Uma das escolas de samba mais tradicionais de São Paulo, detentora de 11 títulos do grupo especial, a Nenê da Vila Matilde perdeu o acesso à elite do carnaval paulistano ao ser penalizada pelo uso da expressão nordestina "oxente".
Integrantes da escola, que temem represálias da Liga paulistana, afirmam em tom de anonimato que houve preconceito linguístico por parte da jurada, que acusou a escola de não justificar o uso da "expressão popular oxente", além de "erro de português".
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A penalização resultou na perda de um décimo na nota da Nenê, que causou um efeito devastador. A escola terminou em terceiro lugar no Grupo de Acesso 1, com 269,7 pontos. Caso não tivesse perdido esse décimo injustamente, a escola alcançaria 269,8 pontos e empataria com as campeãs, Tom Maior e Mocidade Unida da Mooca, obtendo assim o acesso ao Grupo Especial.
"O próprio Manual do Julgador, documento que orienta as avaliações dos desfiles, é claro ao afirmar que 'o jurado penalizará erros graves de português, porém, relevará expressões do vocabulário popular, regional e/ou de caráter religioso, não se apegando à norma culta da língua portuguesa, quando isto se justificar diante do enredo'. O uso de 'oxente', amplamente reconhecido como parte da cultura nordestina, não deveria ter sido penalizado, configurando a decisão como uma manifestação de xenofobia e discriminação cultural", diz fonte ouvida pela Fórum.
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O regulamento da LIGA-SP impede qualquer forma de contestação das notas atribuídas pelos jurados, estabelecendo no Artigo 36 que "não caberá recurso quanto às notas atribuídas pelos jurados às escolas de samba, bem como alterações após a abertura dos envelopes".
Além disso, o Artigo 37 estipula que qualquer escola que recorrer ao Judiciário para contestar o resultado será automaticamente suspensa do Carnaval de São Paulo, em um claro cerceamento do direito ao contraditório e à ampla defesa.
Em nota divulgada nesta sexta-feira (14), a Liga Independente das Escolas de Samba de São Paulo diz que, em plenária do dia anterior, os presidentes das agremiações do Grupo Especial decidiram que o resultado do Carnaval de 2025 será mantido. "Portanto, nenhuma alteração será realizada na classificação final do Carnaval de 2025", diz o texto.
"Vale frisar que a decisão foi tomada exclusivamente pelos presidentes das escolas de samba do Grupo Especial. Assim, a Liga-SP, enquanto entidade organizadora do Carnaval de São Paulo (Grupo Especial, Acesso I e Acesso II), respeita e acata a deliberação soberana dos dirigentes das agremiações", emenda a liga.
Segundo fonte ouvida pela Fórum, o caso da Nenê de Vila Matilde não é apenas uma injustiça isolada, mas sim um reflexo de problemas estruturais na avaliação do Carnaval de São Paulo.
"A falta de mecanismos para revisar erros evidentes, a subjetividade de alguns jurados e a imposição de regras que impedem as escolas de recorrer precisam ser urgentemente debatidas para garantir um julgamento mais justo e transparente nos próximos carnavais", diz.