Domingos Brazão, o conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro apontado por Ronnie Lessa e pela Polícia Federal como um dos mandantes do assassinato de Marielle Franco, gozou de significativo enriquecimento desde 1996, quando entrou para a política como vereador carioca. É o que aponta o relatório final da PF sobre a sua participação no crime de 14 de março de 2018.
O período em que mais enriqueceu vai de 2002 a 2010, quando se consolidou como deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, a Alerj. Nesse intervalo, seu patrimônio que era avaliado em R$ 209 mil cresce 2300%, até chegar na cifra dos R$ 5 milhões – os dados foram revelados pelo jornal O Globo. Os valores não estão corrigidos pela inflação, o que pode conferir números ainda mais altos ao montante.
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Brazão foi eleito vereador do Rio em 1996 e seu mandato durou entre 1997 e 1999. Entre 1999 e 2015 foi deputado estadual pelo RJ para, logo em seguida, conseguir o cargo de conselheiro do TCE-RJ.
Entre 2006 e 2010, seu crescimento patrimonial esteve na ordem de 300%. No primeiro ano desse intervalo ele comprou 4 lotes de terra e dois apartamentos em locais diferentes. O imóvel mais caro foi um apartamento na Barra da Tijuca que custou R$ 196 mil.
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Quatro anos depois, ele declarou três terrenos, uma casa e um apartamento. Este último, também na Barra da Tijuca e avaliado em R$ 2 milhões, era o mais valioso entre os seus bens no ano de 2010. A PF usa essas informações para informar que a família Brazão é um típico caso em que a evolução patrimonial de um indivíduo ou família coincide com sua atuação política.
A vida financeira de Brazão foi totalmente descrita no relatório. E há algumas histórias bastante curiosas que podem ligá-lo a outros crimes.
Em 1993 ele já tinha aberto Sangue Bom Autopeças Ltda. Naquele ano mudou o contrato social da firma, que deixou de ser uma oficina mecânica para tornar-se uma loja de veículos novos, seminovos e sinistrados. Um mês depois de ser encerrada, em abril de 2005, e novamente em novembro do mesmo ano, houve denúncias de que havia um desmanche de carros roubados no endereço que a empresa funcionava. Dois anos depois ele foi multado em R$ 130 mil pela Receita Federal.
Quem é Domingos Brazão
Brazão é desses políticos que completam a cartela do bingo, com acusações de corrupção, fraude, improbidade administrativa, compra de votos e até homicídio.
A ex-Procuradora Geral da República Raquel Dodge o acusou formalmente de participação no assassinato de Marielle afirmando que "Domingos Brazão arquitetou o crime de homicídio contra a vereadora Marielle Franco". Agora está definitivamente apontado como mandante do crime através da delação premiada de Ronnie Lessa, o executor. Sua defesa diz que ele é inocente.
Líder do clã Brazão
Segundo investigações da Polícia Civil e do próprio Ministério Público do Rio, a família Brazão é um importante grupo político do Rio de Janeiro. O clã é suspeito de ligações com a milícia de Rio das Pedras e também com o Escritório do Crime.
Além do líder, Domingos, o clã é composto pelo deputado estadual Manoel Inácio Brazão, mais conhecido como Pedro Brazão, e Chiquinho, colega de Marielle na Câmara na época do assassinato.
Passaportes diplomáticos recebidos de Jair
João Vitor Moraes Brazão e Dalila Maria de Moraes Brazão, filho e esposa do deputado federal Chiquinho Brazão (Avante-RJ), receberam do Itamaraty, durante o governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL), o passaporte diplomático em 9 de julho de 2019.
Segundo matéria do Brasil de Fato da época, o parlamentar, que também possui o documento, é irmão de Domingos Inácio Brazão, apontado por Elcio de Queiroz e confirmado por Ronnie Lessa, como mandante do assassinato da ex-vereadora Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes.
Domingos era, na época, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), foi acusado de obstruir as investigações sobre o assassinato de Marielle, ocorrido em março de 2018, e suspeito de ser num dos mandantes do crime.
Os integrantes da família Brazão estão em uma lista com os 1694 passaportes diplomáticos emitidos pelo governo Jair Bolsonaro (PSL) até 15 de agosto daquele ano. O Brasil de Fato teve acesso à distribuição dos passaportes por meio da Lei de Acesso à Informação.
