CLEBER LOURENÇO

Privilégio? "Kid preto" da OrCrim de Bolsonaro quer ser julgado pela Justiça Militar

Pedido da defesa do tenente-coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo foca em questões processuais, sem negar monitoramento de Moraes ou uso indevido de dados de civis

Tenente-coronel Rodrigo Bezerra Azevedo: kid preto quer ser julgado pela Justiça Militar.Créditos: Reprodução / TV Globo
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A defesa do tenente-coronel "kid preto" Rodrigo Bezerra de Azevedo, preso durante a Operação Contragolpe, apresentou um pedido ao Supremo Tribunal Federal (STF) solicitando que a competência para julgar o caso seja transferida à Justiça Militar.

O argumento central da defesa é que as condutas atribuídas ao militar estão relacionadas ao exercício de sua função e, portanto, devem ser analisadas sob o Código Penal Militar.

Apesar das justificativas processuais, o documento evita refutar diretamente as graves acusações feitas pela Polícia Federal (PF), como o uso indevido de dados de civis e a tentativa de monitoramento do ministro Alexandre de Moraes.

Argumentação da Defesa: Justiça Militar como foro competente

No pedido, a defesa do militar sustenta que o militar, por estar na ativa e no contexto de supostas operações do Exército Brasileiro, deve ser julgado pela Justiça Castrense. A base da solicitação é o Artigo 9º, inciso II, alínea "c" do Código Penal Militar, que prevê a competência militar para crimes cometidos em serviço ou em razão da função.

O documento destaca:

“De acordo com a nova legislação nº 13.491/2017, que alterou o Artigo 9º, inciso II, do Código Penal Militar, a Justiça Castrense é competente para investigar, processar e julgar crimes previstos na legislação penal comum, desde que sejam praticados por militares em serviço ou em razão de sua função.”

A defesa reforça que o reconhecimento da competência militar segue a jurisprudência consolidada pelo Superior Tribunal Militar (STM) e pelo STJ:

“Negar o presente pedido não apenas contrariaria a jurisprudência já consolidada há anos, mas também geraria uma insegurança jurídica significativa, além de abrir um precedente que comprometeria a tramitação de processos atualmente em análise pela Justiça Militar.”

Além disso, a defesa solicita que o caso seja analisado monocraticamente pelo relator ou, em caso de divergência, levado ao plenário do STF, alegando a importância e complexidade do tema:

“Requer-se que esse Ministro Relator reconheça de forma monocrática sua incompetência para investigar, processar e julgar os Autos (...) e, por conseguinte, determine a remessa do feito à Justiça Militar.”

A ausência de negação das acusações

Em nenhum momento do pedido a defesa nega as acusações feitas pela Polícia Federal, que incluem:

  • Monitoramento ilegal do ministro Alexandre de Moraes;
  • Uso de dados de civis sem autorização para registrar chips de celulares;
  • Participação em articulações golpistas contra o Estado Democrático de Direito.

A estratégia processual foca exclusivamente na jurisdição do caso, evitando rebater os elementos levantados nas investigações.

Contradições na versão de Rodrigo

Antes do pedido formal da defesa, Rodrigo Azevedo prestou depoimento à Polícia Federal sem orientação da sua defesa. Na ocasião, ele admitiu o uso de dados de terceiros para anonimizar dispositivos, prática que justificou como necessária para operações sensíveis do Exército:

“Minha intenção era ter esse celular para anonimizá-lo, realmente.”

Contudo, Rodrigo afirmou que o aparelho não teria sido usado em ações golpistas, mas em outras operações do Exército Brasileiro. A PF, no entanto, destacou que o rastreamento dos dispositivos revelou o vínculo direto com a tentativa de sequestro e assassinato do ministro Alexandre de Moraes.

Vale destacar que a declaração do militar ocorreu antes do contato com seu advogado. Apenas após o primeiro encontro com a defesa, o foco mudou para a competência judicial, deixando de lado qualquer tentativa de rebater o conteúdo das acusações.

O uso de dados de civis e a gravidade do caso

A Polícia Federal revelou que Rodrigo Azevedo e outros membros do grupo utilizavam dados pessoais obtidos em grupos do Telegram para registrar chips de celulares de forma clandestina. Os dispositivos foram identificados como equipamentos institucionais do Exército, agravando a situação e configurando uso indevido de recursos estatais.

Durante as investigações, o delegado Fábio Schor ressaltou a gravidade da ação:

“O problema dessa situação é que esse celular foi usado numa ação para tentar prender, barra, executar o ministro Alexandre de Moraes. Essa é a gravidade do fato.”

O uso dos chips em uma tentativa de captura ilegal de uma autoridade do STF expõe não apenas a atuação do núcleo investigado, mas também coloca em xeque os mecanismos de controle dentro das Forças Armadas.

O pedido deixa claro que a estratégia é focada na mudança de competência para a Justiça Militar, sem negar as graves acusações apresentadas pela Polícia Federal. A mudança de tom entre o depoimento inicial do militar – dado antes do contato com sua defesa – e o pedido formal reforça a tentativa de deslocar o caso para um foro considerado mais favorável.

Enquanto isso, as investigações continuam revelando elementos que ligam Azevedo ao núcleo de atuação golpista, consolidando o caso como um dos mais graves envolvendo militares da ativa nos últimos anos.

 

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