O brutal assassinato de Genivaldo de Jesus Santos, cometido por agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF), nesta quarta-feira (25), em Sergipe, definitivamente, não foi um ato isolado.
Depois da repercussão do caso, inclusive internacional, ações violentas, como a transformação de uma viatura em “câmara de gás” e outras práticas truculentas, podem ser consideradas parte do “modus operandi” de parte da corporação.
O militante e líder do movimento negro, Douglas Belchior, usou as redes sociais para denunciar a ação de uma empresa que oferece cursos preparatórios para policiais federais, inclusive rodoviários.
A AlfaCon tem sede no município de Cascavel, no Paraná, e está ativa desde 2012. Um dos seus sócios é Evandro Bitencourt Guedes.
Em um vídeo publicado por Belchior, o sócio da empresa, em uma palestra, conta um caso em que se vangloria de agir com violência contra torcedores, em uma partida de futebol no Maracanã, além de proferir frases racistas.
Segundo Belchior, Guedes é ex-policial federal e serviu ao lado do hoje deputado federal Eduardo Bolsonaro, de quem se tornou amigo.
Outro dado divulgado pelo militante é que foi em uma aula da AlfaCon, em julho de 2018, que Eduardo Bolsonaro afirmou que bastaria um soldado e um cabo para fechar o Supremo Tribunal Federal (STF).
“Tomei conhecimento da AlfaCon através do vazamento do vídeo do instrutor que ensinava a simular uma câmara de gás nas viaturas”, conta Belchior.
Ele se refere a um vídeo que viralizou após o caso Genivaldo, que mostra um agente da PRF falando sobre a a prática da câmara de gás.
O policial rodoviário Ronaldo Bandeira, que dá aulas em cursos preparatórios de carreiras policiais, justamente na AlfaCon, fala, em tom de deboche, de uma ocasião em que supostamente usou gás de pimenta contra uma pessoa durante abordagem, dentro da viatura, como ocorreu com Genivaldo.
“Ele estava na parte de trás da viatura e tentou quebrar o vidro, com chute, ficou batendo. O que o policial faz? Abre um pouquinho, pega o spray de pimenta e taca. Foda-se, é bom pra caralho, a pessoa fica mansinha”, diz, aos risos, no trecho que vem sendo divulgado nas redes sociais.
E prossegue. "Daqui a pouco escuto ‘vou morrer’, ‘vou morrer’. Aí fiquei com pena, vou abrir. Torturaaa", dispara, afirmando, ao final, que na verdade não teria feito o que disse. "Sacanagem, fiz isso, não".
“Não foi um crime cometido na emergência dos fatos, foi à sangue frio”, afirma Belchior
“A ‘câmara de gás’ ensinada pelo instrutor é exatamente o método utilizado para assassinar o Genivaldo Jesus. Observem, não podemos dissociar uma coisa da outra, há método naquela barbárie, não foi um crime cometido na emergência dos fatos, foi à sangue frio, aplicando tecnologia ensinada por agentes da corporação que prestam serviço para a AlfaCon”, avalia Belchior.
Em outro vídeo publicado por ele, Jair Bolsonaro, já presidente, faz propaganda da AlfaCon, o que é ilegal.
O presidente diz o seguinte: “Olá, estudantes da AlfaCon. Vocês, que estão se preparando para este concurso da Polícia Federal, boa sorte. Não é impossível, não. É difícil e nós acreditamos em você. Estamos juntos. O ano que vem vou dar posse para todos vocês. Valeu”.
Belchior destacou que não sabe se há uma ligação formal entre a família Bolsonaro e a AlfaCon. “Me parece pouco provável. Porém, o Ministério Público tem a obrigação de investigar essa empresa e descobrir quem os financia, qual a ligação da empresa com o governo federal, como conseguiram o certificado no MEC. Tudo isso precisa ser explicado”, cobra.
“Tudo isso precisa ser explicado. Para além da ligação formal, há uma óbvia ligação ideológica. No vídeo que postei do Evandro, ele diz do gosto por violência e por bater em pessoas. O prazer na violência e na morte une essa gente. Também no vídeo, vimos como ele se refere às pessoas pobres, pejorativamente tratadas como favelados por ele. Essa política de morte do governo tem eco nos braços armados e em sujeitos como Guedes”, acrescenta o militante.
“O movimento negro tem dito que o que ocorreu com Genivaldo de Jesus é o genocídio em curso no país, são políticas de morte do governo Bolsonaro. Relações com Evandro Guedes, que treina agentes do Estado para torturar e matar, comprovam nossa acusação”, afirma Belchior.
Após publicações, sócio da empresa faz postagem apontando uma arma para o ‘politicamente correto’
O militante informa, ainda, que “quinze minutos depois da nossa publicação, ele (Evandro Guedes) me bloqueou no Twitter e fez uma postagem apontando uma arma para o ‘politicamente correto’. É uma reação explícita”, avalia.
“Nós vamos processar a escola, porque é a instituição promotora de um curso racista, que infringe regras, enfrenta regramentos de defesa de direitos humanos do Brasil, e vamos processar o professor Evandro Guedes. A empresa, juridicamente, e ele, individualmente”, completa Belchior.