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Por Gleisi Hoffmann*
Que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é vítima de uma perseguição implacável de seus inimigos, que usam os instrumentos do sistema de justiça pra conseguir seus intentos, não é novidade para ninguém, o mundo inteiro sabe. Que foi acusado, julgado e condenado sem crime e sem provas, e retirado do processo eleitoral – em que esteve todo o tempo em primeiro lugar nas pesquisas – com o objetivo claro de beneficiar o candidato que fora eleito, pelo juiz Sérgio Moro, que se tornou ministro da Justiça, é fato inconteste.
Hoje a pergunta se atualiza. Depois de toda a injustiça de que tem sido vítima, quando se sabe que sua situação jurídica permite que esteja em regime semiaberto, por que Lula ainda segue preso? Que medo é esse que as elites sentem dele, a ponto de criarem toda a sorte de artifícios para mantê-lo na cadeia?
Do show midiático da condução coercitiva totalmente ilegal, sem intimação prévia, ocorrida no dia 04 de março de 2016, à tentativa cínica e sem disfarce de descumprimento de uma ordem do Supremo Tribunal Federal sobre a entrevista de Lula na última sexta-feira, 26 de abril – em que um delegado determinou que a entrevista fosse acompanhada por uma plateia de jornalistas em lista definida por ele e foi forçado a recuar – há uma coleção de ilegalidade e arbitrariedades gritantes nos processos de Lula, tais como o grampo que envolveu conversa com a presidenta da República Dilma Rousseff e o bizarro PowerPoint do Ministério Público da força-tarefa da Lava Jato para afirmar suas “convicções” diante da ausência de provas.
A última ilegalidade atende pelo nome de regime de cumprimento de pena.
O Núcleo de Acompanhamento de Políticas Públicas do Partido dos Trabalhadores – NAPP, em conjunto com as bancadas no Congresso Nacional, a Fundação Perseu Abramo e o Instituto Lula, realizou no dia 25 de abril, última quinta-feira um seminário para discutir os projetos do assim chamado “Pacote Moro” que, a par de se autodenominar “anticrime” vai, na verdade, ampliar os índices de violência, a impunidade dos crimes cometidos por agentes públicos da área de segurança, aumentar o número de feminicídios, casando a posse de arma com as novas hipótese de legítima defesa, e estrangular o já combalido sistema carcerário com o aumento do número de presos.
É um projeto pró-crime e antissegurança.
No acúmulo dos debates do seminário, a discussão sobre o julgamento, na Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, na última terça-feira (23) foi reveladora no ponto em que a situação jurídica atual do ex-presidente Lula é de encontrar-se, desde, já, no regime semiaberto. Isso porque, tendo havido nova pena, aplica-se novo regime inicial de cumprimento que é contado com o prazo de 8 anos, 10 meses e 20 dias. Descontando-se 13 meses e dias já cumpridos por Lula em sua ilegal prisão, o prazo é de 7 anos, 10 meses e 20 dias. Em fácil explicação, penas abaixo de 8 anos e acima de 4 anos são cumpridas em regime semiaberto. Lula, portanto, tem o direito, público e irrenunciável, de cumprir pena no regime semiaberto desde já.
Ao seu final, o Seminário de Medidas Penais divulgou uma Carta Pública que foi assinada por todas as autoridades presentes, professores de direito, advogados de direito penal, processual penal e especialistas em segurança pública, o governador do Maranhão e ex-juiz Flávio Dino, o advogado e ex-candidato à presidência Fernando Haddad, parlamentares e dirigentes partidários, em que assinala que o Poder Judiciário deve declarar, desde já, o novo regime de cumprimento de pena do ex-presidente Lula, fazendo o desdobramento de seus efeitos. Um direito público obrigatório e irrenunciável, que independe de seu pedido. A detração é um instrumento adotado e legitimado inclusive pela jurisprudência da 5ª Turma do STJ, que assegura a redução do tempo já cumprido para determinar o início do regime de cumprimento da pena.
Em franca contradição, alguns membros do Poder Judiciário costumam dizer que Lula é um preso comum, embora o tratem de forma distinta quanto a seus direitos, como quando lhe negam o direito de velar e enterrar o próprio irmão, quando armam um esquema absurdo e exagerado de segurança, para que ele passe algumas poucas horas no velório de seu neto de 7 anos, e como criam uma cizânia de mais de um ano para permitir que conceda entrevistas. Se Lula é um “preso comum” é preciso reconhecer a ele os direitos de todos os presos.
Lula não cometeu nenhum crime e nenhuma pena lhe deveria ser aplicada. Mas uma vez que o Poder Judiciário o condenou, o Brasil e o mundo esperam, pois, para saber se esse será mais um episódio em que a lei será abusiva e claramente descumprida, em que o sistema de Justiça servirá de esteio para fazer valer interesses externos e espúrios e dar efetividade ao desejo punitivista e autoritário de quem quer negar a Lula seus direitos de cidadão.
Lula Livre e já, por direito dele e dever do Estado.
*Gleisi Hoffmann é presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores e deputada federal (PR)