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Um observatório social para os pedágios

Não temos hoje no Paraná um órgão técnico dedicado à atividade de fiscalização das concessões

Luiz Cláudio Romanelli.Créditos: Eduardo Matysiak
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Sou as minhas atitudes, os meus sentimentos, as minhas ideias... O que realmente faz valer a pena estar vivo! – Clarice Lispector

A Constituição Federal prevê diversos mecanismos de participação popular e controle social sobre a coisa pública, e nada é mais poderoso do que uma população informada e ativa, capaz de fiscalizar e cobrar seus direitos. É nesta linha que estou propondo a criação de um observatório social para acompanhar as concessões de rodovias no Paraná. Mesmo que temporariamente administradas pela iniciativa privada, as estradas são um bem público.
 
A proposta é a criação de uma organização multifacetada e essencialmente técnica, sem viés político. Um organismo que agregue verdadeiramente o interesse daqueles que pagam a conta dos pedágios. Um fórum democrático, reunindo instituições da sociedade civil organizada, representações do setor produtivo e todos que estiverem interessados na evolução das concessões que vão impactar a vida do Paraná pelos próximos 30 anos. 
 
Você que leu este texto até aqui já pode estar se perguntando a razão de ter um observatório social para os pedágios. Quem conhece um pouco deste assunto sabe que existem instrumentos de controle e fiscalização oficiais, a começar pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e, subsidiariamente, a máquina estadual que deveria cuidar das condições de infraestrutura, transporte e logística do Paraná.
 
Contudo, estes organismos públicos não estão cumprindo adequadamente as suas obrigações. O início dos atuais contratos de pedágio deixa isso bem claro. Basta lembrar que as autoridades federais e estaduais alardeavam que antes da cobrança das tarifas haveria restauração integral do pavimento das estradas e da sinalização viária. Ledo engano! Por conta de uma manobra contratual, já estamos pagando pelo que ainda será feito nos próximos 12 meses.
 
Sobre o direito de ir e vir, houve absoluto desrespeito aos usuários no início da cobrança das tarifas, em 23 de março, quando se formaram filas quilométricas. Ainda hoje, há diversos episódios de dificuldades para chegar às cabines para realizar os pagamentos por inoperância das concessionárias. Não é raro ver famílias, ônibus, ambulâncias com pacientes, além de caminhões que carregam grande parte das riquezas produzidas no Paraná parados nas praças de pedágio. E alguma empresa foi punida?
 
Fiz denúncias constantes para a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), pois está evidente que as concessionárias descumprem o dispositivo contratual que estabelece que as filas para pagamento do pedágio devem ter, no máximo, 200 metros em dias comuns, e 400 metros nos feriados. Além disso, há uma cláusula que determina que o usuário só deve esperar 15 minutos para atravessar a cancela.
 
Como cidadão e parlamentar, também estou preocupado com a forma como está sendo conduzida a modelagem dos lotes 3 e 6, que serão leiloados nos próximos meses, após aprovação das condições do edital pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Pelo que foi divulgado, as tarifas virão tão altas quanto o que pagamos até 2021, mesmo com a retirada de obras orçadas em mais de R$ 800 milhões, na soma dos dois lotes. Para pista dupla, o preço-base está em R$ 0,26 por quilômetro e para pista simples o valor ficou em R$ 0,18.
 
Sobre as obras iniciais, ficou convencionado no TCU um prazo de três meses para que as futuras concessionárias realizem os trabalhos, antes da abertura das praças e início da cobrança das tarifas. Tenho muitas dúvidas de que este prazo será suficiente para recuperar rodovias importantes e com alto fluxo de veículos, como a Rodovia do Café (Lote 3) e a BR-277 (Lote 6), além das demais estradas que serão concessionadas.
 
E quem vai acompanhar e cobrar a efetividade disso? Não temos hoje no Paraná um órgão técnico dedicado à atividade de fiscalização das concessões. A prometida criação de uma comissão tripartite, com assento para os usuários e que deveria acompanhar cada um dos lotes concedidos à iniciativa privada, ainda não saiu do papel, apesar das nossas insistentes cobranças. 

Lamentavelmente, a própria Assembleia Legislativa encerrou os trabalhos da Frente Parlamentar sobre os Pedágios e não renovou o contrato de assessoria com Instituto de Tecnologia de Transportes e Infraestrutura (ITTI), que é ligado à Universidade Federal do Paraná (UFPR) e prestava relevantes serviços de informação para deputadas e deputados. 
 
Recentemente, cobrei explicações da Secretaria de Estado da Infraestrutura e Logística sobre qual é a interação das autoridades paranaenses com o Ministério dos Transporte, com a ANTT e a Infra S.A., que estão à frente dos processos de concessão de rodovias. Precisamos saber se há uma equipe técnica formada, quem faz parte e qual os documentos já foram produzidos a respeito do atual modelo de pedagiamento das nossas estradas.
 
O fato concreto é que a sociedade do Paraná não pode ficar completamente alheia - nem agora e nem pelas próximas três décadas da concessão - em relação ao que acontece em Brasília e que tem impacto direto sobre o desenvolvimento econômico do Estado. Por isso, defendo a constituição de um observatório social dos pedágios, independente, sem fins lucrativos e com capacidade de análise e fiscalização.
 
Trata-se de um instrumento que pode evitar que se cometam os mesmos erros da concessão passada. Ao mesmo tempo, que respeite os preceitos constitucionais de cidadania e de controle social. Nunca é demais reforçar que onde a participação cidadã é maior os abusos são menores. 

Luiz Claudio Romanelli é advogado, especialista em gestão urbana e cumpre mandato de deputado estadual na Assembleia Legislativa do Paraná pelo PSD.

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum