legislação chilena proíbe que sejam feitas às vésperas de votações. Elas indicavam uma vitória da direita, que rejeita o novo texto constitucioal (o “rechazo“) com 46%, contra 37% dos apoiadores (o “apruebo”).
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A nova Constituição foi redigida por uma Constituinte de maioria democrática, de esquerda e com forte presença feminina e indígena. Foram duas presidentas da Assembleia, a professora universitária e líder mapuche Elisa Loncón, sucedida pela epidemiologista María Elisa Quinteros. Veja as duas:
A campanha para o plebiscito encerrou-se no sábado com um comício gigantesco do “Apruebo” em Santiago, capital chilena, com mais de meio milhão de pessoas -a concentração da direita reuniu 500 pessoas. A esquerda acredita que a força do comício pode reverter o cenário e empurrar a votação para a aprovação da nova Carta.
A cautela de Boric ficou patente em sua entrevista depois de votar: “Durante os tempos difíceis que estamos passando como país, tomamos como opção resolver as diferenças para avançar em mais democracia. Isso é algo que deve nos fazer reforçar nosso orgulho nacional”.
Boric disse que seu governo está trabalhando para construir um país "em unidade" e argumentou que "qualquer que seja o resultado" da votação de hoje, seu papel será "avançar a justiça, a igualdade e o desenvolvimento do crescimento". Ele falou em “ampla unidade nacional” da qual participam partidos políticos e organizações sociais para “continuar com este processo constitucional”.
O texto aprovado pela Assembleia
O texto constitucional em votação hoje reformula por completo a face do Chile.
Veja alguns temas em torno dos quais há um giro radical em relação ao arcabouço constitucional do tempo de Pinochet.
Saúde - um dos temas centrais, ao lado da aposentadoria, da luta popular no país nos últimos anos. O projeto propõe um Sistema Nacional de Saúde Universal ao estilo SUS, em substituição ao regime privatista em vigor. Quem deseja ter atendimento minimamente razoável à saúde, precisa arcar com custos inviáveis à classe média e aos mais pobres. O novo texto estabelece que as despesas obrigatórias em saúde sejam 100% destinadas ao sistema público e que se permita a contratação de planos de saúde privados adicionais.
Aposentadorias - Em relação às aposentadorias, desde a Constituição de 1980 as aposentadorias dependem de aportes exclusivamente do trabalhador em fundos de pensões privados que pagam aposentadorias abaixo do salário mínimo de US$ 400 dólares , 60% menores do que o último salário. Os índice de suicídio de pessoas mais velhas no Chile é o maior do planeta, devido à miséria em que as pessoas são lançadas depois de aposentadas. A proposta propõe um Sistema de Previdência Social público, financiado por trabalhadores e empregadores.
Habitação - nova Carta estabelece o direito a uma moradia digna e que o Estado deverá garantir serviços básicos, localização apropriada e espaço suficiente.
Aborto - a Constituição de 1980 proíbe o aborto. No novo texto, prevê-se o direito à interrupção voluntária da gravidez.
Povos indígenas - o texto pinochetista sequer refere-se aos povos originários, que representam 12,8% da população chilena. O novo texto reconhece o Estado como plurinacional e propõe autonomia para os 11 povos e nações indígenas. No entanto, não permite atentar contra o caráter "único e indivisível" do Estado do Chile.