Apesar da Constituição Federal garantir no Art. 1ª a livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, o Brasil vive um momento de crescente censura a livros nos últimos anos. Publicações e autores, especialmente aqueles que abordam temas sensíveis ou divergentes da visão hegemônica conservadora, têm sido alvos de ataques por parte de grupos e figuras políticas.
Na semana passada, o livro “O Avesso da Pele”, de Jeferson Tenório foi mais um a receber ataques. A Secretaria Estadual de Educação (Seed) do Paraná determinou a retirada do livro de Jeferson Tenório das bibliotecas das escolas estaduais de ensino médio. Depois, mais dois estados fizeram o mesmo e nada foi feito. Esse movimento que não começou hoje e que também não é isolado, aumentou significativamente a partir do governo de Jair Bolsonaro, que segundo os autores de “Biografia do Abismo”, Felipe Nunes e Thomas Traumann, polarizou o país, em vários aspectos e contextos.
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A consequência disso é o aumento da intolerância e do ódio na sociedade e a fragilidade do sistema político, que começa a tolerar situações absurdas, como o recolhimento de obras literárias em escolas, eventos e a relacioná-las diretamente com algum tipo de “partidarismo”, valores e práticas que não condizem com o seu conteúdo em uma tentativa de apenas condená-las. Importante ressaltar que geralmente são livros que tratam de questões sociais, questões pouco debatidas e que questionam estruturas racistas, machistas, homofóbicas, xenófobas, entre outras, proporcionando maior criticidade.
Com isso, a Fórum vem relembrar alguns dos momentos em que livros sofreram tentativa de censura por bolsonaristas e políticos da extrema direita em diferentes anos e regiões do Brasil.
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2019: Tentativa de censura a um HQ na Bienal do Livro
No primeiro ano do governo de Bolsonaro, o então prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, tentou retirar o romance gráfico "Vingadores: A Cruzada das Crianças", do escritor Salvat, da Bienal Internacional do Livro do Rio. O motivo? Um beijo entre dois personagens masculinos. A tentativa de censura gerou repercussão nas redes sociais e indignação em toda a comunidade literária e Crivella foi derrotado duas vezes no Supremo Tribunal Federal (STF).
2020: Lista de livros para “recolher” das escolas de Rondônia
Naquele ano, o governo do bolsonarista Marcos Rocha (PL), ex-coronel da Polícia Militar que determinou a retirada de 43 livros das bibliotecas das escolas públicas do estado, na alegação de serem "inadequados às crianças e adolescentes”, retirava clássicos da literatura brasileira, como Rubem Alves, Mário de Andrade, Machado de Assis, Franz Kafka e Euclides da Cunha. “É um despautério imaginar, em pleno século XXI, a retomada de um índice de livros proibidos”, disse a Academia Brasileira de Letras (ABL) em nota na época.
2023: Retirada do livro de Marçal Aquino da lista de livros para vestibular
Em maio do ano passado, o romance "Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios", do escritor Marçal Aquino, foi retirado do vestibular da Universidade de Rio Verde (UniRV), no sudoeste de Goiás, após críticas de um deputado bolsonarista. O livro é ganhador do prêmio Jabuti assim como o “Avesso da Pele”. Sem ler ele, Gustavo Gayer (PL) disse que o livro tinha “absurdos pornográficos”.
“O livro explora temas como amor, traição, violência, e redenção. A escrita de Marçal Aquino é poética e evocativa, retratando com detalhes a atmosfera e a paisagem da região amazônica. A Companhia das Letras repudia qualquer tipo de censura e, diante de uma situação como essa, declara seu apoio a @marcal_aquino”, escreveu a editora Companhia das Letras na época.
2023: Governo de Santa Catarina tenta tirar 9 livros das escolas
Caso mais recente, o governo do bolsonarista Jorginho Mello (PL) baniu uma série de livros das escolas públicas do Estado em novembro do ano passado. Entre as obras proscritas estavam um best seller de Stephen King, "It: A Coisa", “Os 13 Porquês”, de Jay Fischer, a biografia “O diário do diabo: os segredos de Alfred Rosenberg, o maior intelectual do nazismo”, de Robert K. Wittman e David Kinney, “Laranja Mecânica”, de Anthony Burgess, e “A Química entre Nós”, de Larry Young e Brian Alexander.
O comunicado, emitido por meio de um ofício, chegou às bibliotecas da rede pública do estado na autoria do supervisor de Educação, Waldemar Ronssem Júnior, e da integradora Regional de Educação, Anelise dos Santos de Medeiros, determinando a retirada dos livros da rede estadual de educação na época.
Os temas e assuntos dos livros censurados abrangiam gêneros de terror e drama, além de questões comportamentais e psicológicas e sobre regimes autoritários, podendo ser importantes para o desenvolvimento da criticidade. O ofício, que não explicou o motivo da retirada das obras, apenas afirmou que os livros listados seriam recolhidos. "Determinamos que as obras listadas sejam retiradas de circulação e armazenadas em local não acessível à comunidade escolar. Em breve enviaremos novas orientações".