Data trágica: movimentos negros levam flores à viúva de Beto Freitas

Nesta sexta-feira (19) completa um ano do brutal assassinato cometido por seguranças do hipermercado Carrefour, em Porto Alegre (RS). Réus seguem sem julgamento

Foto: Milena Freitas, viúva de Beto Freitas, assassinado por seguranças do Carrefour em Porto Alegre. (Afropress)
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Ativistas negros de comunidades quilombolas do Rio Grande do Sul realizaram um ato de apoio a Milena Freitas, viúva de João Alberto Silveira Freitas, conhecido como Beto Freitas, o homem negro assassinado por espancamento há exatamente um ano numa unidade do hipermercado Carrefour da capital gaúcha. Eles levaram flores à esposa da vítima.

O advogado Onir Araújo, membro da Frente Quilombola do Rio Grande do Sul e membro do Coletivo Cidadania, Antirracismo e Direitos Humanos, que liderou a comissão que visitou Milena no dia que o assassinato de seu marido completa um ano, explicou que as 40 rosas entregues à viúva simbolizam cada ano de vida de Beto, que morreu aos 40 anos.

Na quinta-feira (18), Milena Freitas fez questão de assinalar na véspera da trágica data que marcou para sempre sua vida o apoio às duas entidades que criaram o Coletivo de Advogados Cidadania, Antirracismo e Direitos Humanos, que atua de forma enfática acompanhando o andamento do caso. Ela disse ainda que deseja a criação de uma fundação sem fins lucrativos para preservar a memória do marido e do abominável caso de racismo que tirou sua vida e chocou o país.

“Que a violência, cujas vítimas, quase sempre são pessoas negras como Beto, alvos de preconceitos, discriminação e estereótipos seculares, e a impunidade não se naturalizem nem se repitam. É o que esperamos. O Brasil todo espera”, diz a nota divulgada nesta quarta-feira (17) pelo escritório dos advogados Hamilton Ribeiro e Carlos Barata e assinada pelo pai de Beto, João Batista Rodrigues de Freitas, e a viúva Milena Freitas.

Réus não foram julgados

Dos seis acusados pelo crime, apenas dois seguem presos aguardando julgamento, os seguranças Magno Braz Borges e Giovane Gaspar da Silva. O último era integrante da Brigada Militar, a força pública gaúcha equivalente à Polícia Militar.

Adriana Alves Dutra, fiscal da loja e que acompanhou toda a ação sem fazer nada para cessar as agressões, está em prisão domiciliar, enquanto Paulo Francisco da Silva, que impediu a viúva de Beto de ajudá-lo, e Kleiton Silva Santos e Rafael Rezende, que auxiliaram na imobilização da vítima, seguem aguardando o andamento do processo criminal em liberdade.

**Nota do Coletivo Cidadania, Antirracismo e Direitos Humanos e as entidades que nos constituíram – a SOEUAFROBRASILEIRA e o COLETIVO DE ADVOGADOS PELA DEMOCRACIA (COADE) sobre a data que marca o primeiro ano do crime.

JUSTIÇA PARA BETO FREITAS
NÃO VAMOS ESQUECER. FOI RACISMO

No dia que marca a passagem do primeiro ano do assassinato bárbaro de JOÃO ALBERTO SILVEIRA FREITAS, um homem negro trabalhador, por seguranças a serviço do Carrefour, na loja Passo D’Areia, em Porto Alegre, nós, advogados do Coletivo Cidadania, Antirracismo e Direitos Humanos e as entidades que nos constituíram – a SOEUAFROBRASILEIRA e o COLETIVO DE ADVOGADOS PELA DEMOCRACIA (COADE) – reiteramos nossa mais firme disposição de levar até às últimas consequências e instâncias a luta por Justiça.

Fazemos coro ao que diz a família de Beto Freitas representada pela viúva MILENA FREITAS e pelo seu pai, sr. JOÃO BATISTA, de que a Justiça pela qual lutamos se traduz a punição exemplar dos acusados pelo crime – a maioria dos quais – já está em liberdade, aguardando julgamento.

A tradição de um sistema judicial que reproduz o racismo institucional nas suas instâncias, decisões e práticas, posto que expressão de uma República construída sobre os escombros do escravismo, deve nos deixar e a toda sociedade brasileira, alertas.

A delegada que indiciou os acusados ao cabo do inquérito que apurou a autoria e a materialidade e a própria denúncia oferecida pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul, não viu o que o mundo inteiro viu: o racismo na sua modalidade mais perversa, agressiva, violenta e homicida.

Por outro lado, os acordos negociados na esfera cível, por entes privados com o aval de órgãos públicos ao arrepio da Lei da Ação Civil Pública (7347/85) e ao Estatuto da Igualdade Racial buscam amenizar, e mesmo excluir, a responsabilidade da empresa violadora, reincidente em tais práticas, como todo o Brasil sabe e conhece.

O crime bárbaro de que foi vítima Beto Freitas deve se constituir em um definitivo divisor de águas. Sua morte não pode ter sido em vão, como bem assinala a Declaração Pública assinada pela família.

É preciso botar fim, de uma vez por todas, a cultura de violência que atinge a maioria da população brasileira – preta e parda – de acordo com todos os indicadores oficiais, alvo e vítima de preconceitos seculares, estereótipos, discriminações, humilhações e morte.

É o que nós esperamos.

É o que espera a família de Beto Freitas. É o que o Brasil todo espera.

São Paulo/Porto Alegre/Vitória – 19 de Novembro de 2.021

COLETIVO DE ADVOGADOS CIDADANIA, ANTIRRACISMO E DIREITOS HUMANOS

ANDRÉ MOREIRA
CLÁUDIO LATORRACA
CARLOS BARATA
DOJIVAL VIEIRA
HAMILTON RIBEIRO
RODRIGO SÉRVULO
ONIR ARAÚJO

Entidades :
SOEUAFROBRASILEIRA
COADE
FRENTE QUILOMBOLA/RS