Parlamentar alegou que Neruda 'divide chilenos' por sua posição política; representante de direita sugeriu agregar 'Poeta' ao batizar aeroporto: 'sua obra literária nos une'
Por Victor Farinelli, no Opera Mundi
Três anos de tramitação e mais um fracasso. O projeto para mudar o nome do aeroporto da capital chilena para Aeroporto Pablo Neruda foi derrubado na última segunda-feira (19/10), depois que os representantes da direita na Comissão de Cultura, Artes e Comunicações da Câmara dos Deputados anunciaram ter os votos necessários para impedir que ele seja levado ao plenário.
Dois argumentos foram levantados pelos parlamentares para justificar a negativa ao projeto. O mais controverso deles diz respeito ao fato do poeta ter sido militante do Partido Comunista. Segundo o deputado Ignacio Urrutia, do partido UDI (de extrema direita), “Neruda é uma figura que divide os chilenos, temos muitas figuras melhores, que são capazes de nos unir como país”.
Jorge Rathgeb, do partido Renovação Nacional, também questionou o projeto, alegando que “Neruda poderia dar nome a um Centro Cultural, mas não a um aeroporto. Seria como batizar um hospital com o nome de Ivan Zamorano (jogador de futebol chileno dos anos 1990)”.
Desde a semana passada, a oposição já afirmava possuir os sete votos necessários para derrubar o projeto, o que foi confirmado na segunda com uma declaração do deputado independente Gaspar Rivas, que alegou que “ao escolher uma posição política, Neruda deixou de ser de todos os chilenos, e passou a ser um ícone do Partido Comunista”. O único representante da direita que tentou reivindicar o projeto foi Issa Kort, da UDI, que queria agregar a palavra “Poeta” à nova nomenclatura: “a faceta política de Neruda divide os chilenos, mas sua obra literária nos une, por isso o projeto deveria buscar que o nome fosse ‘Aeroporto Poeta Pablo Neruda’”. A sugestão não foi aceita pelos colegas de bancada.
Outro argumento utilizado foi o do custo que o projeto teria, algo que foi questionado por um de seus autores, o deputado Pepe Auth. “O aeroporto de Santiago está passando por um processo de ampliação, o que já requer novos investimentos em sua infraestrutura, e se incluirmos a mudança do nome nesse projeto podemos otimizar boa parte desse custo”.
O outro autor do projeto é justamente o presidente do Partido Comunista do Chile, Guillermo Teillier. “O projeto não tinha nenhum afã de ser partidário, e somente pretendia dar a este espaço, por onde passam milhares de chilenos e estrangeiros todos os dias, o nome de alguém que representasse o povo deste país e a cultura apreciada por nós mesmos e pelos que nos visitam”, afirmou.
Além de ser um dos mais importantes poetas em língua espanhola e um dos grandes nomes da literatura latino-americana e mundial – e vencedor do Prêmio Nobel de Literatura de 1971 –, Pablo Neruda foi militante do Partido Comunista, pelo qual foi eleito senador em 1945, como representante das províncias do norte do país.
Em 1948, sua militância o obrigou a fugir do país, após o decreto da Lei de Defesa Permanente da Democracia – a chamada Lei Maldita –, que colocou o PC na clandestinidade e determinou a perseguição aos seus seguidores.
Pressão da Força Aérea
Por outra parte, também houve certa pressão por parte da Força Aérea Chilena. Atualmente, o aeroporto de Santiago leva o nome de Arturo Merino Benítez, considerado pai da aviação no país e fundador da LAN Chile – empresa que recentemente se fusionou com a brasileira TAM, criando a multinacional LATAM.
Foi para satisfazer a Força Aérea – e já prevendo a derrubada do projeto esta semana – que a bancada governista apresentou uma nova versão, na semana passada, que estabeleceria dois nomes para o aeroporto. Após o término das obras de ampliação, o terminal internacional passaria a se chamar “Pablo Neruda”, enquanto o terminal para voos nacionais manteria o nome de “Arturo Merino Benítez”.
A nova proposta ainda não foi comentada pela oposição, e como se trata de um projeto novo, sua avaliação por parte da comissão poderia acontecer somente em 2016.
Foto: Divulgação