"Nunca fui acusado de crime algum. Queriam que eu fosse condenado à pena de morte. Mas não havia nenhuma acusação. Era torturante".
As aspas de cima são de Mohamedou Ould Slahi, que ficou preso durante 14 anos na prisão de Guantánamo acusado de ter "envolvimento com o terrorismo" pelo governo dos EUA.
Assim como outros personagens da história da prisão que fica ao Leste de Cuba, coincidências foram utilizadas como "provas" para prender e torturar Mohamedou.
No caso de Mohamedou, foram três: uma breve passagem, em 1991, por um dos campos de treinamento da Al-Qaeda no Afeganistão durante a revolta mujahdins, estes eram apoiados pelo governo estadunidense contra os soviéticos.
O outro fator era o conhecimento de Mohamedou sobre satélites de telecomunicação. Ele é formado em engenharia elétrica.
E por fim, o fato de ter frequentado a mesma mesquita de um "comprovado terrorista" quando morava no Canadá.
Preso, Mohamedou deixou de ter nome e passou a ser chamado de "prisioneiro 760".
A farsa do "mundo livre"
"Vivemos no que acreditamos ser um mundo livre, e um país no qual não há liberdade deve ser punido. Desde os julgamentos de Nuremberg, ninguém é obrigado a obedecer a uma ordem ilegal".
O homem, que ficou preso 14 anos injustamente aponta o caráter racial de sua prisão e de outras barbáries históricas.
"Nenhum agente em Guantánamo foi punido, porque torturaram pessoas da África e do Oriente Médio. A história é assim".
Em seguida, ele lembra da colonização do Congo. "Todos sabem que Adolf Hitler foi um cara muito mau, mas esquecem do rei Leopoldo II da Bélgica, que invadiu o Congo e massacrou ainda mais pessoas que Hitler. Por quê?".
Ele responde: "Porque ele matou negros, e não brancos. Isso precisa acabar".
Mesmo em liberdade, Mohamedou afirma que não é possível falar em justiça.
"Nunca houve justiça em Guantánamo. As pessoas crescem sonhando com um final feliz para as suas vidas, rir, casar, ter filhos, mas não há nada disso em Guantánamo".
Nove anos de interrogatório
Preso injustamente, ele foi interrogado todos os dias durante nove anos.
"De novembro de 2001 até 2010, todos os dias, às vezes várias vezes ao dia. Os interrogatórios só pararam porque a Corte os proibiu. Eu estava chorando. As sessões eram tão violentas…".
Depois de deixar a prisão de Guantánamo, Mohamedou diz que aprendeu algumas coisas lendo o romance "Crime e Castigo", do autor russo Fiódor Dostoievski.
"Quando você sabe que não fez nada do tipo, você esta em paz, porque quando morrer, o que realmente importa é o quanto você diidiu com as outras pessoas, quantos sorrisos você espalhou, não seu dinheiro, seus bens".
A história de Mohamedou pode ser conferia no livro "O diário de Guantánamo" e no filme inspirado em sua obra, "O Mauritano".