DIREITOS HUMANOS

Zerah: Direitos Humanos com Judeidade

O Zerah Platform é um projeto educacional judaico e socioambiental focado na formação para os direitos humanos

Evento do Zerah na Faap. Na foto, Luis Felipe Pondé, Ana Beatriz Prudente Alckmin e Michel Gherman.Créditos: Divulgação
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Os Direitos Humanos garantem que todos os seres humanos tenham direitos básicos simplesmente por serem humanos. Esses direitos têm como objetivo garantir que cada indivíduo tenha a oportunidade de viver uma vida digna, com acesso ao básico como educação, saúde, comida e moradia. Eles buscam criar uma qualidade de vida onde cada pessoa possa alcançar seus sonhos e objetivos, independentemente de onde venham ou das circunstâncias em que se encontram. Isso significa que todos, seja no Canadá, na Tailândia ou em qualquer outro lugar do mundo, devem ter os direitos fundamentais.

No entanto, muitas vezes a realidade é diferente, especialmente em lugares onde há desigualdade social e econômica. Por exemplo, em sociedades menos desenvolvidas, é comum que as pessoas tenham dificuldade de acesso aos serviços básicos como hospitais, laboratórios para exames médicos entre outros. Isso resulta em uma grande diferença na capacidade das pessoas de alcançar seu potencial e gera um abismo, que mesmo uma pessoa trabalhadora e esforçada sempre terá muita dificuldade de alcançar o sucesso. Por isso, não faz sentido falar em meritocracia em sociedades de profunda desigualdade. A garantia dos Direitos Humanos não é apenas uma questão de justiça social, mas também é essencial para o progresso e desenvolvimento econômico. A busca pela igualdade e pela realização do potencial de cada indivíduo é o que torna os Direitos Humanos ferramentas para construir um mundo com equidade. 

Para muitos, a consolidação dos Direitos Humanos se dá através da educação. Assim, surgem projetos educacionais que visam a formação de jovens para serem figuras atuantes da sociedade e levarem um olhar humanista para quaisquer áreas em que forem atuar. 

Um desses projetos é o Zerah Platform. Trata-se de um projeto educacional judaico e socioambiental focado na formação para os direitos humanos. Fundado por uma jovem judia, a pedagoga e educadora ambiental Ana Beatriz Prudente Alckmin, ele foi cuidadosamente elaborado para levar para dentro de instituições educacionais e outros espaços uma formação para os Direitos Humanos de primeira, segunda e terceira geração, orientados por perspectivas e valores judaicos.

A CONIB (Confederação Israelita do Brasil), que é a entidade que representa a comunidade judaica brasileira e tem como uma de suas principais ocupações o Advocacy na luta contra o antissemitismo e o apoio ao fortalecimento dos Direitos Humanos, vê como positiva a existência de projetos judaicos que trazem olhares da comunidade para questões urgentes.

Sobre o Zerah especificamente, conversamos com o CEO da CONIB, Sergio Napchan, que fez a seguinte fala: "Eu entendo que o trabalho que é feito pelo Zerah, dentro de algumas universidades no Estado de São Paulo, é de fundamental importância, pois é uma iniciativa que leva discussões interessantes, pautadas e ancoradas em temas modernos pertinentes à luz da tradição judaica, dos valores e dos princípios judaicos". 

Então, o Zerah faz um trabalho legitimado pelo corpo acadêmico. Os alunos se beneficiam, e se discutem temas que são importantes do ponto de vista de uma perspectiva cultural. A universidade é o lugar que privilegia o conhecimento, o debate e etc.

