Pacientes com Covid-19, que estavam internados no Hospital da Brigada Militar (HBMPA) de Porto Alegre (RS), foram medicados com proxalutamida, remédio fabricado na China e tratado por Jair Bolsonaro como “a nova cloroquina”.
A questão é que, à época, não havia liberação para importação, por parte da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), e, tampouco, para testá-lo em humanos, de acordo com reportagem de Pedro Nakamura, no site Matinal Jornalismo.
Em um dos casos, uma policial militar, que prefere não revelar o nome, precisou ser encaminhada às pressas para o HBMPA, em março. Ao ser internada, ela afirmou ter sido abordada por dois capitães-médicos. Eles perguntaram se ela aceitaria participar de um “estudo” com um novo medicamento, a proxalutamida, que estava sendo testada contra o coronavírus no hospital.
Ela revelou que, apesar de estar “tonta” e “sem pensar claramente”, por estar com falta de ar, concordou. “Tomei porque quando a gente tá mal, se for para ficar bem, tomamos o que o médico oferecer”.
Na sequência, assinou às pressas uma espécie de termo de consentimento, sem ler direito. A policial relatou que, além de não ter recebido uma cópia, nunca mais viu o documento, o que é um direito seu.
Somente depois de curada, quando já estava em casa, a paciente descobriu, por meio de uma pesquisa na internet, o que era o medicamento.
Assim como ela, cerca de 50 pacientes internados no hospital, em março de 2021, receberam a proxalutamida, conforme o major e médico Christiano Perin, que foi chefe da Unidade de Terapia Intensiva do hospital até 2016.
O medicamento foi administrado sem autorização da Anvisa para ser importado. Além disso, o “estudo” ocorreu no HBMPA sem que tivesse cadastro da instituição na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), responsável por liberar pesquisas clínicas com humanos. O suposto “estudo” também não está registrado na Plataforma Brasil, que concentra todas as pesquisas em seres humanos no país.
Ainda segundo a reportagem, os responsáveis pela “experiência” foram o endocrinologista Flávio Cadegiani e o infectologista Ricardo Zimerman, que atua como terceirizado no hospital desde 2017.
Em maio de 2021, Zimerman foi ouvido na CPI do Genocídio e orientou o uso de medicamentos ineficazes contra a Covid-19, de remédios antiparasitários a antimaláricos. Na oportunidade, ele também defendeu a utilização de antiandrogênicos, como a proxalutamida.
O que é
A proxalutamida inibe os efeitos de hormônios masculinos. Inicialmente, foi criado para tratamento de câncer de próstata e de mama, em estágio avançado. Desde o início da pandemia, especula-se que poderia, também, ter efeitos positivos contra o coronavírus, o que jamais foi comprovado, inclusive em estudos realizados com a droga.