Em uma entrevista nesta terça-feira (10) que deveria esclarecer o procedimento para a suspensão dos estudos clínicos da Coronavac, vacina contra a Covid-19 que está sendo testada no Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) deu informações contraditórias em diferentes momentos. Isso acabou aumentando a confusão que já estava instaurada sobre o assunto.
Por diversas vezes, a diretora Alessandra Bastos disse que a decisão foi tomada porque a agência recebeu do Instituto Butantan, que está testando a vacina no Brasil, informações sem detalhamento, ou “rasas”. Os dados somente dariam conta de que houve um “efeito adverso grave não esperado” em um voluntário. “Diante dessa informação, sem mais detalhes, o protocolo era suspender imediatamente os testes”, afirmou.
O voluntário, soube-se depois, cometeu “suicídio presumido” - ainda sob investigação policial – no dia 30 de outubro. O Butantan disse, em entrevista mais cedo nesta terça, que enviou relatório detalhado à agência durante reunião entre as duas instituições. Alessandra, da Anvisa, negou que isso tivesse ocorrido.
Mas para a retomada dos testes, o diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barras Torres, foi taxativo: as informações terão de circular pelo “canal correto”. E isso significa que o Butantan terá de acionar o comitê internacional independente que analisa os estudos e testes. Uma informação oficial detalhada do instituto, que poderia, pelas declarações iniciais da diretoria da Anvisa, ter evitado a suspensão do estudo já não basta.
“Precisamos que nos abasteçam com mais informações, que invoquem o comitê internacional”, disse Barras. Médico e almirante da Marinha, ele foi indicado por Jair Bolsonaro (sem partido) para assumir a direção geral da agência. Barras esteve ao lado do presidente em um ato em frente ao Palácio do Planalto que reuniu centenas de apoiadores do político, em março.
Caso Oxford sem suspensão
Por mais de uma vez, os jornalistas questionaram por que houve, no caso de morte ocorrido com um voluntário dos testes da vacina desenvolvida pela Universidade Oxford / laboratório AstraZenica, uma decisão diferente da tomada em relação à Coronavac.
Enquanto a primeira é a “preferida” de Bolsonaro entre as que estão sendo testadas em voluntários no país, a segunda é “apadrinhada” pelo governador de São Paulo, João Doria (PSDB), ex-aliado e agora adversário político do presidente. A diferença de posição nos dois casos suscitou desconfiança sobre se há ou não influência política sobre a agência, o que os diretores negaram em diversos momentos da entrevista.
Barras Torres disse que, naquele caso, a comunicação à Anvisa foi feita pelo comitê independente internacional, e já veio com a observação de que não seria necessário interromper os estudos. “[A informação no caso Oxford] Veio pelo canal correto, de quem tem competência para falar”, disse o almirante.
“Não veio pelo presidente da Oxford, pelo diretor da Fiocruz”, completou. Essa dose está sendo testada no Brasil em parceria com a Fiocruz, que deverá produzi-la no país.
Os integrantes desse comitê têm acesso a todos os dados de estudos de vacinas internacionais, inclusive sobre quem recebeu a dose válida e quem recebeu placebo.
Essa foi a explicação da Anvisa para as diferentes posições em casos aparentemente iguais. “Não são iguais”, disse a diretora Alessandra.