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Sérgio Carvalho, diretor da companhia teatral, fala das comemorações, da nova sede e do trabalho constante com a obra de Bertolt Brecht
Por Anselmo Massad
A Companhia do Latão completa dez anos em julho deste ano. Uma programação com lançamento de livros, apresentações de peças de teatro, exibição de vídeos e palestras se estende até outubro. No Teatro da Universidade de São Paulo (Tusp), a última montagem do grupo, Círculo de Giz Caucasiano, fica em cartaz por três meses e quatro oficinas serão organizadas.
Foto: Divulgação
Desde a criação, em 1997, a companhia passou por diversas mudanças. Com a obra do dramaturgo Bertolt Brecht como um dos pilares de ação, o Latão tem hoje sete pessoas na linha de frente, e dezenas de colaboradores mais ou menos frequentes.
Na grade de programação da comemoração, há o lançamento de quatro livros até outubro pela editora Cosac-Naïf com a produção do grupo, além da exibição de vídeos e palestras (veja a íntegra na página do grupo).
Em entrevista à Fórum, Sérgio Carvalho, diretor da Companhia do Latão fala sobre a busca de renovação do grupo, a relação com os movimentos sociais e com a obra de Brecht como método.
Fórum – Chegar a dez anos não é um fato tão comum para companhias de teatro. Como vocês vêem as comemorações?
Sérgio Carvalho – Mais importante do que durar é a Cia do Latão ter conseguido avançar renovando seu projeto artistico, sem correr risco de repetir suas fórmulas ou a si mesmo. É um desafio para qualquer trabalho que dura muito tempo. No caso do Círculo de Giz Caucasiano, a última peça montada, o Latão conseguiu saídas novas e renovar a pesquisa artística. Mais do que comemorar o passado, é abrir um futuro diferente. Para a gente essa data tem um sabor de recomeço.
Fórum – Um dos pontos centrais do trabalho do Latão é o teatro de Bertolt Brecht. Que papel ele tem nesse momento?
Carvalho – Brecht é uma espécie de modelo clássico para a gente. Um grupo interessado em temáticas sociais numa visão crítica e em discutir as contradições da sociedade, acaba tendo no Brecht um modelo exemplar. Mas é modelo, na medida em que precisa ser modificado. Até porque, ele deu respostas à época dele e às condições particulares em que produziu. E conseguimos dialogar com vivacidade e para trabalhar com a obra como fornecedora de processos e não de fórmulas. A gente partilha do método, o que vem sendo reconhecido. Em Berlim, quando estive na casa do Brecht para falar sobre nosso trabalho, a direção da casa considerou muito vivo e até mais dileto e inovador do que ações produzidas na Alemanha.
Foto: Divulgação
Fórum – E como é o papel de movimentos como o MST para o trabalho da companhia?
Carvalho – A Companhia do Latão sempre teve algumas colaborações esporádicas com o MST. Não com o movimento como um todo, mas com algumas frentes. É um grupo ligado ao assentamento Carlos Lamarca, em Sarapuí, com quem a gente colaborou em outras ocasiões com oficinas. No caso, eles participaram da produção de um prólogo novo para a montagem atual do Círculo do Fiz Caucasiano. Agora, com um espaço próprio – alugado (risos), que é uma sede nova, conquistamos mais independência e há a vontade de estabelecer vínculo com movimento mais combativo. Vamos tentar manter mais continuidade.
Fórum – Nas comemorações dos dez anos, há ações de teatro e também muitas ativides de vídeo e cinema. Como é o diálogo entre as linguagens?
Carvalho – Desde a origem do Latão temos o trabalho artístico, teatral e teórico que sempre caminharam juntos, irmanadas na origem. A revista Vintém tem um papel importante na relação com intelectuais. Em uma segunda fase, criamos um diálogo com lideranças de movimentos sociais e grupos mais politizados. Mais recentemente, abrimos uma frente de cinema. A experiência na TV Cultura [no programa "Direções"] tem um papel nisso. Então, são quatro frentes: a produção artistico-teatral, a pesquisa em dramaturgia, os movimentos sociais e a vontade de estudar cinema. Tentamos colocar esses aspectos com uma atividade de cada setor na programação.
Fórum – Antes de ter a sede, onde o Latão produzia?
Carvalho – Temos dez anos, e somos um grupo conhecido em São Paulo e mesmo fora da cidade, pelo país afora, mas as condições reais sempre foram muito precárias. Vivemos de empréstimos de espaços públicos. Então, o Teatro Arena nos foi emprestado por dois anos, depois usamos o Cacilda Becker, além de contar com a amizade de instituições, como o [Instituto] Goethe, que cedia salas de ensaio. Sempre perambulamos por aí. A gente tinha alugado um escritório onde instalamos uma ilha de edição e usávamos como base, agora o novo espaço é um estúdio, onde cabem aulas de teatro, apresentações pequenas, ensaios abertos. Dá para acolher uma exposição, organizar o acervo da memória, dos vídeos. É sair de 60 metros quadrados para 150 (risos). Não é um teatro, é parecido com o que o grupo Bartolomeu tem. A sala de ensaios é boa, permite apresentações mais intimistas, tem escritório, depósito de material. Não precisamos mais pedir emprestado depósito na casa dos amigos. De uma certa forma, é uma profissionalização nossa.