Em Berlim, 250 mil vão às ruas em protesto contra acordos comerciais entre UE, EUA e Canadá

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Manifestação questiona benefícios a corporações e prejuízos para trabalhadores, como ameaça a postos de trabalho e ao Estado de bem-estar social Texto e foto por Roberto Almeida, do Opera Mundi Os aposentados Hans-Jürgen Becker, 72, Hannelore Becker, 73, e Manfred Müller, 65, saíram de Frankfurt às cinco da manhã deste sábado (10/10) rumo a Berlim. O que os tirou da cama “pelo futuro dos netos” foi um sentimento anti-EUA e duas novas siglas que acabaram de entrar em seus vocabulários: TTIP e Ceta. “Nossa juventude não cuida do nosso país, então cuidamos nós”, disse Becker. TTIP é a sigla em inglês para Transatlantic Trade and Investment Partnership ou, em português, Tratado Transatlântico e Aliança de Investimento, um acordo entre a União Europeia e os Estados Unidos, debatido desde 2013, que pretende criar a maior zona de livre comércio do mundo. Ceta é a sigla também em inglês para Comprehensive Economic and Trade Agreement, ou Abrangente Tratado Comercial e Econômico, acordo comercial que pretende “remover 99%” das barreiras alfandegárias entre Canadá e União Europeia. Estampados nas bandeiras dos três aposentados, e de outras 250 mil pessoas que protestaram nesta tarde na capital alemã, os acordos TTIP/Ceta entraram definitivamente na agenda política local. É uma sopa de letrinhas que, para os manifestantes, negocia em segredo ameaças aos postos de trabalho, ao Estado de bem-estar social, aos serviços públicos, ao meio-ambiente e à segurança alimentar na Europa. “A coisa vai muito mal”, lamentou Hans-Jürgen. “Isso de comércio livre não é bom porque não significa comércio justo. Além disso, os norte-americanos estão querendo nos afastar da Rússia e dos países do Leste Europeu, com quem temos boas relações comerciais”, afirmou. Não por acaso, a imagem mais frequente no protesto era a de um Tio Sam ganancioso, pronto para transformar a Europa em seu quintal. Os tratados apareciam retratados como grandes Cavalos de Tróia, grávidos de corporações prontas para ameaçar a democracia. Eram muitas as referências ao Nafta (Tratado Norte-Americano de Livre Comércio), assinado em 1994 entre EUA, Canadá e México, considerado amplamente um fracasso. Em meio ao público, diante do palco montado em frente à Coluna da Vitória, havia membros do CSU (União Social-Cristã, partido conservador alemão), entidades de defesa do meio-ambiente como Greenpeace, WWF e Bund, membros de partidos de esquerda como o Die Linke e milhares de sindicalistas. “Trocas comerciais globais nunca vão dar certo sem direitos trabalhistas consistentes”, afirmou durante discurso Reiner Hoffmann, líder da DGB (Deutsche Gewerkschaftsbund), a Federação Alemã dos Sindicatos. “Nunca poderemos apoiar um tratado de livre comércio que desconsidera os padrões reconhecidos pela OIT (Organização Internacional do Trabalho), entre eles a liberdade de associação e o dissídio coletivo”, acrescentou Hoffmann. Pressão por transparência Durante esta semana, a Comissão Europeia recebeu três milhões de assinaturas contra o TTIP/Ceta. A pressão é grande para tornar as negociações pelo menos mais transparentes. A resposta foi a publicação de documentos online. No entanto, apesar de já estar na 11ª rodada de negociações, a própria comissão admite que ainda há tratativas confidenciais. Do que já se pode avaliar, duas mudanças propostas pelos tratados parecem causar mais arrepios aos ativistas alemães: a chamada “coerência regulatória” e a questão da segurança alimentar. A “coerência regulatória” pretende alinhar regulamentações para fabricação e exportação de produtos entre EUA e o bloco europeu. A Comissão Europeia garante que não vai baixar nenhum padrão que afete a saúde ou o bem-estar dos consumidores mas, para os críticos do acordo, as grandes corporações norte-americanas devem pressionar por um relaxamento das regras europeias para entrar definitivamente no mercado local. O descompasso regulatório na questão da segurança alimentar é ainda mais evidente, em especial pela força do Partido Verde e de ONGs ligadas ao meio-ambiente na política alemã. Os críticos do acordo exaltam os coquetéis de hormônios e outros produtos farmacêuticos usados nos Estados Unidos para a criação de animais - hoje proibidos na Alemanha - e temem por alguma mudança em um futuro próximo. “A Europa enfrenta grandes desafios”, escreve a responsável pelo TTIP na Comissão Europeia, Cecilia Malmström. “Entre eles, está a necessidade de colocar a economia para funcionar, adaptando-se às economias emergentes ou mantendo nossa influência ao redor do globo. O TTIP pode ajudar”, ela garante, ao mesmo tempo em que considera as preocupações dos manifestantes “baseadas em mitos”. A próxima rodada de negociações do TTIP acontece ainda este mês. Já o Ceta passa por um pente fino legal antes de ir a votação no Parlamento Europeu, possivelmente até o final deste ano.        

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