Estudantes que vão iniciar cursos de graduação já preferem EAD, afirma consultoria; por Leandro Chemalle

"74% dos alunos que a princípio eram contrários a modalidade depois de vivenciar os cursos em instituições privadas não pretendem mudar pra um curso presencial"

Ensino à distância (Foto: Agência Brasil)
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Por Leandro Chemalle*

A pandemia do novo coronavírus fez com que acelerasse a projeção do aumento do número de matrículas de alunos de graduação na modalidade a distância (EAD) para os próximos anos. É o que indica o estudo feito pela consultoria de pesquisas educacionais Educa Insights e publicado pela Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES). Segundo a consultoria o total de estudantes matriculados em cursos de graduação na modalidade EAD deve superar o total de estudantes dos cursos presenciais já em 2022.

O dado que chama mais atenção são as projeções de matrículas já para o segundo semestre de 2020. Segundo a Educa Insights nas ações de prospecção de novos alunos a procura pelo início em cursos de graduação totalmente EAD tem aumentado significativamente, apesar de a procura pelos vestibulares de meio de ano estarem 50% menores, se comparados ao meio dos anos de 2018 e 2019. O 2o semestre de 2020 terá um corpo estudantil ingressante atípico que deverá contar com pelo menos o dobro de estudantes ingressante em cursos EAD, se comparado aos cursos presenciais tradicionais.

O aumento da adesão aos cursos totalmente EAD já vem sendo percebido nos últimos anos observando os últimos Censos da Educação Superior do MEC. Em 2018 as duas modalidades já apresentavam uma diferença de apenas 243 mil matrículas. A estimativa é de que em 2019 o número de novas matrículas em EAD já seja maior do que nos cursos presenciais, passando de 1,6 milhão, enquanto que as matrículas em cursos de graduação presenciais deve ficar em torno de 1,5 milhão. A expectativa é de que esses dados se confirmem no Censo 2019, previsto para ocorrer em outubro deste ano.

“A mediação tecnológica na educação é uma tendência mundial, da qual o Brasil também faz parte. Nossas estimativas anteriores, baseadas em indicadores econômicos, sociais e demográficos, apontavam para a inversão entre o número de alunos do presencial e EAD somente em 2023. No entanto, tivemos alterações socioeconômicas significativas, que ao que tudo indica, anteciparam em um ano esse processo”, afirma o diretor presidente da ABMES, Celso Niskier.

Esses dados fazem com que os fatores que abordamos no artigo anterior em relação a falta de conhecimento e a deficiência de representação dos estudantes dos cursos EAD sejam ainda mais dramáticas. Um dado interessante da pesquisa Educa Insights, no recorte dos estudantes de universidades privadas é que dentre os estudantes que preferiam cursos presenciais e acabaram se matriculando em cursos EAD, 74% afirmou depois de algum tempo de curso que não pretende mudar para cursos presenciais mesmo que suas condições financeiras sejam mais favoráveis. Ou seja, 74% dos alunos que a princípio eram contrários a modalidade depois de vivenciar os cursos em instituições privadas não pretendem mudar pra um curso presencial.

O levantamento faz parte da terceira etapa da pesquisa que mede o impacto da pandemia da Covid-19 no ensino superior, que teve início no mês de março. A pesquisa, que ouviu 1.607 pessoas, entre estudantes universitários e futuros estudantes que pretendem ingressar no ensino superior pelos próximos 12 meses. Entre os estudantes das modalidades presencial e a distância é possível perceber a elevação do risco de continuar estudando. Nesta edição, 47% dos estudantes presenciais apontaram riscos de desistir do curso em função da pandemia.

A pesquisa também apurou que após 76 dias do início do isolamento social provocado pela pandemia da Covid-19 no Brasil, mais de 80% das instituições de ensino superior particulares do país migraram suas atividades presenciais para aulas remotas. Outras 18% preferiram optar por suspender as aulas ou o semestre. Na maioria foram instituições com pouco ou nenhum investimento em tecnologias educacionais até o ano passado. Apesar disso, a maioria das universidades conta com a volta às aulas presenciais já no começo do 2o semestre. As mantenedoras já contam com a realidade de ter que diminuir a quantidade de alunos em sala, além de todas outras recomendações da OMS.

Foto: Divulgação

Com um cenário incerto em 2020, para 2021 a consultoria Educa Insights já projeta mais matrículas EAD do que em cursos presenciais, sendo que 90% das matrículas em cursos EAD nos últimos anos foram realizadas em universidades privadas, dada a baixíssima oferta de vagas de universidades públicas nessa modalidade. Outro dado que chama atenção é que as pesquisas mais recentes apuraram que cerca de 35% dos estudantes que pretendem iniciar um curso superior em todas faixas etárias devem fazer a opção por uma graduação à distância. Em 2017 esse número era de apenas 14%. Ou seja, em 3 anos o percentual de estudantes que querem ingressar em uma graduação à distância subiu 150%. E a tendência é que nas próximas pesquisas esse número cresça ainda mais.

Diante disso o cenário que se apresenta para o ensino superior público no âmbito das Universidades Federais e Estaduais é que 1 em cada 3 estudantes que pretendem entrar em uma universidade quer um curso EAD e 90% das vagas dessa modalidade se concentram em instituições privadas. Esse número pode soar estranho quando nos baseamos pelo senso comum do estudante universitário jovem de 18 a 25 anos recém formado no ensino médio, que sim na sua maioria pretende cursar uma universidade presencial. Ocorre que a faixa etária até 25 anos não corresponde a maior parte das matrículas de todo ensino superior, juntando presencial e EAD. Em especial, quando consideramos as graduações EAD que tem faixa etária média maior que 30 anos, temos que essa faixa caminha a passos rápidos para se tornar a maior parte do corpo estudantil, quebrando portanto essa visão de senso comum.

No último dia 15 de junho a reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) afirmou que se não tiver vacina ou tratamentos eficazes contra a Covid-19 o retorno as aulas presencias não ocorrerá no ano de 2020. E esse posicionamento provavelmente será seguido por uma série de outras universidades. Ainda não é possível mensurar o impacto dessa realidade nos estudantes, especialmente aqueles ingressantes no começo deste ano e que praticamente não tiveram como conhecer a sua nova universidade. Mas o fato é que no ensino superior não dá mais para lutar contra a Educação a Distância, e sim procurar estabelecer parâmetros de qualidade e inclusão, mas isto já é tema para um próximo artigo.

*Leandro Chemalle é Secretário Geral do Partido Pirata. Foi Diretor de Inclusão Digital da UNE, Diretor do DCE e representante discente na UFSCar, Diretor de Comunicação da ABE-EaD e atualmente é estudante da UNIVESP.

*Esse artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum.