FAKE NEWS LIBERADA

MPF vai para cima da Meta após Zuckerberg sugerir desrespeito à Justiça brasileira

Dono do grupo que controla Facebook, Instagram e WhatsApp anunciou fim do sistema de checagem de informações e falou em "tribunais secretos" da América Latina

MPF oficia Meta após anúncio de Zuckerberg.Mark Zuckerberg, dono da MetaCréditos: Reuters/Folhapress
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O Ministério Público Federal (MPF) decidiu oficiar a Meta, empresa que controla as redes Facebook, Instagram, Whatsapp e Threads, após o anúncio feito nesta terça-feira (7) pelo dono da big tech, Mark Zuckerberg, informando que acabará com o sistema de checagem de informações em suas plataformas. 

Segundo Zuckerberg, o sistema de checagem, que tinha como objetivo impedir a circulação de notícias falsas na plataforma, será substituído pelas "notas da comunidade", ferramenta similar à utilizada pelo X, rede social do bilionário Elon Musk. O recuso permite que a moderação de conteúdo seja feita pelos próprios usuários, e não mais por profissionais de checagem de fatos. 

Em seu pronunciamento, Zuckerberg afirmou que "os checadores de fatos são muito enviesados politicamente e destruíram mais a confiança [das pessoas] do que a criaram, especialmente nos EUA”. Ele ainda acrescentou que o  objetivo do fim da checagem de fatos é ‘reduzir erros’ e restaurar a ‘liberdade de expressão’.

Na prática, Zuckerberg anunciou a liberação total das fake news em suas redes sociais, o que pode trazer consequências gravíssimas, e demonstrou estar alinhado ao presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, sinalizando uma ofensiva contra países que buscam regular o ambiente digital. 

No ofício, que será enviado à Meta no âmbito de um inquérito civil que tramita desde 2021 e que apura a responsabilidade das big techs nos conteúdos postados por usuários, o MPF questionará se a empresa também colocará fim ao sistema de checagem de fatos em suas redes sociais no Brasil e quais serão os impactos dessas medidas. 

A medida do MPF é tomada em meio à sinalização de Mark Zuckerberg de que desrespeitará a Justiça brasileira, tal como faz Elon Musk, dono do X (antigo Twitter). Em seu anúncio, o dono da Meta, apesar de não ter citado o Brasil, disse que “os países da América Latina têm tribunais secretos que podem ordenar que as empresas derrubem coisas silenciosamente”. 

Governo Lula se manifesta 

O anúncio feito nesta terça-feira (7) por Mark Zuckerberg sobre o fim do sistema de checagem de fatos pela Meta antecipa o início da nova era Trump e explicita aliança da empresa com o governo dos EUA.

Essa é a avaliação do secretário de Políticas Digitais da Secom do governo Lula, João Brant. Pelas redes sociais, ele avalia que a medida anunciada pelo dono da Meta, empresa que controla o Facebook, o Instagram e o WhatsApp, sinaliza um enfrentamento à União Europeia, ao Brasil e a outros países que buscam proteger direitos no ambiente online, que na visão de Zuckerberg, são os que ‘promovem censura’.

"É uma declaração fortíssima, que se refere ao STF como ‘corte secreta’, ataca os checadores de fatos (dizendo que eles ‘mais destruíram do que construíram confiança’) e questiona o viés da própria equipe de ‘trust and safety’ da Meta – para fugir da lei da Califórnia", escreve.

Brant comenta ainda que o dono das plataformas também anuncia que vai desligar parte dos filtros que identificam violações às políticas da plataforma – especialmente sobre imigração e sobre gênero. Vai ainda reforçar o ‘conteúdo cívico’ nas plataformas, o que sinaliza que topa servir de plataforma à agenda de Trump.

"Facebook e Instagram vão se tornar plataformas que vão dar total peso à liberdade de expressão individual e deixar de proteger outros direitos individuais e coletivos. A repriorização do ‘discurso cívico’ significa um convite para o ativismo da extrema direita", alerta.

O secretário adverte ainda que a Meta vai atuar politicamente no âmbito internacional de forma articulada com o Governo Trump para combater políticas da Europa, do Brasil e de outros países que buscam equilibrar direitos no ambiente online.

A declaração é explícita, afirma Brant, e sinaliza que a empresa não aceita a soberania dos países sobre o funcionamento do ambiente digital e soa como antecipação de ações que serão tomadas pelo governo Trump.

"Meta vai asfixiar financeiramente as empresas de checagem de fatos, o que vai afetar as operações delas dentro e fora das plataformas. O anúncio só reforça a relevância das ações em curso na Europa, no Brasil e na Austrália, envolvendo os três poderes", constata.

Brant afirma também que a decisão da Meta amplia a centralidade dos esforços internacionais feitos no âmbito da ONU, UNESCO, G20 e da OCDE para reforçar a agenda de promoção da integridade da informação.

Manuela D'ávila alerta para perigo da medida da Meta

A ex-deputada federal Manuela D'Ávila também alerta para os perigos da decisão do dono da Meta. Em postagem no Instagram ela avalia não se tratar de um mero anúncio de uma nova política de moderação de conteúdo da empresa Meta.

"O que ele anuncia é um dos maiores fatos políticos - senão o maior - desse tempo em que vivemos", escreve.

D'Ávila comenta que pesquisa no doutorado as políticas de regulação da internet no mundo e a relação disso com as ideias de liberdade nos Estados Unidos.

"O que Zuckerberg diz, com todas as letras, é que a liberdade defendida pela extrema direita, as ideias de Trump e Musk, serão as suas e de sua empresa. Ideias que ameaçam instituições e democracias. Ideias de violência e tortura", adverte.

Ela pondera que, para isso, o dono da Meta vai operar em parceria explícita com o governo dos Estados Unidos e trazer à tona o velho excepcionalismo estadunidense: a ideia de um povo predestinado a salvar todos os povos.

"O custo disso testemunhamos com as guerras promovidas por esse Império, o que mais guerreou da história", constata.

Manu afirma que o anúncio soa mesmo como uma declaração de guerra ao mundo. Ela cita que Zuckerberg menciona China e América Latina e, ao se referir a regulação europeia, refere-se à Alemanha, protagonista da construção da regulação daquela região.

"Ao mencionar o X como sua referência, ele menciona a rede cujo proprietário opera direta e explicitamente ameaças a vida democrática de diversas regiões do planeta", observa.

A ex-parlamentar classifica o anúncio do dono da Meta com um "fato imenso" e que seria um equívoco enquadrar a medida no  âmbito da 'internet'. Disse ainda não se tratar de algo afeito à comunicação ou moderação de conteúdo e que não deve ser subestimado sob a crença de que pode ser resolvido pelas secretarias de comunicação dos governos.

"Essa é a agenda central da geopolítica do nosso tempo. Só uma resposta institucional organizada poderá nos permitir enfrentar essa ameaça", finaliza.

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