O Ministério Público de Santa Catarina acusa a prefeitura de Balneário Camboriú, no litoral norte do estado, de estar promovendo uma verdadeira limpeza social no município através do seu programa “Clínica Social”, que promoveria desde internações forçadas mediante diagnósticos dirigidos até a expulsão à força, conduzida pela Guarda Civil Metropolitana, da população em situação de rua.
De acordo com o MP, as pessoas seriam recolhidas das ruas da cidade durante a noite para passarem toda a madrugada sob a vigilância de guardas armados e obrigadas a assistirem palestras de agentes de segurança para, por fim, passarem por avaliação médica com um médico ortopedista – especialização que não teria uma formação completa para avaliar um quadro de saúde mais amplo.
Te podría interesar
Ajude a financiar o documentário da Fórum Filmes sobre os atos golpistas de 8 de janeiro. Clique em https://bit.ly/doc8dejaneiro e escolha o valor que puder ou faça uma doação pela nossa chave: pix@revistaforum.com.br.
O promotor Álvaro Pereira Oliveira Melo, da 6ª Promotoria de Justiça de Balneário Camboriú, aponta que os recolhimentos são feitos de noite por conta de uma incidência do uso de drogas nos horários correspondentes. De acordo com sua leitura, a retirada dos usuários e a posterior permanência forçada na chamada ‘Clínica Social’ despertaria gatilhos, sobretudo por conta da abstinência, que direcionariam os 'diagnósticos' do ortopedista.
Te podría interesar
“Isto facilitaria a ‘avaliação médica’ para internações compulsórias, em conduta que pode caracterizar crime de cárcere privado e tortura”, diz o procurador. Além das internações compulsórias, outros cidadãos capturados seriam expulsos à força da cidade pela Guarda Municipal, em muitas ocasiões com o uso de algemas. “A cidade está de portas abertas para todo o Brasil, quiçá o mundo, menos para determinados grupos que possam 'manchar' o cartão postal dela”, criticou.
Como uma medida que visa combater a situação denunciada, o Ministério Público entrou com pedido de liminar que prevê a suspensão da ‘Clínica Social’. Os promotores alegam que a própria abordagem da Guarda Municipal – direta e ostensiva – é inconstitucional. Ao contrário, tal abordagem deveria ser realizada por assistentes sociais e agentes de saúde, ou seja, pessoas qualificadas para realizar tal atendimento.
De acordo com o promotor, o serviço expressa um forte preconceito contra este setor da população. “A mera situação de rua não serve como indicativo do uso e dependência química de entorpecentes que justifique qualquer medida compulsória. Além disso, a cidade já dispõe de estrutura para encaminhamento de usuários de drogas, como o CAPS, CRAs, CREAs e outros”, afirma.
Outro lado
A prefeitura de Balneário Camboriú nega as acusações e afirma que não há queixas registradas contra as práticas do serviço. Em nota enviada ao G1, a Secretaria de Desenvolvimento e Inclusão Social da cidade busca esclarecer 5 pontos.
O primeiro, que a Clínica Social seria um serviço que busca oferecer atendimento humanitário 24 horas por dia, por isso as abordagens de madrugada, e que recolhe apenas aqueles que aceitam receber o atendimento. Em segundo lugar declara que até o momento não recebeu nenhum boletim de ocorrência ou denúncia sobre eventuais excessos.
Em seguida, afirma que a atuação da Guarda Municipal se dá no âmbito do apoio às equipes de assistência social e que abordagens podem ser realizadas após denúncias da população e durante rondas.
O quarto ponto levantado diz que a equipe é multidisciplinar e qualificada, ao contrário do que denuncia o MP. Por fim, declarou que assim que a prefeitura receber a ação proposta pelo MP, irá apresentar os devidos esclarecimentos.
De acordo com a prefeitura de Balneário Camboriú, a Clínica Social começou suas atividades em janeiro deste ano e, desde então, já atendeu 603 pessoas. Dessas, 157 teriam retornado às suas cidades e regiões de origem e 42 teriam aceitado a internação para tratar a dependência química.