4 de julho, dia da Independência dos EUA: A história oculta

Novas perspetivas históricas questionam a história oficial que proclama a independência como a luta contra a coroa inglesa para instaurar uma república livre, soberana e justa

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Novas perspetivas históricas questionam a história oficial que proclama a independência como a luta contra a coroa inglesa para instaurar uma república livre, soberana e justa Por Slvia Arana, publicado em Rebelion. Tradução de António José André para o Esquerda.net
Declaração de Independência: "Estou excluído deste glorioso aniversário", dizia Frederick Douglass, líder da luta contra a escravatura, escritor e estadista afro-americano, nascido em escravidão.
A história oficial dos Estados Unidos proclama que os pais fundadores lutaram contra a monarquia inglesa para instaurar uma república livre, soberana e justa para todos os habitantes da nova nação. É surpreendente quão monolítica foi esta visão, tanto dentro como fora do país do norte. No entanto, houve e continuam a surgir novas perspetivas históricas que questionam a história oficial. Em A People's History of the United States (1980), Howard Zinn sustenta que a principal motivação dos colonos europeus na América do Norte para se tornarem independentes da monarquia inglesa não foi o ideário democrático mas sim o afã da expansão sobre os territórios indígenas. Explica que depois de 1763, com o triunfo da Inglaterra sobre a França na Guerra dos Sete Anos, e com os franceses expulsos da América do Norte, à ambiciosa elite social e política das colônias restavam só dois rivais: os ingleses e os indígenas. Os ingleses, para acalmar os indígenas, tinham declarado que as terras a oeste dos montes Apalaches estavam fora do alcance dos colonos europeus (Proclamação de 1763). De maneira que a expansão da elite colonial sobre as terras indígenas só poderia ser conseguida se as Treze Colônias se tornassem independentes da Inglaterra. O historiador Gerald Horne, no seu novo livro The Counter-Revolution of 1776: Slave Resistance and the Origins of the United States of America (2014) afirma que os alicerces dos EUA não foram a liberdade, mas a escravatura. Diz que, em 1776, as Treze Colônias se levantaram contra a Inglaterra para defender a escravatura, usando como vitrine decorativa as palavras liberdade e igualdade. Segundo Horne, o 4 de julho de 1776 representa uma contrarrevolução. O detonador da revolta foi a percepção, entre os colonos europeus, de que Londres se encaminhava para a abolição da escravatura. O caso Somerset, decidido em Londres, em 1772, parecia indicar que a abolição não só seria ratificada na metrópole, mas que seria extensiva às colônias, com efeitos devastadores para as principais fortunas dos colonos baseadas nas plantações com escravos, mas também no tráfico de escravos. Numa entrevista à salon.com, Horn refletiu sobre a razão pela qual o “mito da criação dos EUA” foi e continua a ser aceite sem maiores questionamentos. Pensa que o fato positivo de muitos europeus encontrarem na nova república um santuário contra a perseguição religiosa foi crucial para ocultar outros acontecimentos graves: que os EUA cometeram genocídio contra a população indígena e escravizaram centenas de milhares de africanos1. Podemos acrescentar um par de dados significativos: George Washington, o primeiro presidente dos EUA, foi dono de escravos e o homem mais rico das colônias e da nova república fundada, em 1776. O segundo presidente dos EUA, John Adams, foi também um reconhecido defensor da escravatura. Horne sustenta que mesmo que o 4 de julho represente uma vitória contra a monarquia, é também o aniversário da instauração do primeiro país com um sistema de apartheid. A tendência abolicionista presente no movimento pela independência foi derrotada no período que culminou, em 1861, na Guerra Civil, a mais cruel na história dos Estados Unidos. Torna-se apropriado recordar as palavras de Frederick Douglass, líder da luta contra a escravatura, escritor e estadista afro-americano, nascido em escravidão. Em 1852, Douglass, convidado a proferir um discurso para celebrar o Dia da Independência, denunciou que fora negada aos afro-americanos a liberdade, a igualdade e a independência: "Estou excluído deste glorioso aniversário! O vosso alto grau de independência só põe em manifesto a distância imensurável que existe entre nós... A rica herança de justiça, liberdade, prosperidade e independência, legada pelos vossos pais, ficou só entre vós, não foi partilhada, não comigo... Este 4 de julho é vosso, não meu. Vós desfrutais; eu estou de luto."  1 "White Supremacy and Slavery: Gerald Horne on the Real Story of American Independence", entrevista de Elias Isquith, Salon.com:
Novas perspetivas históricas questionam a história oficial que proclama a independência como a luta contra a coroa inglesa para instaurar uma república livre, soberana e justa. Por Slvia Arana