Eleições na Bolívia: Sete dias para o retorno do MAS?

Luis Arce, candidato apoiado por Evo Morales, é favorito e tem grandes chances de vencer no primeiro turno, mas desta vez a direita está no poder, e conta com o apoio da OEA para tentar reverter o resultado das urnas

Luis Arce, Carlos Mesa e Luis Fernando Camacho (foto: montagem)
Escrito en GLOBAL el

Falta uma semana para as eleições presidenciais da Bolívia. Um pleito que deve estar no radar de todos que se identificam com as lutas latino-americanas e com a trajetória em comum de nossos povos, e que acontece um ano depois do golpe que tirou Evo Morales e o MAS-IPSP (Movimento ao Socialismo – Instrumento Político pela Soberania dos Povos) do poder.

O candidato favorito para vencer neste 18 de outubro é Luis Arce, do MAS. Ele se lança com o apoio de Morales, dos movimentos sociais e das lideranças indígenas. Ou seja, aqueles que foram alvo do golpe de 2019. Há chances reais de vitória em primeiro turno, com um cenário bem parecido ao de 2019.

Para Arce conseguir vencer em primeiro turno, ele não precisa de mais de 50%. Basta uma vantagem de 10 pontos percentuais para o segundo colocado – no caso, Carlos Mesa, da CC (Comunidade Cidadã). Isso é comum em algumas legislações eleitorais latino-americanas, como no caso da Argentina.

E é aí que mora toda a polêmica… Em 2019, Morales conseguiu reeleição com 10,5 pontos percentuais de vantagem sobre o mesmo Carlos Mesa, e depois foi vítima de um golpe, baseado na narrativa de que uma fraude eleitoral teria permitido essa vantagem – argumento sustentado por um informe da OEA (Organização dos Estados Americanos) cujas falhas técnicas já foram apontadas por ao menos dois centros de estudos - um deles contactado pelo diário New York Times.

Segundo projeção da CELAG (Centro Estratégico Latino-Americano de Geopolítica), Arce teria uma vitória no dia 18 de outubro, com vantagem de 10,4%, o que lhe garantiria a eleição sem necessidade de um segundo turno, mas o colocaria no mesmo cenário que Morales enfrentou há um ano atrás.

Carlos Mesa é o candidato da direita neoliberal e tenta se colocar como “centro”. Um clássico fenômeno latino-americano. É um legítimo representante da Bolívia pré-Morales, e inclusive chegou a assumir a presidência do país em 2004, após renúncia de Gonzalo Sánchez Lozada, em meio à chamada crise do gás – onde tudo começou.

Para ajudar Mesa a conseguir forçar um segundo turno, a ditadora Jeanine Áñez – que os jornais não chamam de ditadora, embora tenha sido imposta no poder pelas Forças Armadas, em novembro passado – e até renunciou à disputa.

Quem atrapalha os planos de Mesa é Luis Fernando Camacho, o ultraconservador que está em na terceira colocação e conhecido pela famosa foto na qual aparece invadindo o palácio presidencial com uma bíblia. Ele foi um dos líderes do golpe cívico policial, ou golpe miliciano – como define a cientista política Marília Closs.

Camacho também é o principal aliado de Jair Bolsonaro na Bolívia, e chegou a visitar Brasília meses antes do golpe, se reunindo com algumas figuras do clã presidencial e com o chanceler Ernesto Araújo.

As eleições deste ano, que já passaram por dois adiamentos, ambos baseados no temor de um triunfo do MAS. Por isso, este pleito que finalmente será realizado no próximo domingo não deve ter um fim “pacífico”.

A vitória legítima de Morales há um ano foi barrada pelo golpe. Com os golpistas no poder, é possível que aconteça uma manobra que impeça a aclamação de Arce.

Cabe destacar que a Bolívia vive desde 2003 um processo revolucionário. E o golpe – com apoio das elites, das forças policiais e OEA – foi uma reação contrarrevolucionária. Essa disputa eleitoral vai medir forças entre os dois movimentos e tudo indica que não vai acabar por aí.

Acredito que seja importante usar essa nomenclatura para ficar mais explícito qual é o cenário boliviano. Não é uma eleição qualquer. Não dá para se iludir com a “normalidade democrática”, que já não existe por lá.

A extrema-direita boliviana, que apareceu firme no golpe, vai se impor como uma força eleitoral com Camacho, que não concorreu no ano passado. O líder golpista terá ainda mais respaldo em possíveis distúrbios.

O resultado das urnas importa, mas não será só ele.

https://twitter.com/lucasgsrocha/status/1315286231056560128