Para compreender o que são os Direitos Humanos de primeira, segunda e terceira geração, bem como a missão do Zerah e como ele atua, conversamos com sua fundadora e atual presidente, Ana Beatriz Prudente Alckmin:

“Os direitos fundamentais são como um escudo universal que protege cada pessoa contra qualquer tipo de violação à sua dignidade humana, para efeito didático, foram divididos em três gerações. A primeira geração desses direitos, originada durante revoluções como a Francesa, concentra-se nos direitos de liberdade individual, como o direito à vida e à liberdade de expressão, garantindo a autonomia de cada pessoa. No entanto, percebeu-se com o tempo que apenas esses direitos não eram suficientes para assegurar uma igualdade real na sociedade, dando origem aos direitos de segunda geração, que exigem ações positivas do Estado para garantir acesso a serviços essenciais, como saúde e educação, refletindo a responsabilidade governamental pelo bem-estar dos cidadãos. Além disso, os direitos de fraternidade, que constituem a terceira geração, transcendem os interesses individuais e buscam promover o bem-estar coletivo, exemplificado pelo direito a um meio ambiente saudável, entre outros aspectos relacionados ao bem-estar coletivo. 

Esclarecer essas três dimensões é essencial para entender a evolução desses direitos ao longo do tempo e seu impacto significativo na sociedade atual. Levando tudo isso em consideração, a formação em Direitos Humanos se tornou parte importantíssima da grade de muitos cursos superiores. Raro é o curso superior hoje que não tem na sua grade Direitos Humanos, pelo menos nas boas universidades. O Zerah vai para dentro das instituições de ensino superior levando uma programação de atividades voltadas para sensibilizar para os Direitos Humanos. Mas, nós levamos, na construção da interlocução desse conhecimento, os nossos valores judaicos. Muitos dos nossos palestrantes são judeus, mas nem todos são. Mas sem dúvida, na construção das atividades do Zerah dentro das instituições, o olhar judaico está presente. No caso do IBMEC São Paulo, nós estamos presentes com uma parceria muito consolidada com a Clínica de Direitos Humanos do IBMEC, onde o Zerah, hoje, responde por 40% das atividades da clínica, que incluem, palestras grandes ou palestras para grupos pequenos, além de dinâmicas, propondo debates constantes para os estudantes. Já apresentamos como palestrantes nomes como Michel Gherman, Sergio Napchan, Eva Blay, Vahan Agopyan, Daniel Douek e muitos outros grandes intelectuais”, diz Ana Beatriz.

Para entendermos um pouco mais sobre a construção da relação do Zerah com a Clínica Jurídica de Direitos Humanos do IBMEC e seu impacto, ouvimos o jurista João Paulo Martinelli, atual Assessor do Gabinete da Secretária Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, que era o coordenador da clínica na ocasião do início dessa parceria:

“Enquanto coordenador da Clínica de Direitos Humanos, do IBMEC São Paulo, o Zerah foi um grande parceiro, foi uma entidade que ofereceu diversas atividades, cursos e palestras, com pessoas altamente gabaritadas. Não só a qualidade das palestras era excelente, mas também a própria organização dos eventos. O Zerah fazia tudo o que precisava e proporcionou aos nossos alunos, diversas oportunidades para aprenderem, para ouvirem especialistas do mercado e da academia com temas voltados à sustentabilidade, promoção da igualdade e diversidade. Sempre com a Ana Beatriz comandando a equipe de uma maneira muito eficiente”. 

A Construção do Zerah:

O Zerah é um projeto que carrega a identidade uspiana. Quando aluna do curso de Pedagogia da Universidade de São Paulo, Ana Beatriz se destacava nas discussões em sala de aula e com notas altas, e foi convidada, então, para participar de um projeto pioneiro dentro da Universidade, liderado pelo professor André Leme Fleury, projeto lotado no Inova USP e que foi uma iniciativa da USP em parceria com a FGV, Belas Artes, INSPER e outras instituições de elite, que juntas criaram um programa chamado Inovação e Empreendedorismo. Dentro da Universidade de São Paulo, esse programa funcionava como uma espécie de disciplina, mas que não era para todos os alunos. No processo seletivo da disciplina, eram escolhidos alunos que demonstrassem aptidões para o empreendedorismo. E Ana Beatriz, foi uma das escolhidas para participar desse programa. Ao longo desse programa, todas essas universidades convidavam CEOs das principais empresas dos mais diversos segmentos da América Latina para dar mentorias e palestras para os alunos. Assim, Ana Beatriz bebeu na fonte daquilo que há de mais inovador na América Latina. E foi então criando, ao longo desse programa, um projeto educacional de impacto social, que fortaleceria os Direitos Humanos dentro de instituições. E, sendo ela judia, imaginava um projeto que levasse olhares judaicos. O que ela não imaginava é que esse projeto iria algum dia sair do papel e se tornar o Zerah. 

