As operações policiais realizadas nesta sexta (25) em comunidades do Rio de Janeiro e Niterói já tiraram a vida de ao menos 14 pessoas e provocaram fechamento de 40 escolas, além de postos de saúde nas comunidades. Na Maré, moradores protestaram e imprensa da comunidade informa que ações violam decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).
O perfil no Instagram do veículo de imprensa comunitária independente “Maré de Notícias” deu detalhes sobre a ação no Complexo da Maré, comunidade da capital, criticando a truculência. Em uma postagem, afirmam que a operação “chama atenção mais uma vez e marca o conjunto de favelas pela quantidade e intensidade de ações truculentas, mortes e violência com moradores”.
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Violações
Iniciada às 4h da manhã, o relato informa que por volta das 22h ainda havia caveirão e policiais circulando pela região. De acordo com o veículo, a operação conjunta das Polícias Civil e Militar descumpre os dispositivos jurídicos da ADPF 635/2019 sobre o seu horário de início. Como a investida se estendeu, o horário de fim também viola um pedido aprovado pelo STF sobre operações noturnas. Outra ilegalidade apontada pelos moradores da Maré é a ausência de ambulâncias no entorno durante a operação, outra decisão descumprida.
Embora tenha afetado diversas favelas do conjunto, os principais focos de violência ocorreram no Parque União, que contabilizou ao menos três mortes, e na Nova Holanda, onde agentes policiais teriam jogado bombas de efeito moral nos moradores e onde uma pessoa foi baleada.
Vítimas
Renan de Souza Lemos, 24, foi alvejado durante a ação, morreu e seu corpo foi retirado da comunidade por parentes. Pai de dois filhos pequenos, a vítima trabalhava como motorista de aplicativo e entregador. De acordo com reportagem da Folhapress, a Delegacia de Homicídios da Capital instaurou inquérito para apurar as circunstâncias da morte.
Houve mais quatro mortes. A PM acusa todos de serem suspeitos e registra que um policial do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) também foi ferido na barriga e levado para o hospital. Seu estado de saúde é estável.
Protesto
Com o objetivo de "coibir movimentações criminosas relacionadas a roubo de carga e roubo de veículos", a ação da polícia foi questionada por moradores, que, em protesto, atearam fogo em pneus, colchões e pedaços d e madeira em ponto da avenida Brasil próximo ao complexo. A revolta foi contida com mais truculência: balas de borracha e bombas de efeito moral foram usados por agentes do Batalhão de Choque e da PM. “Segundo a polícia, houve a apreensão de cerca de uma tonelada de drogas e de oito carros roubados. Não há informações sobre prisões”, informa a Folhapress.
Confira o vídeo do protesto reprimido pela PM:
Síndrome do cabrito
Crítica à forma como são conduzidas as operações policiais, a professora do curso de Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense (UFF) Jaqueline Muniz, apelidou as repetidas operações de "síndrome do cabrito". "O policial convive com a síndrome do cabrito: o sobe e desce morro, tiro para lá e para cá, com exagero do saldo operacional", disse em entrevista concedida ao The Intercept Brasil em fevereiro deste ano.
Muniz explica que as operações não poderiam resultar em número alto de mortes, como normalmente ocorre. Ela afirma que "a polícia tem o controle tático quando ela organiza uma operação. Ela tem a prerrogativa do agir, a proatividade na construção daquele cenário. Sendo assim, cai deliberadamente o risco de vitimização e deveria cair o risco de letalidade, né? Toda operação tem de ser programada ou emergencial para atendimento da população a partir de padrão táticos, previamente estabelecidos, profissionais. Quando você coloca na mesma frase “a polícia que mais mata e mais morre”, cria a ilusão de que você tá num bang-bang, com tiro de lá, tiro de cá. Não é verdade. A polícia tem tiro certo".
Ação no Juramento
Também na cidade do Rio de Janeiro, no bairro Vicente de Carvalho, o Morro do Juramento também foi alvo de operação, que ceifou a vida de ao menos seis pessoas. Novamente, a Polícia Militar afirma que todos eram suspeitos e foram mortos em confronto com os agentes. Também neste caso um policial militar saiu ferido, alvejado em uma das mãos.
As informações da Polícia Militar neste caso se misturam. Ao mesmo tempo em que a corporação informa que a ação visava "reprimir o tráfico de drogas e as ações de criminosos no entorno da comunidade", explica que o confronto teria se sucedido a um ataque realizado por homens armados contra agentes do 41° BPM, de Irajá.
"Após o cessar dos disparos todos foram socorridos para o Hospital Estadual Getúlio Vargas, na Penha. Cinco deles não resistiram aos ferimentos. Um outro suspeito internado sob custódia", informou a PM. Uma sexta pessoa, que foi considerada suspeita, também morreu. Foram apreendidos um fuzil, quatro pistolas, uma granada e drogas.
Perseguição
No caso da Zona Oeste, as operações tiveram início em função de um incidente. O policial militar Luiz Carlos da Silva foi alvejado após ter entrado por engano em uma comunidade nesta quinta (24). O subtenente chegou a reagir, mas foi atingido e não resistiu.
A Polícia Militar realizou, então, operações nas comunidades do Complexo de Senador Camará, Vila Aliança, Batan e 48 em busca dos criminosos. Um homem suspeito de ser o autor do tiro que matou o policial foi preso. O suspeito teria confessado que atirou contra o carro do agente e a arma do oficial foi recuperada com ele. A PM informa ainda que armas e drogas foram apreendidas.
Em direção aos disparos
No Morro do Estado, em Niterói, uma outra ação da PM deixou três mortos e dois feridos, também nesta sexta (25). De acordo com a corporação, agentes foram informados sobre disparos de armas de fogo na comunidade enquanto faziam patrulhamento na região. Os policiais foram então na direção indicada e se depararam com homens armados, dando início ao tiroteio que resultou em três vítimas letais e mais duas pessoas hospitalizadas. Na ação foram apreendidos um fuzil, três pistolas, drogas e um radiocomunicador.