A invasão da Ucrânia pela Rússia tem desencadeado protestos e boicotes ao redor do mundo, alguns muito questionáveis e até absurdos, beirando a xenofobia, mas um, em especial, chamou a atenção nos últimos dias: o banimento do estrogonofe.
Sim, você não leu errado. Há restaurantes que eliminaram o vistoso prato de cubinhos de carne mergulhados num molho azedo cremoso, acompanhado em alguns casos por cogumelos e uma generosa porção de batata palha. Já que a origem é russa, para alguns, o caminho foi retirá-lo da vista, assim como fizeram com Dostoiévski e as garrafas de vodca.
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O fato é que a origem do estrogonofe é controversa, imprecisa e bastante discutível. A única informação que seria ponto pacífico é quanto à sua nacionalidade, que é de fato russa. Os estudiosos da cozinha e historiadores também parecem chegar a um consenso sobre a refeição ter sido fruto de pessoas simples do campo, que já consumiam pequenos pedaços de carne com legumes e molho. O aspecto cremoso e os acompanhamentos é que tem origem disputada.
As principais correntes sobre o assunto indicam que, apesar do prato já ser consumido de forma diferente, a família Stroganov, da nobreza russa, é quem teria começado a comer a iguaria com o molho azedo, produzido com nata, adicionando ainda mostarda para dar um maior amargor. Versões, que para alguns são lendas, apontam que os cozinheiros do clã seriam franceses e que estes sim seriam os responsáveis pela introdução dos novos ingredientes.
A data também é alvo de discussões. Alguns historiadores garantem que ainda no século XVIII o estrogonofe já era feito, mesmo que com outro nome e diferentes ingredientes, mas o mais provável é que o prato, de uma forma semelhante ao atual, tenha sido inventado em meados do século XIX.
Outro fato que parece ser comprovado é que os soldados da Rússia czarista, especialmente em épocas de invernos rigorosos e com colheitas e safras mirradas, faziam estrogonofe com os ingredientes vindos numa espécie de “cesta básica” da época e que muitas vezes já estavam parcialmente deteriorados. No pequeno barril de madeira ficavam acondicionados tiras de carne, tomates, temperos, vodca e condimentos. Com um pouco de nata ou de leite, cozinhando tudo junto, conseguiam obter uma “sopa”, mesmo muitos historiadores garantindo que o acréscimo do creme de leite ficou por conta de cozinheiros franceses que reconstruíram o famoso prato russo mais recentemente e não na época dos nobres Stroganov.
A única coisa de que não se tem certeza mesmo até agora é se essa onda de cancelamento desembestada contra a Rússia por conta da invasão do território ucraniano será o suficiente para que os brasileiros, um dos povos que mais apreciam a iguaria criada do outro lado mundo, deixem de comer o sagrado estrogonofe com que nos habituamos nas últimas três décadas, quando o prato se popularizou por aqui.