Elos com Flávio Bolsonaro
Os passaportes diplomáticos dados por Jair Bolsonaro (PL) à esposa e ao filho do deputado federal Chiquinho Brazão (União) é apenas um dos laços que ligam as duas famílias, que têm laços históricos com a milícia que atua na região de Rio das Pedras, na zona Oeste do Rio de Janeiro.
Mas a relação de parceria vem desde os tempos de Alerj, quando Domingos e Flávio Bolsonaro formaram elos entre si. Domingos Brazão atuou em dobradinha com Flávio Bolsonaro (PL-RJ) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), a quem tinha como uma espécie de pupilo.
"Vossa excelência é um deputado jovem e, mesmo assim, percebe-se, não somente pelas suas afirmações de hoje, mas pela sua postura em plenário, que vossa excelência procura preservar o que há de melhor, a maior instituição, que é a família. Infelizmente, há aqueles que apostam no contrário. Vejo parlamentares apresentarem projetos que visam liberar casamento de homem com homem, mulher com mulher e outras coisas. V.Exa., embora sendo jovem, ainda mantém essa postura firme, que, com certeza, é fruto da educação de seus pais, uma questão de criação", disse Brazão dirigindo-se a Flávio Bolsonaro na sessão de 4 de março de 2006 da Alerj.
O elogio ocorreu após o filho de Bolsonaro elogiar o projeto de Brazão para conceder o título de cidadão ao pastor Sebastião Ferreira, da Primeira Igreja Batista de Vila da Penha, que morreu em 2017.
A dobradinha entre Brazão e Flávio Bolsonaro se deu em diversas propostas na Alerj. Em 2014, Brazão foi o relator do projeto de Flávio para criar o programa Escola Sem Partido no sistema de ensino fluminense. No mesmo ano, os dois atuaram juntos na Comissão de Constituição e Justiça da casa.
Milícia e escritório do crime
Além das pautas de costumes, Flávio Bolsonaro e Domingos Brazão faziam dobradinha na defesa das milícias do Rio de Janeiro. Em 2006, quando Marcelo Freixo criou a CPI das Milícias, somente os dois se posicionaram contra.
Delator de Brazão, Ronnie Lessa morava a cerca de 100 metros da residência do clã Bolsonaro no condomínio Vivendas da Barra. Em "A República das Milícias", o escritor Bruno Paes Manso diz que Lessa era "um matador avulso, mas mantinha contatos com o Escritório do Crime e com milicianos de Muzema, ligados ao capitão Adriano".
No livro, o jornalista ainda fala da relação de Lessa "com figurões, como Rogério de Andrade e Domingos Brazão"
"Capitão Adriano", a que se referia, é Adriano da Nóbrega, que comandava o Escritório do Crime e empregou a mãe, Raimunda Veras Magalhães, e a ex-esposa, Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega, no gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj. Segundo MP-RJ, as duas faziam parte do esquema de "rachadinha" no gabinete.
Morto em 2020, o miliciano foi apresentado ao clã Bolsonaro por Fabrício Queiroz, que também tem ligações com a milícia de Rio das Pedras.
Durante as investigações sobre a morte de Marielle, o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) apreendeu uma agenda com a esposa de Queiroz, Márcia Oliveira de Aguiar.
Na agenda-guia, que deveria ser usada por Márcia para ajudar a família caso Queiroz você detido, há um coronel identificado como amigo de Queiroz e "braço direito do Bração (sic)", uma possível referência a Domingos Brazão.
Na caderneta ainda haviam nomes de pessoas ligados ao clã Bolsonaro e também a Adriano da Nóbrega.
Outro elo entre Flávio e Brazão, que faziam parte da bancada da "segurança pública" na Alerj, é ex-assistente de câmera Luciano Silva de Souza.
Souza foi colocado em 2019 pelo padrinho, Domingos Brazão, o cargo de subdiretor da TV Alerj, o mais alto da hierarquia do departamento, e ficou responsável por gerir um contrato de cerca de R$ 800 mil mensais (quase R$ 10 milhões anuais) com uma empresa terceirizada, a Digilab.
No curriculo, Souza listou atuações em recentes campanhas eleitorais do PSL, como de Flávio Bolsonaro ao Senado.