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Por Marcelo Lyra*
Muito triste aqui com a morte do Rubens Ewald Filho. Comecei a conhecer cinema lendo os textos dele ainda na adolescência, na querida cidade de Santos, onde ele escrevia para o jornal A Tribuna, que meu pai assinava. Nessa época, não perdia uma coluna "Os Filmes de Hoje na TV", onde ele destacava o filme mais importante do dia finalizando o texto com a frase: "Não deixe de ver".
Era a senha para mais uma madrugada acordado assistindo algum clássico na Sessão Coruja da Globo! Se hoje estou aqui dando cursos, devo totalmente a seus textos, porta de entrada para minha cinefilia.
Seu livro "Dicionário de Cineastas" era imprescindível para críticos e cinéfilos, quebrava o maior galho quando não me lembrava do nome em português, data de lançamento ou elenco de algum filme. Com o tempo conheci outros críticos mais interessantes e que me influenciaram bem mais, como o Inácio Araújo e o Roger Ebert.
Passei a achar muitas de suas ideias idiossincráticas e sua visão de cinema um tanto limitada, porque pautada pelo sucesso e glamour. Lembro de um comentário típico dele numa entrega de Oscar. Rubens tinha apostado suas fichas que outro ator, não lembro qual, ganharia o Oscar. Aí, na hora do anúncio, o Oscar foi para o Adrien Brody pelo genial "O Pianista". Decepcionado, soltou essa, ao vivo: " - Não sei como um ator tão feio ganha o Oscar!"
O Festival de Cinema de Paulínea, por exemplo, do qual ele foi criador da parte cinematográfica, poderia ter sido um grande festival, mas nunca foi nada mais que apenas uma festa, versão piorada do lado Glamour do festival de Gramado.
Para além de tudo isso, eu sempre tinha carinho e gratidão pelo Rubens Ewald pelo pontapé inicial na profissão que amo muito e não troco por nada. E também pelo fato de ter popularizado e tornado respeitada a profissão de crítico de cinema. Todos nós, críticos e cinéfilos, devemos muito a ele. Décadas depois das primeiras leituras atentas e apaixonadas de seus textos, virei profissional da crítica e com o tempo nos tornamos amigos.
Me impressionava sempre a constatação de que sua conhecida memória de elefante para informações sobre cinema não era lenda. Ele era incrível, insubstituível. Mais que isso, Rubens era gentil e generoso, não por acaso ajudou a publicar meu livro "Cinema Como Razão de Viver", da mesma forma como ajudou dezenas de jovens críticos (veteranos também).
Fará muita falta ao cinema.
*Professor, crítico de cinema e jornalista. Formado em jornalismo pela PUC-SP em 1989, cursou as disciplinas de roteiro, montagem, crítica de cinema e de história da crítica, na Escola de Comunicação e Artes da USP. Passou por quase todas as editorias de jornais até chegar, em 1999, ao Caderno 2 do Jornal O Estado de S. Paulo, quando tornou-se repórter de cinema e eventualmente assinava a coluna de Filmes na TV. Foi crítico de cinema do Jornal da Tarde e colaborador de inúmeras publicações, sempre na área de cinema. Atualmente escreve para o jornal Valor Econômico, além de ministrar regularmente cursos sobre crítica de cinema, história do cinema, cinema brasileiro e outros. É autor do livro “Cinema Como Razão de Viver”, publicado em 2003. Em 1993 foi vencedor do prêmio Abic de melhor reportagem.