Mesmo tendo Ana Beatriz como sua criadora e fundadora, o Zerah, como projeto judaico, ao longo da sua efetivação, foi sendo acompanhado por diversas pessoas com atuação comunitária. Então, de fato é um projeto que além de ter uma identidade uspiana, também tem o DNA comunitário judaico. Algumas das figuras com currículos relevantes de contribuições comunitárias, que acompanharam o desenrolar do projeto, foram o cientista político Daniel Douek, na ocasião Diretor Executivo do Instituto Brasil-Israel; o empresário David Diesendruck, então presidente do Instituto Brasil-Israel; Miriam Vasserman, atual vice-presidente da Federação Israelita do Estado de São Paulo; Vahan Agopyan, atual Secretário de Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo, entre outras pessoas importantes.

Mas criar um projeto de Direitos Humanos com uma proposta inovadora e injetá-lo dentro do ecossistema de diversas universidades requer muita articulação. Nesse ponto, a história começa a se tornar muito interessante. Ana Beatriz é uma jovem filha de pessoas do universo acadêmico, mas que também possuem interações com entidades da sociedade civil e com o mundo artístico. Ela foi criada nesse circuito, portanto, inicia o Zerah com seu networking natural, que já fazia parte do seu mundo, e inicia um trabalho muito sério de conexão com entidades. E ela nos fala um pouco sobre isso: “Não se trabalha com Direitos Humanos de forma individual. Qualquer projeto que se proponha a atuar nessa área precisa estar conectado com outros que já fazem isso. Então, ao iniciar o Zerah, a minha preocupação, além de conseguir entrar dentro de espaços universitários com essa proposta educacional, era de conseguir criar pontes com entidades do terceiro setor, com o Ministério Público e com uma intelectualidade progressista”, coloca Ana Beatriz.

Sobre o início dos trabalhos do Zerah e sua construção de pontes no mundo acadêmico e na sociedade civil, conversamos com o cientista político Daniel Douek:

“Acompanhei o início do trabalho do Zerah, tendo me impressionado a capacidade de articulação da organização junto a Universidades e instituições da sociedade civil para a promoção de atividades de sensibilização ligadas a questões socioambientais e de direitos humanos, com a participação de profissionais altamente qualificados e grande adesão de público".

Dentre as várias ações e atividades promovidas, destacam-se dois momentos significativos:

Primeiramente, a realização de uma iniciativa conjunta entre membros do Zerah e do Ministério Público do Estado de São Paulo, ocorrida em 31 de março de 2023. Juntos, formaram uma comitiva que visitou a Casa 1, uma instituição de acolhimento para pessoas LGBTQIA+. Durante essa visita, diversas doações foram feitas, incluindo roupas doadas pelo Zerah. Ana Beatriz Prudente Alckmin, Presidente do Zerah, participou da visita juntamente com a promotora do Ministério Público do Estado de São Paulo, Fabíola Sucasas.

Outro momento que merece destaque foi a parceria estabelecida entre o Zerah e a Universidade de Taubaté. Dentro do contexto dessa colaboração, foram organizados diversos eventos e palestras, com destaque para o evento "Contribuições Democráticas". Este evento contou com a participação dos palestrantes: Mario Sarrubbo, então Procurador Geral de Justiça de SP e atual Secretário Nacional de Segurança Pública; Sandra Almeida, mediadora e membro do Rotary Club; Pedro Serrano, jurista e professor da PUC-SP; e Sergio Napchan, diretor da Confederação Israelita do Brasil. Essa parceria não só enriqueceu o debate público, mas também fortaleceu os laços entre as instituições envolvidas.

