Das muitas tatuagens de Diego Armando Maradona, duas delas chamavam mais a atenção, por definir sua postura política: a do Che Guevara, no braço direito, e de Fidel Castro na perna esquerda.
O futebolista argentino foi mundialmente conhecido por sua genialidade dentro dos gramados, mas fora deles também se destacava por suas posturas políticas eloquentes, marcadas não somente na sua pele, como em suas palavras e atitudes. E, assim como fazia com nos campos, o craque preferia jogar com a esquerda.
Em seu país natal, Diego sempre foi peronista assumido. Há quem veja nesse aspecto a única possível incoerência em seu perfil político, já que ele defendeu a eleição de Carlos Menem em 1989. Porém, vale lembrar que o PJ (Partido Justicialista, expressão máxima do peronismo) é uma organização complexa, com setores mais conservadores, outros mais progressistas, e que aquele Menem – assim como Fernando Henrique Cardoso no Brasil, em 1994 – se elegeu com um discurso social-democrata para depois, no governo, adotar uma postura mais liberal e favorável ao então recém formulado Consenso de Washington.
Nos Anos 90, diante dos seus frequentes problemas de saúde, Maradona encontrou refúgio e amizade em outro país que marcou sua história política. O craque teve seu primeiro encontro com Fidel quando ainda era jogador, em 1988, e desde então teve no líder cubano um dos seus melhores amigos.
No ano 2000, quando o craque argentino chegou a estar à beira da morte devido ao consequências do consumo de drogas, Fidel o convidou para fazer um tratamento de desintoxicação na ilha. Sua estadia foi de 5 anos, período no qual conheceu outro aliado de Fidel que também se tornaria um dos seus grandes amigos no mundo da política: o presidente venezuelano Hugo Chávez. Evidentemente, também seria aliado de Nicolás Maduro, anos mais tarde.
Seu retorno à Argentina aconteceu em 2005, e coincidiu com um grande evento em Mar del Plata, que selou de vez a amizade entre o craque argentino e o mandatário venezuelano, e de quebra o apresentaria a mais amigos da política.
Tratava-se da Cúpula das Américas, evento que reuniu presidentes de todos os países do continente, incluindo o estadunidense George W. Bush, que participou com o intuito de convencer os presidentes latinos a confirmar de vez a criação da ALCA (Aréa de Livre Comércio das Américas). O trio conformado por Chávez, o brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e o anfitrião Néstor Kirchner liderou a negativa latina ao projeto norte-americano.
No palanque da comemoração pelo resultado, Maradona apareceu entre os presidentes, como se fosse mais um chefe de Estado – inclusive, além dele, o único que não tinha cargo político entre os presentes era o líder indígena boliviano Evo Morales, que na época era só candidato presidencial mas que logo seria presidente do seu país por 13 anos, e também outro grande amigo de Diego, que o apoiou na campanha (bem sucedida) para reverter uma decisão da FIFA de proibir jogos de futebol na altitude.
Aquele evento de Mar del Plata marcou a reconciliação do craque com a política do seu país. Com o desgaste da gestão Menem, Maradona só voltaria a se envolver graças a Néstor Kirchner. O maior ídolo do futebol argentino foi um dos maiores apoiadores do kirchnerismo durante a maior parte dos seus 12 anos de gestão.
Em 2009, Cristina Kirchner e Maradona lançaram juntos o projeto Futebol Para Todos, pelo qual tirou as transmissões dos jogos do Campeonato Argentino das mãos dos canais de TV a cabo e os colocou todos na TV pública, que passava os jogos de todos os clubes da primeira e segunda divisões ao vivo e em sinal aberto.
A parceria com Maradona tinha uma conveniência política por parte do kirchnerismo, mas também certa coerência. No plano da política esportiva internacional, o craque argentino também se destacou como um dos maiores inimigos da FIFA (Federação Internacional de Futebol Associado), especialmente durante os anos em que esta foi administrada pelo brasileiro-belga João Havelange e pelo suíço Joseph Blatter.
Diego acusava os dois de transformar o futebol mundial em um negócio e de formar uma máfia a partir da negociação dos direitos de transmissão dos torneios, acusação que, com o tempo, se mostrou correta. O craque argentino também sempre alegou que a eliminação da Argentina nas copas do mundo de Itália 90 e Estados Unidos 94 foram represálias da FIFA contra sua postura política, mas neste caso nunca conseguiu provar o que disse.
No Brasil, os principais elos de Maradona foram com os presidentes Lula da Silva e Dilma Rousseff. Quando Lula esteve preso, em 2018, Maradona escreveu diversas mensagens em favor da sua libertação, e chegou a posar com uma camiseta da Seleção Brasileira com o nome do petista quando este ainda era o candidato presidencial do PT naquele ano – antes de ser substituído por Fernando Haddad.
Enquanto isso, na Argentina, Maradona não economizava críticas ao governo de Maurício Macri, com quem manteve rusgas desde que o empresário era presidente do Boca Juniors (clube do coração do craque), nos Anos 90.
Não foi surpresa, portanto, o fato de Diego apoiar a candidatura presidencial de Alberto Fernández, não só por se tratar de uma figura ligada ao kirchnerismo e membro do setor mais progressista do peronismo, mas também por ser ligado ao Argentinos Juniors, clube que revelou o craque e cujo estádio se chamada justamente Diego Armando Maradona.
As últimas manifestações políticas de Maradona, durante este 2020, foram para defender a gestão de Alberto Fernández, algo que fez em diversos momentos. Na última delas, em setembro deste ano, ele publicou em sua conta de Instagram uma foto do casebre onde viveu na infância, na favela de Villa Fiorito, no sul de Buenos Aires, para defender a iniciativa do governo de criar um imposto temporário sobre grandes fortunas.
“Peço a Deus que aprove a lei de contribuição solidária das grandes fortunas. Porque, neste momento de crise, precisamos da ajuda de quem tem mais. Eu perdi meu cunhado para a covid e sei o que é não poder despedir um ente querido. Eu sei o que é não ter que comer. É por isso que estou à sua disposição, presidente Alberto Fernández. VAMOS ARGENTINA!!!”, escreveu o craque, dois meses antes do projeto ser aprovado no Congresso argentino, o que aconteceu há poucos dias.