Por que não escrevi sobre o assassinato de Herinaldo de Santana? (leia mais aqui) Porque não tenho forças para lamentar a morte de mais um menino da favela. Do time dos que morrem desde sempre se correm livres pelas ruas de casa; se são enclausurados dentro de ônibus por justiceiros de Copacabana; se saem de seus bantustões para irem à praia das áreas nobres em trajes de banho; se cometem delitos e cada vez mais cedo são mandados para a cadeia.
A dor dos que o amavam me consome e consumirá a cada vez que um deles vir o vídeo do garoto agonizante, atingido por um policial destreinado (ou acostumado a matar) assustado ao ver o menino que corria para comprar uma bola de pingue-pongue. Pow!
Mas, escrevo agora, porque com o advento das redes sociais, vemos os rostos dos mortos, presenciamos sua agonia, e mais e mais compreendemos a estratégia dos que tentam negligenciar essas mortes, como fazem com os corpos negros recolhidos pelos camburões e depositados nos gavetões do IML, à espera de reconhecimento. E aceitamos que somos Herinaldo, sujeitos à próxima bala assustada.
A caneta sobre a mesa mirava a cena, impotente. Não era videogame, a parada. A garganta secou. O menino está morto. Não dá para recomeçar o jogo.
(*) Cidinha da Silva é escritora. Publicou, entre outros, Racismo no Brasil e afetos correlatos (Conversê, 2013) e Africanidades e relações raciais: insumos para políticas públicas na área do livro, leitura, literatura e bibliotecas no Brasil (FCP, 2014). Despacha diariamente em sua fanpage