Enquanto sindicatos e movimentos sociais marcham pelas ruas neste Dia do Trabalhador, a Igreja Católica celebra uma figura que há séculos simboliza a dignidade do trabalho: São José Operário. Declarado padroeiro dos trabalhadores pelo Papa Pio XII em 1955, o carpinteiro de Nazaré – homem simples, mas central na história cristã – tornou-se um elo entre a espiritualidade e a luta por direitos trabalhistas. Mas por que ele, e não outro santo, ganhou esse título? E como sua história ressoa em um mundo de precarização e revolução tecnológica?
Um trabalhador no centro da Sagrada Família
Diferentemente de muitos santos cercados por narrativas de "milagres espetaculares", São José é lembrado por algo mais cotidiano: seu ofício. Os Evangelhos não detalham sua vida, mas o citam como tekton – termo grego que pode significar carpinteiro, artesão ou construtor. Na Palestina do século I, esse era um trabalho árduo, mas fundamental.
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"José não era um rei ou um sacerdote; era um homem que suava para sustentar sua família", explica o teólogo Pe. João Carlos Almeida, professor da PUC-SP. "Isso o torna profundamente identificável para milhões de trabalhadores".
A devoção a José ganhou força no século XIX, quando a Revolução Industrial transformou o trabalho em exploração de massa. Em 1870, o papa Pio IX o declarou Padroeiro Universal da Igreja, mas foi só em 1955 que o papa Pio XII oficializou sua ligação direta com os trabalhadores, instituindo a festa de São José Operário em 1.º de Maio.
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Por que 1º de Maio? Uma estratégia pastoral
A data já era marcada por protestos operários desde o final do século XIX, especialmente após a greve de Chicago de 1886, que terminou em forte repressão. Ao vincular São José ao dia, a Igreja buscava cristianizar uma pauta social sem abrir mão de sua mensagem.
"Era um modo de dizer: 'Sim, lutem por justiça, mas lembrem-se de que o trabalho também é vocação'", analisa a historiadora Maria Emília Prado, autora de "Fé e Fábricas: A Igreja e o Movimento Operário".
O gesto não foi apenas simbólico. Na encíclica Laborem Exercens (1981), o papa João Paulo II reforçou: "O trabalho é uma participação na obra de Deus", ideia que ecoa a imagem de José ensinando Jesus a lidar com madeira e ferramentas.
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São José na era dos entregadores por app e home office
Se no século XX o santo era invocado por operários de fábricas, hoje sua devoção volta-se para novas realidades do mundo do trabalho. No Brasil, onde cerca de 40% da força trabalhadora encontra-se na informalidade, padres relatam que fiéis pedem sua intercessão por emprego estável e melhores condições.
"Vemos motoboys, diaristas e até profissionais de TI acendendo velas para São José", conta o Pe. Marcos André, vigário da Paróquia São José Operário em São Paulo. "Ele virou um símbolo de resistência."
Celebrações pelo Brasil
Neste 1º de maio, dioceses de todo o país realizam missas especiais e feiras de emprego. Em Contagem (MG), a tradicional procissão dos trabalhadores reúne milhares de pessoas. Já no Rio, o Centro de Apoio ao Trabalhador da Arquidiocese oferece cursos gratuitos – uma herança prática da espiritualidade josefina.