Policiais fizeram churrasco e levaram malas de dinheiro após chacina no Salgueiro, dizem moradores

"Obrigado pela recepção, ass: delta force, bonde do caça siri", escreveram os agentes na porta do clube. Moradores retiraram oito corpos de um mangue

Moradores do Complexo do Salgueiro retiram corpos de área de mangue após operação policial - Foto: Reprodução
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Policiais envolvidos em uma chacina no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, no Rio de Janeiro, fizeram um churrasco e levaram malas de dinheiro, fuzis e pistolas após matar pelo menos nove pessoas, sendo parte delas torturadas, de acordo com relatos de moradores.

Segundo reportagem da "Folha de S. Paulo", os agentes teriam, ainda, deixado um recado no lado interno do portão marrom do clube: "Obrigado pela recepção, ass: ? [delta] force, bonde do caça siri".

A mensagem pode ter sido uma referência cruel aos animais que vivem no mangue, já que oito dos corpos retirados nesta segunda-feira (22) por moradores eram de homens - um nono morreu em outro lugar.

Nas bancadas de onde ocorreu a festa, dezenas de latinhas de cerveja, long necks e garrafas de bebidas vazias, além de, ironicamente, uma bíblia. O freezer de três portas de vidro estava com duas delas estilhaçadas de cima a baixo.

Vingança e momentos de terror

Segundo relatos dos moradores, os momentos de terror teriam começado ainda no sábado pela manhã, quando o sargento Leandro Rumbelsperger da Silva foi assassinado. A PM afirma que ele foi atacado durante um patrulhamento, mas dentro da comunidade a versão é de que não foram criminosos que o mataram.

Como forma de vingança, a polícia teria levado dois jovens em caveirões, que sumiram em momentos diferentes. Um deles reapareceu vivo, depois que lideranças da favela acionaram autoridades, enquanto o outro foi encontrado morto.

A Polícia Militar identificou os corpos de Carlos Eduardo Curado de Almeida, Ítalo George Barbosa de Souza Gouvêa Rossi, Élio da Silva Araújo, Rafael Menezes Alves, David Wilson Oliveira Antunes, Kauã Brenner Gonçalves Miranda, Jhonata Klando Pacheco e Douglas Vinícius Medeiros de Souza.

Segundo a PM, Igor da Costa Coutinho foi baleado durante o confronto e socorrido, mas não resistiu. Pelo menos três deles não tinham antecedentes criminais, enquanto os demais eram investigados, em sua maioria, por tráfico de drogas.

Em nota à "Folha", a Delegacia de Homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí afirmou que investiga o caso e que enviou um ofício à Polícia Militar solicitando os nomes dos agentes que participaram da ação e a apreensão das armas para exames periciais.

"Os agentes estão ouvindo depoimentos e novas testemunhas serão ouvidas no decorrer da investigação. A equipe da DHNSG também aguarda os resultados dos laudos de necropsia. A investigação está em andamento para esclarecer todos os fatos", diz a delegacia, que divulgou ainda que cinco dos nove mortos tinham antecedentes ou anotações criminais.

Até outubro, 38 chacinas foram registradas no Rio

Segundo dados da Rede de Observatórios de Segurança, entidade composta por organizações acadêmicas e da sociedade civil que monitora e difunde informações sobre segurança pública, violência e direitos humanos, até outubro deste ano, 38 chacinas foram registradas no RJ (4 a mais que em 2020).

Vinte e sete delas foram cometidas por policiais, o que culminou, no total, em 128 mortes. Isso significa que 71% das chacinas no Estado foram promovidas por forças policiais.