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[caption id="attachment_165957" align="alignnone" width="700"] Foto: Valter Campanato/Agência Brasil[/caption]
Não existe ser mais ridículo que o famoso pastor bolsonarista. Enquanto o ministro da Educação “só” teve a coragem de chamar os brasileiros de canibais, estava tudo certo, mas quando Mourão disse que a mulher tem direito de decidir sobre o aborto, ele se desesperou. Logo gravou um vídeo no qual descarregava toda a sua ira, bravejando “esquerdopatas” e “politicamente correto”.
Entendo que seja parte da religião do famigerado pastor a aversão ao aborto, o que não justifica seu modo de falar ofensivo e sem nenhuma base científica, embora, ignorante, todo mundo tem o direito de ser.
Mais preocupado com a moral dos brasileiros que com a dignidade destes, não se importou quando Ricardo Vélez chamou os brasileiros de ladrões e mal-educados. Os dois fazem parte da mesma corrente de pensamento, a que se propõe a acabar com o viés ideológico de esquerda. Mas, para tal, dedicam-se em humilhar os outros, um a esquerda e o outro o brasileiro.
E, curiosamente, os dois estão preocupados em humilhar a classe média que, por sua vez, elegeu esse governo. Pois o brasileiro que viaja não é o que mora na periferia. Viajar é um privilégio no Brasil.
Assim como o brasileiro, que está na luta pela defesa do aborto e de outras pautas do “politicamente correto” defendida pelos “esquerdopatas”, pertence aos setores progressistas da classe média; um exemplo claro é a classe artística.
É certo que grande parte do primeiro grupo ajudou a eleger esse governo, já o segundo que, devido a algumas declarações cativantes, pode preferir Mourão a Bolsonaro (uma aspiração da Globo). O governo está realizando um jogo de poder muito interessante, o qual busca aliciar setores tanto conservadores quanto progressistas.
Esse suposto imbróglio tem como objetivo evidenciar formas de desenvolvimento do capitalismo. Os dois apoiam o mesmo projeto econômico, mas não agradam todos os setores da classe média em termos ideológicos. Essa farsa, essa suposta divergência, vem para acariciar tais setores e deixar a classe trabalhadora desamparada. Investe-se na ilusão de um lado para fazer com que não se lute pelas questões materiais de existência. Porque se não houvesse essas ideias, os trabalhadores só teriam a sua própria realidade para refletir, o que levaria a uma ruptura no modo de produção capitalista. Esconde-se a relação capital/trabalho para trazer à tona o conflito superficial entre progressistas e conservadores.
Eu fico imaginando a grande gargalhada que Mourão deve ter dado ao ver (se viu) o comentário do pastor da Assembleia de Deus. Este, versado na retórica da intransigência, na qual, desde o século XIX, conservadores e progressistas municiam-se para denegrir a imagem dos seus opositores, investe com ardor na perversidade, forçando a ideia de que o outro é maligno por ameaçar a tradição. A cena que o pastor fez deve ter tirado muitos risos do vice-presidente.
Mas a questão é que se trata de uma rixa para nos fazer de otários. Um pró-aborto, outro pró-vida, mas o fato mais importante é que ambos são pró-mercado. Toda a discussão é para deixar as coisas no mesmo lugar. Como no conto de Alice no País das Maravilhas onde é recomendado correr depressa para não sair do lugar. São formas de manutenção do capitalismo. A burguesia tem várias formas de se fortalecer, de encontrar remédios para manter a sua posição tradicional: Obama e Trump, Sarkozy e Hollande, Lula e Bolsonaro. Hoje presenciamos mais uma etapa dessa farsa toda.
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