A indústria bélica Taurus teria enganado voluntários socorristas, utilizando o pretexto de que precisava deles para resgatar crianças ilhadas por conta das brutais chuvas que devastaram o Rio Grande do Sul nas últimas semanas, para na verdade levar o grupo a uma perigosa e arriscada operação de remoção de uma carga com 3,5 mil fuzis e pistolas que estava armazenada num galpão do Aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre, e que era visada pelo crime organizado. A informação é do portal de notícias gaúcho ABC Mais, que entrevistou as pessoas que teriam sido ludibriadas no episódio.
“Nos enganaram, pois fomos chamados para resgatar crianças e acabamos virando escudo humano”, contou à publicação gaúcha o investidor Nicolas Vedovatto, 26 anos. Uma médica de 31 anos, que pediu para não se identificar, integrante do grupo, afirmou também à reportagem local que “se sentiu coagida”. Esses socorristas, que saíram do Litoral Norte do Rio Grande do Sul para ajudas nas operações de buscas na capital e área metropolitana, disseram que se tornaram “conhecidos” pelo trabalho que vinham realizando em meio à catástrofe, ocasião em que um homem teria surgido num grupo de aplicativo de mensagem pedindo os serviços voluntários deles para salvar as tais crianças. Ainda sem saber a verdade e a caminho do local onde estavam as armas, uma mulher que se identificou com um crachá da Taurus resolveu explicar o que era de fato a “missão”, e argumentou que o trabalho “era tão importante quanto resgatar crianças” já que “evitaria que as armas caíssem nas mãos de criminosos”.
“Recebi mensagem de um desconhecido, com entonação forte, dizendo que tinha uma demanda urgente de resgate de crianças. Era uma missão prioritária. Aquilo me comoveu muito. Logo me coloquei à disposição”, começou contando o investidor ao ABC Mais. Só que a história foi mudando.
“Trabalho na Taurus. O resgate que vocês vão fazer não é mais de crianças, e sim de armas”, disse a tal funcionária da indústria bélica, segundo os denunciantes. “Travei. Disse que não iria. Ela argumentou que precisava de civis e que haveria policiais à paisana. Pedimos identificação e ela nos mostrou uma carteira de trabalho da Taurus... Daí a mulher disse que era tão importante quanto salvar crianças, pois evitaria que armas fossem parar nas mãos de bandidos”, contou a médica que era parte da “equipe” informal de socorristas.
A operação de retiradas das armas teve a participação da Polícia Federal, que empregou até o Comando de Operações Táticas (COT) na arriscada tarefa, agentes fortemente armados e muitos atiradores de elite. No entanto, usar civis sem qualquer experiência numa ação do tipo é o que parece mais estranho. A remoção das armas do Aeroporto Internacional Salgado Filho teve ampla cobertura da imprensa e virou até matéria especial no dominical Fantástico, da TV Globo.
“Dias depois, nos deparamos com uma reportagem no Fantástico, onde aparecemos fazendo o transporte como se fôssemos policiais de elite. Ainda vimos, em vários sites, que essas armas eram cobiçadas por facções. E nós lá, tirando elas. Estamos assustados e muito preocupados”, contou Vedovatto. Ele diz que sentiu usado pela empresa de armas e que virou motivo de gozação depois da tarefa que se viu obrigado a realizar.
“Eu desconversava e tinha que lidar com gozações, porque as pessoas viram meu vídeo com pedido de ajuda para resgate das crianças e não ouviram mais nada a respeito. Mesmo tendo sido feito de bobo por uma empresa que ignorou os protocolos de segurança e nos expôs a risco extremo, eu não falava sobre as armas. Despistava, mesmo com as piadas”, acrescentou o Investidor à reportagem do ABC Mais.
Taurus assumiu que mulher é funcionária da empresa
Em nota, de acordo com o portal autor da reportagem, a Taurus confirmou que a tal mulher que recrutou os socorristas é uma de suas funcionárias, mas disse não saber quem seria o homem que iniciou o contato com o grupo.
“A Taurus é uma Empresa Estratégica de Defesa, credenciada pelo Ministério da Defesa, atua há 85 anos de acordo com as diretrizes legais e regulatórias, e esclarece que a operação de retirada das armas no aeroporto foi coordenada na parte fluvial pelo Comando de Operações Táticas da Polícia Federal (COT) e na parte terrestre com veículo de transportadora credenciada pelo Exército Brasileiro, escoltada por dois veículos de segurança privada armados e acompanhada por três viaturas da Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE) da Policia Civil do Rio Grande do Sul. A conferência e manuseio das armas foram feitas por 12 funcionários da Taurus, da área de logística, devidamente capacitados”, diz o comunicado da indústria bélica.
PF explicou que responsabilidade por arranjar equipe era da Taurus
“A retirada das armas que estavam depositadas no Aeroporto Internacional Salgado Filho foi coordenada pela Polícia Federal, por meio do Comando de Operações Táticas (COT), grupo especializado em situações de risco, em articulação com a Fraport, administradora do Aeroporto Internacional Salgado Filho, e com a empresa proprietária da carga, sendo esses, exclusivamente, os participantes envolvidos com a logística de remoção do armamento”, disse a PF em nota à ABC Mais.
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