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A Venezuela é conhecida como o país que pratica o menor preço de gasolina do mundo. No entanto, nesta segunda-feira (1º) entraram em vigência novas regras e valores para o consumo de combustível. O país vivia uma escassez de gasolina há dois meses e o preço até então era simbólico, já que o valor ficava a cargo do freguês e funcionava mais como uma gorjeta aos frentistas.
A partir desta semana os preços serão divididos em três modalidades. A primeira delas é direcionada à população que corresponde aos 25% mais pobre do país. Essa camada social continuará recebendo subsídio e o litro da gasolina foi fixado em 5 mil bolívares (R$ 0,05) o litro. Nesse caso cada carro pode abastecer até 120 litros e moto, 60 litros. O benefício será contabilizado por meio do Cartão da Pátria, que no Brasil seria o equivalente ao cartão Bolsa Família.
A outra modalidade de preço é o cobrado em dólares, que foi fixado em U$ 0,50 (R$ 2,67) o litro. Esse será o valor cobrado à maior parte da população. E em terceiro lugar está o combustível destinado ao transporte público, que será 100% subsidiado, segundo Nicolás Maduro. “Não queremos que o preço do combustível impacte no valor da passagem”, afirma o presidente.
Na Venezuela, cerca de 90% da frota de carros utiliza a gasolina como fonte de energia, mas no caso do transporte público o diesel é o combustível mais utilizado.
O presidente venezuelano ressaltou ainda que antes de retirar o subsídio desse setor a meta do governo é recuperar primeiro o valor do salário mínimo venezuelano, desgastado pela inflação e a desvalorização da moeda local.
Razões da alta de preços
Ao explicar os novos valores da gasolina, Maduro fez referências às sanções impostas pelos Estados Unidos à Venezuela nos últimos meses, que impediram a petroleira venezuelana, a PDVSA, enviar gasolina à Venezuela desde suas refinarias no exterior. “Em razão das sanções dos EUA, a pedido da oposição, somos abrigados a mudar a política de preços de hidrocarbonetos praticada na Venezuela”, disse o presidente venezuelano.
A subsidiária da PDVSA nos EUA, a CITGO, possui três refinarias no país localizadas nos estados de Louisiana, Texas e Illinois. Juntas são responsáveis pelo fornecimento de cerca de 10% da gasolina consumida nos EUA. Parte dessa gasolina produzida pela CITGO era enviada à Venezuela. Além disso, foram bloqueadas outras duas refinarias venezuelanas: uma em Aruba e outra em Curaçao.
Desde que o governo de Donald Trump passou a reconhecer o líder da oposição, Juan Guaidó, como presidente interino da Venezuela, bloqueou os ativos da CITGO nos EUA e entregou o controle da empresa a Guaidó.
O último carregamento de gasolina que entrou no país havia sido no dia 16 de março, até a semana passada quando chegou a gasolina iraniana. O Irã foi o único país que aceitou vender gasolina para a Venezuela, ao enviar cinco navios petroleiros. O último deles entrou na zona econômica exclusiva da Venezuela, no Mar Caribe, nesta segunda.
“Desde junho do ano passado travamos em combate para trazer para a Venezuela a sua gasolina, um combate corpo a corpo, navio a navio. Dessa forma, cada vez que sancionavam nossos navios íamos substituindo a frota através da parceria com a Rosneft (da Rússia)”, disse Maduro. A empresa petroleira russa estava intermediando o comércio de combustível e gasolina da PDVSA, até que foi sancionada também, em fevereiro deste ano, e teve que interromper as operações vinculadas à Venezuela.
Primeiro dia de regulação de novos preços
Depois de dois meses de longas filas para abastecer carros e motos, que chegavam a durar um dia inteiro, a Venezuela voltou a ter gasolina em todos os postos de combustíveis. A reportagem visitou um deles, com grande fluxo de carros, em Las Mercedes, bairro de classe média de Caracas.
As filas eram longas, mas fluíam com rapidez, se comparado aos dias anteriores. “Tudo está fluindo bem. Nossa capacidade de abastecimento hoje é de 13 mil litros de gasolina”, disse o gerente do Posto La Mercedes, António Cortés. O que seria suficiente para abastecer cerca de 400 carros, segundo o próprio o gerente.
[caption id="attachment_228399" align="aligncenter" width="637"] António Cortés[/caption]
O engenheiro mecânico José David Pérez teve que acordar cedo e às 6h da manhã já estava na fila. Levava dois meses sem abastecer e chegou empurrando o veículo. “Esperamos que a situação melhore progressivamente. Hoje vou colocar 20 litros de gasolina pagos em dólares e esperar o dia que corresponde à placa do meu carro, para poder abastecer a preço subsidiado, que será no próximo sábado.”
[caption id="attachment_228400" align="aligncenter" width="655"] José David Pérez, engenheiro mecânico[/caption]
O administrador de empresas Marcos Espinoza passou por três postos antes de chegar nesse que vendia em dólares, porque as filas eram maiores nos locais com preços subsidiados e preferiu uma opção onde não precisava esperar tanto. Ele reclamou do novo valor da gasolina a U$ 0,50 (R$ 2,67) o litro. “Por ser um país petroleiro e pelo valor do salário, a gasolina está muito cara. Isso vai incidir sobre os valores dos produtos, bens e serviços.” Ainda assim escolheu pagar em dólares e não esperar mais para abastecer.
[caption id="attachment_228402" align="aligncenter" width="821"] Marcos Espinoza[/caption]
Já o designer gráfico Henry Díaz optou pelo preço subsidiado, pois justamente sua placa correspondia a esta segunda-feira. Ele conta que chegou às 4h da manhã e abasteceu às 10h. “Não tenho recurso suficiente para pagar em dólares. Completei o tanque, pude colocar 39 litros e custaram 195 mil bolívares (R$ 6,50)”.
[caption id="attachment_228403" align="aligncenter" width="851"] Henry Diaz[/caption]
O designer disse que aprova às novas medidas do governo. “As mudanças foram para bem, porque isso equilibra um pouco a situação. A gente tinha uma gasolina praticamente gratuita, isso não era sustentável. Espero que isso possa contribuir para ampliar a produção local e com a normalização do abastecimento”, destacou.
Depois o anúncio do governo, o líder opositor Juan Guaidó fez duras críticas ao governo venezuelano. “Faço um chamado a todos os setores da Venezuela a levantar-se contra as medidas de aumento do combustível. É uma medida criminal, com a qual tentam saquear o país. Acham que podem impor um preço em dólares, isso é inconstitucional, pois a moeda oficial do país é o bolívar.”
Contudo, o governo venezuelano informou que dentro de 30 dias espera normalizar o abastecimento de combustível com a produção local, assim como através da importação por meio de empresários venezuelanos. Dessa forma, a comercialização de uma parte da gasolina, a que é vendida em dólares, será feita através da iniciativa privada, para tentar driblar o bloqueio internacional, de acordo com o presidente Maduro.