17 parlamentares de partidos de oposição encaminharam ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, nesta quinta-feira (17), um ofício em que cobram do magistrado urgência no julgamento de uma ação que acusa o presidente Jair Bolsonaro de genocídio contra os povos indígenas durante a pandemia do coronavírus.
Trata-se da notícia-crime 9020, apresentada à Corte em julho de 2020 pelo advogado André Barros. Na peça, Barros afirma que Bolsonaro vetou assistência aos povos indígenas durante a pandemia, de medicamentos ao fornecimento de água, e negligenciou à população medidas efetivas de combate à crise sanitária, além de ter incentivado aglomerações e desrespeito aos protocolos sanitários, o que poderia ser configurado como crime de genocídio.
No ofício encaminhado ao STF em que cobram que a notícia-crime seja colocada na pauta, os parlamentares de oposição detalham como se deu o suposto crime de genocídio praticado por Bolsonaro contra indígenas.
"O crime ocorreu em 7 de julho de 2020, quando o presidente da República encaminhou ao presidente do Senado Federal a Mensagem 3784, vetando a estes povos o 'acesso universal à água potável e a materiais de higiene, de limpeza e desinfecção de superfície; oferta emergencial de leitos hospitalares e de unidade de terapia intensiva (UTI); aquisição ou disponibilização de ventiladores e de máquinas de oxigenação sanguínea; inclusão do atendimento de pacientes graves nos planos emergenciais das Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde; provimento de pontos de internet evitando deslocamento aos centros urbanos; distribuição de cestas básicas, sementes e ferramentas agrícolas; programa específico de crédito para o Plano Safra 2020; inclusão no Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA); plano de contingência a indígenas isolados ou em contatos recentes", escrevem.
Em abril, a ministra Cármen Lúcia encaminhou ao presidente da Corte, Luiz Fux, um pedido para colocar em pauta a ação. O Procurador-Geral da República (PGR), Augusto Aras, já se manifestou contra a abertura do processo, mas o advogado André Barros recorreu da decisão do Ministério Público Federal e o ministro Edson Fachin enviou o caso para o plenário do STF.
No mesmo mês, no intuito de fazer pressão para que a Corte paute a análise da notícia-crime contra Bolsonaro, o “Movimento Vida Acima de Tudo”, que tem entre seus nomes a liderança indígena Márcia Mura, além de intelectuais, artistas e juristas, reuniu mais de 1500 assinaturas em apoio à ação do advogado André Barros.
A carta dos parlamentares de oposição encaminhada a Fux nesta quinta-feira tem o mesmo objetivo, e destaca que o julgamento da ação é de interesse nacional. “Destacamos que a NC 9020 é de interesse nacional, também acompanhada internacionalmente uma vez que submeter grupos nacionais, étnicos e raciais a condições de existências capazes de ocasionar-lhes a destruição física total ou parcial configura o crime de genocídio previsto no artigo 1º, letra 'c' da Lei 2889/1956 e na Carta de Roma do Tribunal Penal Internacional”, pontuam.
Assinam o ofício o líder do PT na Câmara, Elvino Bohn Gass (RS), as deputadas Erika Kokay (PT-DF), Maria do Rosário (PT-RS), Áurea Carolina (PSOL-MG), Fernanda Melchionna (PSOL-RS), Joênia Wapichana (Rede-RR), Luiza Erundina (PSOL-SP), Sâmia Bomfim (PSOL-SP), Talíria Petrone (PSOL-RJ), Vivi Reis (PSOL-PA), Célio Moura (PT-TO), David Miranda (PSOL-RJ), Hélder Salomão (PT-ES), Marcon (PT-RS), Nilto Tatto (PT-SP), Patrus Ananias (PT-MG) e Valmir Assunção (PT-BA).
Confira a íntegra da carta aqui. O conteúdo da notícia-crime do advogado André Barros pode ser acessado aqui.
Indígenas em Brasília: Levante pela Terra
A pressão dos parlamentares para que o STF julgue ação que aponta crime de genocídio de Jair Bolsonaro contra povos indígenas acontece em meio a uma mobilização de povos originários que, esta semana, foram à Brasília para protestar contra uma agenda de retirada de direitos do governo federal e do Congresso Nacional. Trata-se do "Levante pela Terra".
Nesta quarta-feira (16), representantes de mais de 35 povos indígenas, com o apoio da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), marchavam na capital federal e esperavam ser recebidos por um representante da Fundação Nacional do Índio (Funai), mas a tropa de choque da PM cercou o prédio da entidade e atacou os manifestantes com bombas de efeito moral e spray de pimenta.
“A Funai tem o dever constitucional de nos defender e respeitar. Não é o que vem acontecendo. A Funai tem sido utilizada pelo governo Bolsonaro para coagir lideranças e retirar nossos direitos, para abrir as terras indígenas para invasores. Estamos sendo proibidos de entrar na nossa própria casa como se fôssemos um perigo. O perigo está lá dentro”, afirmou o líder indígena Tiago Mbya Guarani.
A mobilização “Levante pela Terra” se dá, principalmente, pela tramitação na Câmara do Projeto de Lei 490/2007 que, segundo a Apib, “representa um novo Genocídio aos povos indígenas”.
“O PL é inconstitucional e pode acabar com as demarcações das Terras Indígenas no Brasil, possibilitando a abertura dos territórios para explorações predatórias. Além do PL 490 outras propostas anti-indígenas e que representam uma ameaça ao meio ambiente estão em pauta no Congresso”, diz a entidade.
Apesar de não terem sido recebidos pela Funai, os indígenas permanecem em Brasília em mobilização constante. Nesta quinta-feira (17), a Apib divulgou o "Manifesto pelo Direito à Vida e ao Território dos Povos Indígenas".
"Nós, povos indígenas, vivemos em estado de constante ameaça, que nos exige estarmos em permanente vigília e mobilização. Neste momento, junho de 2021, ainda sob as restrições de uma pandemia devastadora que se aproxima de vitimar 500 mil brasileiras e brasileiros, dos quais mais de 1.110 parentes nossos fazem parte, nos vemos obrigados a intensificar as nossas lutas e a amplificar nossa voz de protesto para defender nossos direitos mais básicos: nossas vidas e nossos territórios", diz um trecho do documento.
Confira a íntegra aqui.