Sobre as contribuições do Zerah nas atividades da Universidade de Taubaté, ouvimos o professor do curso de Direito e delegado de Polícia do Estado de São Paulo, Daniel Estefáno, que disse: "Eu gostaria de registrar meus sinceros agradecimentos ao Zerah, que na pessoa de sua fundadora, Ana Beatriz Prudente Alckmin, proporcionou a realização de eventos no município de Taubaté, congregando a comunidade acadêmica e advogados locais, os quais tiveram a oportunidade de prestigiar palestras proferidas por exímios conhecedores das ciências jurídicas e sociais, bem como da cultura judaica e seus representantes no Brasil. Os eventos, que contaram com excelente planejamento e organização, foram realizados na sede da 18ª subseção da OAB e também no Campus da Unitau. Além dos já mencionados eventos, também tivemos a oportunidade de participar de palestras promovidas pelo Zerah na capital do estado, onde pudemos ratificar a excelência de sua atuação e a importância na promoção da interseção de pautas que são fundamentais para o desenvolvimento de nossa sociedade”.

As palestras organizadas pelo Zerah nas instituições também contribuem para fortalecer as relações dos palestrantes com o núcleo de Direitos Humanos presente dentro da própria universidade. Para compreendermos melhor como isso funciona na prática, entrevistamos o Diretor de Relações Públicas da Clínica Jurídica de Direitos Humanos do IBMEC, Pedro Luiz Pereira dos Santos: “O Zerah, ao longo desses dois anos, tornou-se um elemento de extrema importância para a Clínica Jurídica de Direitos Humanos do IBMEC-SP como nosso parceiro de alta relevância dentro das temáticas de direitos humanos e sua relação com as mudanças climáticas e meio ambiente. As diversas portas e experiências que o Zerah trouxe para a Clínica, para seus membros e para os alunos do IBMEC-SP, e especialmente para sua CEO, Ana Beatriz Prudente Alckmin, com sua expertise, cultura e ampla rede de personalidades, possibilitaram atividades incríveis e excepcionais, bem como encontros com grandes nomes de diversas áreas do conhecimento, desde juristas, reitores de grandes universidades até membros do corpo diretivo de grandes empresas, para enriquecer os debates e expandir nossos conhecimentos sobre direitos humanos em sua pluralidade de áreas". 

No próximo dia 28 de abril, o Zerah promoverá, junto com os alunos da Clínica Jurídica de Direitos Humanos do IBMEC, uma análise do relatório da ONU sobre o ocorrido no dia 07 de outubro em Israel. Esta atividade visa apresentar para os alunos o formato de um relatório da ONU, qual é o formato do relatório, como ele é estruturado, qual o conteúdo esperado dentro de um relatório dessa natureza e uma análise do próprio. Muitos alunos que atuam em grupos de Direitos Humanos ou em clínicas jurídicas de Direitos Humanos, em algum momento futuro da carreira, terão contato com este tipo de documento, seja na condição de redatores ou como leitores. Por isso, é muito importante durante a graduação já conhecer este tipo de documento. 

Além do mais, é importante conscientizar os estudantes da importância deste tipo de documento. Uma vez que um relatório sobre uma tragédia humanitária como a ocorrida no dia 07 de outubro é feita tardiamente, a atenção para as vítimas civis por parte da comunidade internacional de defensores dos Direitos Humanos fica prejudicada. E independente do que diz qualquer relatório, as vozes de mulheres não podem ser ignoradas, as histórias que os corpos contam não podem ser ignorados. Deslegitimar as vítimas é transforma-las em vítimas novamente. 

Em uma atividade anterior do Zerah no IBMEC, já havia ocorrido uma abordagem do ataque do Hamas a Israel em 07 de outubro. No dia 21/03, o Zerah realizou uma atividade no IBMEC, onde mulheres importantes compartilharam os seus conhecimentos com o recorte de gênero. Miriam Vasserman, vice-presidente da Federação Israelita do Estado de São Paulo, trouxe o tema "As Mulheres como Arma de Guerra no Massacre de 07 de outubro”, mostrando como a violência contra a mulher é parte importante da história do trágico ataque. Miriam Vasserman é uma importante voz de liderança para o desenvolvimento do Judaísmo Progressista na América Latina. Trouxe ao evento a perspectiva comunitária judaica, com este olhar da comunidade para os estudantes.

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum

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