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Tomaz Amorim Izabel, colunista da Revista Fórum, lança nesta sexta-feira, dia 31 de agosto, seu primeiro livro de poesia: “Plástico pluma”, pela Editora Urutau. Ele já havia publicado na mesma editora traduções de obras de Franz Kafka e Walt Whitman. O livro conta com posfácio de Rafael Zacca, doutorando em Letras pela UFRJ, que caracterizou o livro da seguinte maneira:
“A quem se destina um livro de poesias? Quando Odisseu retornou à casa depois de tanto sofrer (e gozar) em Troia e nos mares e ilhas no caminho do regresso, mal pôde ser reconhecido por Penélope. Rimbaud fabulava uma viagem da qual retornaria brutal e com outros traços. As mitologias estão cheias de personagens que se transformaram permanentemente após uma viagem iniciática – como é o caso da marca de Hefesto. Depois de abandonar a vida miserável nos sertões, a população de Canudos parece ter perdido as feições “brasileiras” da nova nação – senão, de que outro modo se explica que a própria nação tenha destinado quatro expedições, entre elas a maior das já realizadas em território nacional, para massacrar adultos, velhos e crianças? Plástico Pluma traz imagens de uma geração que se tornou irreconhecível na Terra, frequentemente irreconhecível entre seus próprios membros. A quem se destina esse livro de poemas?”
O livro conta ainda com orelha do poeta André Nogueira, mestre em Letras pela USP, que descreveu “Plástico pluma” como:
“O prazer de, num mar de plástico-bolha, afundar. A glória de, sobre asas de plástico-pluma, voar. É este o desafio, um deles, o maior deles, de Tomaz Amorim Izabel: sacar, ao torvelinho da liqüidação global, um resíduo sólido de linguagem, baphywave, com o qual construir uma poesia, Plástico Pluma, que dê ao mundo pós-bug do milênio uma nova anunciação e esperança. A matéria deste livro, o que os sobreviventes da guerrilha urbana logo notam, sem afãs de distopia, é muito concreta: de Ramala, esfumaçante de véus, ao vale do Anhangabaú, por cujas ruas vamos nós, com nossas raças, lutas e amores. Erguendo, para o imenso corpo de sucata e ultra-tecnologia da capital, um golpe nu de capoeira. Revivendo os fósseis que há no combustível que move a modernidade, o sangue ancestral que ferve ao som de atabaques. O vôo de Plástico Pluma traz à literatura de nosso país um impulso potente e nova alegria, a certeza que temos, ao ler um grande poeta, de que a tudo observam, sobre o plano de ruínas, os sábios olhos da águia”.
O lançamento contará com leitura de poemas pelo autor e por poetas convidados. Abaixo, três poemas inéditos do livro.
Quando: 31 de Agosto, sexta-feira
Que horas: 19h!
Onde: Patuscada, Bar e Livraria - R. Luís Murat, 40 - São Paulo.
*
panapaná
revoadas de enxames de manadas aladas
manteiga borbulhando caramelizada
creme açucarado, e suave, amarelo dourado
bolinhas vermelhas no nascer do sol
do seu vestido branco de pregas
o rosto da matriarca desaparecendo em borboletas e covinhas
panapaná, jeito doido de sorrir
nevasca de cinzas nucleares, invernal
e a pele nua, desfolhada em carne-viva
lascas de pastos e morros planificados
urro abafado da chuva de meteoros sem órbita própria
pinacoteca de asas envernizadas
folhas, cílios, unhas, decaimento dos mundos em covas
panapaná, jeito doido de sumir
*
sinos
cachos e novelos sobre o rosto
me aninho junto ao peito do carneiro
e ouço correr seu sangue grosso
seu coração bate gentil mas vigoroso
se há vento frio nas costas das mãos
e um escuro adstringente, contaminante
teço alianças de lã nos meus dez dedos
e ouço o eco tímido do seu balido
esvoaçante pelos terrenos, reabrindo
a nossa coragem como sinos
avisando à onça e à noite
que seguimos vivos.
*
o brasil é um país
o brasil é um país
em que os manos escrevem
in memoriam jhonattan
na parede da escola
como perdoar
você que nos proíbe — embrutece
mundão cinicizante
mas não
eu te amo(, corinthians)
é só o que sou, só assim saberei me relacionar contigo
seios doloridos e tendo que explicar pra minha mãe
porque vou chegar tarde sendo que meu irmão não nem
lava a louça e fez curso de computação enquanto eu não
porque
desce canoa verde pelo rio guaió
uma índia pescadora de tintura vermelha
nas bochechas vermelhas e nos bicos mordidos dos peitos
as três meninas brincam com a flhotinha de gata pintada
na proa
de repente:
um barulho súbito, dois buracos
súbitos na água dos dois lados da canoa
da superfície agora agitada
duas piranhas gigantes saltam
as escamas brilhando como luas de júpiter
as caninas desejosas de cravar
chocando-se ósseas armas amantes
sob o meio-dia, sobre a gargalhada santa das meninas
e o esturro de criança da onça.