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Por Rafael Moreira*
A atuação do Partido Social Liberal (PSL) dentro dos espaços de poder evidencia o que tenho apontado desde 2018: o partido sempre teve um forte potencial para reeditar a trajetória do Partido da Reconstrução Nacional (PRN), de Fernando Collor de Mello em 1989. Assim, o partido-chefe da atual coalizão governista, tal como tem ocorrido historicamente com outros partidos do campo da direita do nosso sistema partidário, encontra dificuldades para se tornar uma sigla orgânica, que mantenha uma base social de apoio sólida, assim como uma atuação coesa dentro do Poder Legislativo.
Para quem não compreendeu a comparação com o PRN (ou não conhece nossa história política recente), explico. No ano de 1989 seriam realizadas as primeiras eleições presidenciais diretas após nosso processo de transição democrática, e sendo aquela uma eleição “solteira”, ou seja, para apenas um cargo eletivo, nenhum partido viu motivos para deixar de apresentar seu próprio candidato [1]. Este fato também estimulou todo e qualquer aventureiro político que buscasse ter uma projeção nacional, caso de Collor, que conseguisse encontrar uma sigla que proporcionasse espaço para uma candidatura presidencial. Nesse sentido, o então governador de Alagoas, que já havia passado por três siglas, ARENA, PDS e PMDB (qualquer semelhança com a trajetória de Bolsonaro, que já foi filiado a sete partidos, também não é mera coincidência), filiou-se ao Partido da Juventude (PJ), que a partir de então seria renomeado para PRN.
Com a vitória de Collor nas eleições presidenciais daquele ano e conforme se aproximavam as eleições legislativas de 1990 (ainda não havia concomitância na data dos pleitos naquela ocasião) sua sigla passou a atrair todo tipo de oportunistas políticos dispostos a surfar na onda “Collorida”. Nesse sentido, o PRN elegeu naquele ano uma ampla bancada, composta por 40 deputados federais e 5 senadores, que dariam sustentação ao breve mandato do presidente eleito. Nada mal para uma sigla que praticamente estreava na nossa política nacional, mas a bancada teve vida curta. Conforme o governo Collor começava a afundar em popularidade e com a conclusão do seu impeachment em 1992 seu partido "murchou", evidenciando sua baixa coesão, com boa parte de seus parlamentares abandonando a sigla.
Até esse ponto da história a semelhança com a trajetória da sigla de Jair Bolsonaro é bastante nítida, independentemente do que venha a ocorrer daqui pra frente com o mandato do atual presidente. Tendo sido rotulado desde sua fundação como um “partido de aluguel”, que sempre permitiu a filiação de qualquer aspirante a político independentemente do seu posicionamento político-ideológico ou de sua idoneidade, o PSL recebeu 4 vezes mais filiados que seus rivais apenas no primeiro semestre de 2018 [2], impulsionadas após Bolsonaro anunciar que aquela seria sua sigla para a campanha presidencial de 2018. Assim, abertas as urnas da eleição daquele ano, o partido passou de “sigla nanica” para detentor da segunda maior bancada da Câmara dos Deputados [3] – ainda que aparentemente o tamanho da bancada tenha sido impulsionado por candidaturas “laranjas” em alguns estados [4].
Entretanto, após poucos meses de mandato e conforme a popularidade do presidente segue em queda [5], muitos de seus parlamentares têm demonstrado seu pouco compromisso com o partido, contrariando o posicionamento de seus dirigentes em algumas votações no Congresso e até abandonando ou sendo expulsos da legenda. Seguiram esse caminho o deputado federal Alexandre Frota [6], expulso após não seguir a orientação dos dirigentes da sigla, e a senadora Selma Arruda [7].
Algumas de suas principais lideranças também já declararam publicamente nos últimos meses que cogitam abandonar o PSL, caso do senador Major Olímpio [8], da deputada federal Joice Hasselmann [9], e a deputada estadual Janaina Paschoal [10]. Além disso, muitos outros permanecem insatisfeitos na sigla [11] dando sinais de que poderão deixá-la no futuro [12], e minha hipótese para que a “debandada” não tenha sido maior até o momento é o ciclo de eleições municipais no ano que vem.
Afinal, o PSL é um dos partidos que mais receberá repasses do fundo partidário e do fundo eleitoral para suas campanhas [13], que em partes será usado pelos parlamentares que disputarão as eleições municipais em 2020. O futuro dirá se minha hipótese se confirma ou não.
[1] Limongi e Guarnieri, 2014 – “A base e os partidos. As eleições presidenciais no Brasil pós-redemocratização”. Revista Novos Estudos.
[2] https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,psl-ganha-4-vezes-mais-filiados-do-que-os-rivais,70002452145
[3] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/02/conheca-a-trajetoria-do-psl-de-sigla-nanica-ate-bolsonaro-e-os-laranjas.shtml
[4] https://congressoemfoco.uol.com.br/especial/noticias/bolsonaro-se-beneficiou-das-candidaturas-laranjas-do-psl-em-mg-diz-jornal/
[5] https://brasil.elpais.com/brasil/2019/09/02/politica/1567424420_050223.html
[6] https://oglobo.globo.com/brasil/alexandre-frota-expulso-do-psl-apos-criticas-bolsonaro-23873965?fbclid=IwAR35lImWAfcRkJgY6RzHsV_aJGA5WII8sRkfBPVlDZ08RwN7-Es1lKc3z1k
[7] https://veja.abril.com.br/politica/moro-de-saias-selma-arruda-se-filia-ao-podemos/
[8] https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2019/08/27/estou-cogitando-deixar-o-psl-diz-major-olimpio.htm?fbclid=IwAR15R5GBW6zHxRwlD_UEBoFz4mX_tCAuKuBD7DWV05OCjsFj7Qq_xj1oukY
[9] https://valor.globo.com/politica/noticia/2019/09/30/psl-sp-pressiona-joice-a-deixar-partido-e-aprofunda-briga-interna.ghtml?fbclid=IwAR2_4b1ayiwjnFYtsjsorz7rEMHfPVDpsF8WfXZXndEdhFnClLJ9zcPUW4g
[10] https://exame.abril.com.br/brasil/janaina-paschoal-diz-a-colegas-que-quer-deixar-o-psl-voces-estao-cegos/
[11] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/08/bolsonaro-nao-e-burro-mas-um-idiota-ingrato-que-nada-sabe-diz-alexandre-frota.shtml?fbclid=IwAR2KtCMS1W3j1ZqP9AXCW5Q8T7--OTeu9ltUq9sNrhxpMveYt3-4csOja4E
[12] http://www.jornaldaorla.com.br/noticias/38587-a-vida-como-ela-e/?fbclid=IwAR3sDfzldEhY_dcaUAESXV0BXBkzDLijLVqxNi0w1L9gyxzJMkbhv1ZLaGA
[13] https://www.poder360.com.br/eleicoes/psl-e-pt-lideram-em-recursos-publicos-em-2020-ano-eleitoral/
*Doutor e Mestre em Ciência Política pela USP. Contato: Facebook.com/rafaelpolitica